Vinte Três

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     Suspirei, ainda estupefata pelas últimas atualizações. Sentia dentro do meu peito uma ansiedade, só que positiva. Eu diria que uma euforia passava nas minhas veias. Camilla iria se casar. A felicidade da minha nova amiga me deixou entusiasmada, pois parecia me transmitir com o olhar sua emoção. Não precisava perguntar para saber que aquele era seu sonho.

Seu pai finalmente havia feito a cirurgia e agora repousava em casa, aos cuidados de Camilla e sua tia. A mãe dela, tendo falecido anos atrás, a deixou somente com o pai e os avós.

— Marcamos o civil para o final do mês. — A abracei fortemente e ela correspondeu. Demos alguns gritinhos eufóricos. Com a data marcada, tudo parecia mais real agora. Ela finalmente iria se casar com o amor da sua vida, o homem que Deus a concedeu como marido. Quando nos soltamos, percebi que algumas lágrimas saíam dos seus olhos. Eu a havia escutado chorar, infadonha e agonizada, mas aquilo definitivamente era diferente. Eram lágrimas de alegria e pela emoção que viveria a resposta das suas orações.

— Você será uma noiva excepcional! — Minha prima comentou ao nosso lado. — Ficará linda usando branco. Já sabe se usará véu? E o buquê? Meu Deus, são tantos detalhes! Ainda tem os sapatos. — Eu e Camilla começamos a rir. Maya, apesar da idade, ainda parecia imatura para algumas coisas. O fato é que aquele momento era exclusivamente de gratidão ao Senhor.

— Maya tem razão. — Tentei poupar minha amiga de responder o "Enem das noivas", aplicado por Maya e suas mil questões. Misericórdia do dia em que fosse se casar, pois nada poderia sair do lugar. — Você será uma noiva lindíssima.

Ela passou os dedos embaixo dos olhos, limpando as lágrimas que se formaram.

Maya estava desconfiada há alguns dias, desde que viu a nova aliança na mão de Camilla. E minha prima não errou. Foi apenas quando sutilmente tomamos coragem de confrontá-la que ela acabou desabafando.

Com o "sutilmente", quero dizer que Maya perguntou diretamente se aquela era sua aliança de noivado.

— Obrigada, meninas. Eu me sinto tão alegre, mas também... perdida. — Disse de forma sincera, mas também detectei preocupação em sua voz.

— Está tudo bem. — Maya comentou, passando as mãos no cabelo, em uma forma de conforta-la. — É a primeira vez que faz isso. — Disse com humor.

— E também a última. — Camilla respondeu, nos fazendo rir. — Vou me casar com minha alma gêmea! — De repente, me senti secundária.

Feliz, mas estranhamente fora daquela bolha. Devo admitir que, com o passar dos anos, ver meus amigos e colegas da minha idade, às vezes até mais novos, formando família, era uma sensação estranha. Seria como estar na terceira pessoa de uma história principal. Não queria de forma alguma parecer invejosa, então arrastei aquele sentimento para debaixo do tapete. Não era sobre mim aquele momento. Depois trataria sozinha esse novo sentimento.

Escutamos passos se aproximando.

Tínhamos nos encontrado por acaso, pois minha intenção era buscar Maya e sua mãe na igreja. Meu tio combinou de trocar algumas telhas na minha casa. Como estava sobrando, acabei assumindo a função de buscá-las. Sábado de manhã era o momento do ensaio das mulheres mais velhas. Maya acompanhava o conjunto, pois sua voz era adequada para o solo, sendo sempre convidada a participar, já que sua mãe era quem regia. Já Camilla tinha vindo porque o pastor receberia ela e o noivo em seu gabinete para conversarem.

Agora eu sabia o motivo.

Estava feliz, ponto final.

De relance, vimos quando o Fiat Touro branco estacionou em frente à igreja. O pastor havia chegado e não consegui desviar os olhos quando ele saiu do banco do carona. Só poderia ter uma pessoa dirigindo, então. Ela não demorou a sair, usando óculos escuros e com o cabelo bagunçado. Aposto que tinha acabado de acordar. Tentei não sorrir, encarando-o com humor.

