Capítulo 15

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        Jantamos todos sentados a mesa. Os observei em alguns momentos. Não sou um especialista, mas, são pessoas tristes. Olhos cansados, mãos machucadas e a pressa em comer. Flora evita meus olhos a todo custo, Peter sorri as vezes quando me olha. A sopa de legumes tem um sabor incrível, meu estômago se aquece a cada colherada. Peter me emprestou uma de suas roupas, uma camisa branca de linho, uma calça bege com suspensórios, botas marrons e meias. Não é o tipo de roupa que eu usaria, mas o tecido é confortável.

— Olha aqui, ficou ótimo. – Peter aponta para um espelho. Eu recuo.

— É, ficou boa.

Ele ergueu uma sobrancelha. Os pais de Peter observaram a cena sentados ao sofá com entalhes de madeiras. Flora lia um livro no canto de um dos sofás e evitava me olhar. Uma vela estava num canto da parede no alto e as sombras as vezes desenhava formas.

— Eu atravessei sem querer por um espelho, acho bom evita-los. Não quero sair em algum lugar sei lá perigoso. – Sorri sem graça.

Peter também me deu um facão comprido que ele usava nas caçadas, de prata pura que podia cortar as criaturas e deixá-las feridas por alguns minutos e dar tempo de correr. A capanga marrom era feita de um tecido semelhante a calça, uma tira de alça que se encaixava perfeitamente nos ombros de forma diagonal. Parecia que eu estava ganhando presentes no aniversário.

— Agora só falta a Flora te ensinar alguns truques e você poderá ir atrás da sua amiga. –Peter sorriu ao dizer.

— Flora? – o pai perguntou.

Ela manteve seus olhos nos livros, encolhida entre os panos de seu vestido branco. Os cabelos úmidos estavam soltos e algumas ondas se formava. Senti meu rosto corar quando ela me olhou furiosa.

— Ele não está pronto! –ela franziu o cenho ao dizer.

— Ele chegou até aqui, considero um ótimo começo! – Peter riu me olhando.

— Como podem estar abrindo a nossa casa e aos nossos costumes a esse desconhecido? A gente não o conhece! Já se esqueceram que ele invadiu nosso celeiro? E agora eu tenho que dividir minha comida, meu espaço para esse, esse sei lá o que ele é! – Flora estava de pé os questionando e seu dedo indicador direito me acusava sem desviar.

O pai suspirou fundo e a mãe abaixou a cabeça. Eu sei que ela estava certa, mas eu não sou perigoso. Peter abaixou sua mão.

— Ei, ei Flora... se acalma. Ele não é como eles, é um viajante perdido. E nós podemos ajuda-lo a encontrar a saída e... – Ele fez uma pausa, — quem sabe ele não consiga nos libertar... –ele sorriu de novo esperançoso.

— Não Peter! Isso não está certo! –ela me fulminava com os olhos.

Me aproximei dela. Ela recuou. Segurei sua mão ela me encarou ainda com as sobrancelhas caídas e o olhar mais triste que eu já vi.

— Está sentindo minhas mãos? Elas estão quentes. Eu não sou como... essas coisas. Sou humano como você... – minha voz ficou rouca. Pigarrei.

Ela se soltou e me empurrou com as duas mãos no meu peito. Lágrimas desceram no seu rosto e Peter a puxou para um abraço. O pai se levantou vendo toda aquela confusão, a mãe levou Flora para o pequeno corredor que levava aos quartos. Suspirei. Eu realmente não tinha jeito com as garotas. O pai logo surgiu do corredor com um travesseiro e um cobertor. Estava solidário apesar do medo eminente. Peter me desejou boa noite e acompanhou o pai até o quarto sumindo de vista assim que me deitei.

O travesseiro me espetava, o abri e toquei o interior. Era palha. Um travesseiro de palha, um cobertor de lã, eu não estava mesmo em casa. Me acomodei no sofá e fiquei encarando o teto sombreado pela dança suave da vela que se agitava com a brisa. As janelas estavam fechadas e a porta também, mas eu sentia o frio adentrar todo o cômodo.

Através do Espelho {CONCLUÍDA}Onde histórias criam vida. Descubra agora