Sete

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     O ensino superior é, sem dúvidas, um dos melhores objetivos a se ter, independentemente da idade ou da área de formação. No entanto, acredito que, em algum momento, acabaram romantizando esse lugar, transformando-o não em uma escada para conquistar suas ambições finais, mas na própria ambição em si. Não é à toa que, após a graduação, muitas pessoas ficam em um limbo, sem saber para onde ir.

A faculdade deve ser um caminho, jamais um destino. Afinal, felizmente, ela dura apenas quatro, cinco ou seis anos. E depois?

Entende o que quero dizer?

Talvez eu esteja apenas entediada, com a cabeça vazia.

A próxima a falar era Mirela. Ela sempre se destacava nas aulas de criação poética da nossa classe. Eu gostava de poucas aulas, pois a maioria fazia das matérias algo massante, mas essa era uma exceção. O professor nunca passava tarefas e sempre liberava a turma mais cedo. Todas as quintas-feiras, ele chegava atrasado, fedendo a cigarro, e falava sobre qualquer assunto do seu dia. Enquanto dava aula em forma de desabafo, desenvolvíamos poesias. No final, recitávamos para a sala, e todos ganhávamos pontuação, até mesmo os alunos que faltavam, embora isso misteriosamente nunca acontecesse. Eu não era a única a gostar da aula; aparentemente, quando fazíamos algo apenas por fazer, sem esperar uma nota equivalente ao nosso esforço, acabávamos gostando mais.

- Família. Deveria ser um lugar para onde voltamos quando o mundo fica frio demais, não de onde você se esforça para não congelar. Mas, embora a promessa de um abraço morno nunca tenha me alcançado, nem os conselhos jogados ao vento ou a monótona declaração de amor que escutei, eu ainda posso escrever sobre isso. Nunca me ensinaram a falar sobre família, nem a sentir a presença ou a falta dela, mas eu aprendi do meu jeito. - O professor sorriu fraco quando ela terminou e esperou sua aprovação. Embora ele não desse uma nota, isso era um fato, você sabia o tamanho do seu contentamento pela sua expressão. O senhor Donizete não falava muito, então você aprendia a ler sua expressão, que sempre dizia muito. Mirela sorriu de volta; ela tinha se saído muito bem, julguei pelo olhar satisfeito do senhor Donizete.

Eu gostaria que ele me olhasse da mesma forma, mas meus versos não tinham a mesma intensidade.

Ele anotou algo no fichário sobre a mesa e liberou a turma de quinze ou doze alunos. Recolhi meu material, assim como todos os outros. Era minha última aula, então me preparava para voltar para casa. Maya já deveria estar quase terminando sua aula para podermos voltar para casa com o carro do meu tio. Fazíamos faculdade no mesmo lugar. Ela começou cursando Psicologia, mas no início deste ano trancou o curso para estudar Estética e Cosmética. Meu tio cedia o carro três vezes na semana, quando estava de folga. Nos outros dias, usávamos o Del Rey, que Maya odiava, porque às vezes ele nos deixava na mão, além de ser tão idoso quanto o dono.

- Você o agradou. - Comentei com Mirela enquanto íamos em direção ao estacionamento da faculdade. Ela tinha um carro atual e trabalhava em uma excelente revista. Não é necessário comentar o quanto a vida de Mirela era invejável. Dinheiro não é sinônimo de felicidade, mas faz você se sentir infeliz com a classe que gostaria de ter.

- E você?

- Você sempre agrada, Mirela. - Respondi, sorrindo para ela. - E os preparativos para o casamento? - Ela fez uma careta de desdém, fazendo-me rir. A cada dia, o assunto me trazia mais razões para rir, pois Mirela sempre estava discutindo com a sogra intrometida. Seu noivo era de uma família rica, então todos os detalhes do matrimônio não custavam nada comparado às escolhas dela.

- Fomos escolher o vestido ontem. Eu simplesmente me apaixonei por um azul celeste, com cauda de sereia e tecido bordado. - Ela fez uma expressão de verdadeira animação, provavelmente se lembrando. - Ela teve que implicar com a cor, porque, nas palavras dela, "deve ser branco, pois simboliza pureza". Eu não aguentei, Roberta, porque o vestido era perfeito e aquele era meu momento, sem que a megera estragasse tudo de novo. Eu disse que não precisava se preocupar, pois tinha perdido a pureza na casa dela no início do nosso relacionamento. - Eu ri e Mirela continuou com a expressão irritada. - Não foi só você que achou engraçado; a mulher que nos atendia teve que se retirar porque ficou vermelha de tanto segurar a risada. - Mirela terminou de contar e pegou seu telefone. Provavelmente estava falando com o noivo, pois ela gostava de avisar quando terminava a última aula, para que ele a esperasse no hall do apartamento que eles compartilhavam há quase dois anos.

- Mas então, você vai usar o vestido? - Perguntei, curiosa sobre o veredito.

- Não, porque a outra atendente encontrou um do mesmo modelo, branco gelo. - Suspirou ao final da frase, guardando seu telefone. - E você? Alguma novidade? - Esta semana eu tinha voltado ao trabalho e estava sobrecarregada com muitas pendências. Quase não tive tempo para me alimentar, quanto mais para fazer algo divertido, além de discutir com o vovô.

- Zero. - Mirela sorriu. - Você vai faltar amanhã?

- Sim, só o último horário, porque o Roger vai me levar para jantar. - Concordei. Eu nunca havia tido um relacionamento amoroso sério, além de perder o BV no início do ensino médio e ter ficado com um ou dois garotos em festas raras. Eu não estava familiarizada com essa ideia de romance dos filmes, mas sabia que o que eles tinham era algo parecido, mesmo não se adequando a um relacionamento cristão. - Ele já deve estar me esperando. Tchau, Roberta.

- Tchau, Mirela. - Nos despedimos e ela seguiu para o estacionamento. Eu continuei no prédio, achando perigoso ficar sozinha por muito tempo ali.

Corações em Conflito: Romance CristãoOnde histórias criam vida. Descubra agora