Pedro tinha sido um cavalheiro comigo na semana passada. A cada encontro que tínhamos, eu gostava mais da sua companhia. Isso era bom. Antes, eu não tinha muitos vínculos dentro da igreja, mas aqui estava eu em uma roda de amigos.

— A paz do Senhor, meus filhos! — Nosso pastor disse animado. Ele tinha um jeito bem-humorado de tratar as coisas, sempre sorrindo e fazendo brincadeiras. Usava roupas casuais, uma polo branca e havaianas pretas. O sobrinho usava uma camiseta preta, calça azul e chinelos da mesma cor. — Que sorte eu tenho de pastorear as jovens mais lindas da cidade. — Seu olhar analisou todas nós, caindo por último em mim.

Não entendi. Seria uma deixa para seu sobrinho e Maya, talvez? Algum código subliminar, para

Minha prima me contou que tio Amós jogou algumas indiretas ao pastor sobre o sobrinho, ambos parecendo condescendentes com o namoro dos dois. Uma coisa era fato: minha prima estava declaradamente disponível para Pedro. Contudo, quando desviei os olhos do pastor, seu sobrinho me encarava agora, sem os óculos escuros.

Não sei explicar o que senti, mas foi algo como medo.

— Paz do Senhor! — Minha prima respondeu entusiasmada. Ela não tinha visto Pedro desde o encontro do seu pai com o pastor. Óbvio que tentaria causar uma boa impressão. — É muito bom ver vocês! — Disse sorridente, dando uma analisada demorada em Pedro, que ainda me encarava, ignorando-a completamente.

Eu estava me sentindo até sem ar com toda aquela tensão. Sentia-me desconfortável pela atenção que recebia de Pedro, mas também pela atenção que ele recebia de Maya. Decidi então voltar meu foco para Camilla, o único assunto ali que tinha coerência.

Se o pastor aprovava a relação dos dois, então era isso. Que aproveitassem a data de Camilla para se sentenciar um ao outro. Cruzei os braços. Minha amiga me encarava com curiosidade. O que deu em todos hoje? Pastor, Pedro e agora ela me olhando daquela forma estranha. Até parecia que o foco era eu, não Camilla e Kael.

O pastor sabiamente começou a divagar sobre o primeiro assunto aleatório que pensou, nos tirando um pouco daquela tensão. Falava sobre o pós-operatório do irmão Elias, quando Pedro falou baixo, mas ainda sendo possível de escutar.

— Podemos conversar? — Disse para Maya, que aceitou prontamente. Pedro me encarou por nanosegundos antes de se afastar para falar em privacidade com Maya.

Tentei disfarçar o sentimento de medo, que agora parecia tristeza dentro do meu peito. Não iria demonstrar quão desgostosa estava. Finalmente, Maya iria conseguir aquilo que há tempos vinha me contando, como uma espécie de confidente amorosa. Entretanto, estranhei dentro de mim mesma, pois o sentimento deveria ser de felicidade em dobro, ao invés daquele ressentimento que estava se formando.

Não me sentia confortável dentro de mim mesma enquanto, ao longe, eles conversavam com seriedade.

— Verdade, né, Roberta? — Camilla me questionou sobre algo. Respondi positivamente com a cabeça, mesmo não fazendo ideia do que falavam. Minha atenção não estava aqui.

Minha atenção estava em ignorar aquilo que estava sentindo, enquanto ignorava o que estava a alguns metros. Não sabia dizer qual me incomodava mais.

O portão rangeu quando finalmente Kael havia chegado para que então finalmente conversassem sobre os próximos passos.

Pensei que essa era a oportunidade de sumir momentaneamente, para refletir, enquanto minha tia finalizava a reunião com as irmãs, mas então Camilla pegou em minha mão.

— Você também vem. — Isso me deixou ainda mais confusa, mas, por estar aérea, não questionei, sem saber o que responder. Surpresa. — Pedro também.

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⏰ Última atualização: Oct 09 ⏰

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Corações em Conflito: Romance CristãoOnde histórias criam vida. Descubra agora