Dezessete

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     Eu estava com os pensamentos estagnados, ainda estupefata com o culto de dois dias atrás. A sensação que eu tinha era que, após ouvir o testemunho de Camilla, as coisas ganharam uma nova perspectiva. Jamais consideraria desacreditar em Deus; presenciei tantas maravilhas e testemunhos grandiosos que ser cética não era uma opção. Contudo, ser usada por Deus era algo completamente diferente.

Sempre estive em um papel de personagem secundário, mas aquela havia sido uma experiência especialmente minha com Deus e, claro, com Camilla.

Eu mal podia acreditar que Jesus havia me usado, apesar da minha extrema frieza espiritual em relação a Ele. Era como ser presenteada pelo Pai mesmo após ter negado estar com Ele. Meu maior questionamento era este: com tantos outros, ainda mais preparados e ansiosos para viver aquilo, por que justo eu?

Eu era praticamente uma ovelha perdida, querendo ficar na encolha. Não me sentia merecedora de uma experiência tão íntima.

Ora, eu me sentia incapaz e indignada, ora ainda me maravilhava com os feitos do Senhor, surpresa com o que havia acontecido.

Apesar de tudo, após o culto, orei unicamente por Camilla. Eu não tinha muita moral com Deus, então apenas entrei em contato antes de adormecer para agradecer e interceder pela sua vida.

— Está doente, querida? — Levantei os olhos do prato para ver o vislumbre de uma senhora muito simpática e excelente cozinheira. — Até agora não falou muito. — Comentou, depositando a bebida que antes havia pedido.

O horário que escolhi para almoçar estava ameno: nem tão cheio, mas com algumas mesas ocupadas. Odiava almoçar com aquele balbucio todo, como se estivesse em uma escola de samba. Às vezes me sentia sufocada.

— Pensativa, eu diria. — Respondi, dando um longo gole de refrigerante. Apontei com o queixo para que ela se sentasse à minha frente. Dona Vânia fez isso, sorrindo fraco. Tínhamos uma relação razoável. Certa vez, eu me esqueci de pagar a comanda e voltei imediatamente quando percebi meu erro. Estava envergonhada, pois tinha sido uma das primeiras vezes que comia ali. Dona Vânia não me conhecia como agora, e poderia pensar muito mal de mim. Considerando que seu restaurante ficava em frente aos Correios, eu sempre seria vista por ela como caloteira. Me desculpei várias vezes e paguei a conta. Ela achou graça do meu nervosismo e, na próxima vez que fui ao restaurante, começou a brincar comigo sobre o ocorrido. Pouco a pouco, nos tornamos próximas.

— Algo de especial?

Encarei os olhos da mulher de meia-idade, ponderando se seria uma boa ideia contar minha última experiência sobrenatural. Dona Vânia, apesar de acreditar em Deus, nunca mencionou se frequentava uma igreja, seja ela católica ou evangélica. Optei por contar, assim sendo a primeira a ouvir o testemunho vindo de mim. Era assim que Jesus, diversas vezes no Novo Testamento, nos orientava a fazer, sempre vivendo uma vida de testemunho para com os ímpios.

— Nunca tinha ouvido algo igual. — Disse Dona Vânia, também maravilhada. — Que tremendo, Roberta! — Eu ainda estava arrepiada, sentindo o Espírito Santo dentro de mim. Que sensação revigorante.

Estava tão centrada em nossa conversa que não percebi que o restaurante estava praticamente vazio. O que me fez sair do transe daquele momento com Dona Vânia foi o reflexo da aproximação de alguém. Direcionei meus olhos para a pessoa.

Juntei as sobrancelhas quando a reconheci, mas depois suavizei minhas expressões. Estávamos em trégua, afinal.

Corações em Conflito: Romance CristãoOnde histórias criam vida. Descubra agora