CAPÍTULO 01

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O caminho até o carro foi mais complexo do que eu esperava. Ainda não conseguia andar, então o Dr. Adrian me colocou em uma cadeira de rodas para que eu pudesse me locomover até que voltasse a caminhar, o que ocorreria com as sessões de fisioterapia. Saí de lá sendo guiado pelo homem estranho que agora seria meu tutor. Sua presença intensa atrás de mim me deixava inquieto. Eu tinha tantas perguntas que nem sabia por onde começar ou, talvez, temia as respostas.

O hospital estava silencioso naquela hora da madrugada, com poucos funcionários por perto e algumas luzes parcialmente apagadas. Apenas o som suave das rodas da cadeira chegava aos meus ouvidos, preenchendo o corredor. Ao chegarmos à saída, uma brisa fria invadiu meus pulmões, despertando-me para a realidade. A cidade estava levemente coberta de neve. O cenário era rústico, mas elegante, com uma estética europeia e luzes que davam vida a inúmeras ruas. Esse era o meu lugar. Era estranho ver, sentir e não ter ideia do que aquele lugar representava para mim. Se eu tinha alguma memória de um shopping, um café, uma casa, uma loja… hoje ela não existia mais.

— Por aqui — disse o homem que agora seria meu responsável. Eu ainda nem sabia seu nome. Ele abriu a porta do passageiro com um movimento suave, mas firme, mostrando uma cortesia agradável.

— Volte ao hospital para sua terapia e a fisioterapia, estarei esperando — disse Adrian, com os olhos atentos e um sorriso gentil. Era uma expressão que eu não esqueceria.

— Obrigado — respondi, despedindo-me do local que agora era minha única e primeira memória de vida.

Entrei no carro com a ajuda do estranho. Suas mãos estavam cobertas por luvas de couro, mas sua presença era quente. Por um instante, seus olhos encontraram os meus novamente. Os cabelos eram pretos e levemente compridos, chegando à nuca, com alguns fios caindo sobre as bochechas em uma pele clara. Eu desviei o olhar primeiro.

Ele deu a volta, sentou-se ao volante, e o carro deslizou pela neve, deixando o hospital cada vez mais distante no espelho retrovisor. As luzes da cidade eram suaves, tremulando como as poucas lembranças que eu tentava agarrar na mente. Meu corpo inteiro estava cansado, e o peso daquilo que eu não conseguia recordar pressionava meus ombros.

O silêncio se prolongou por um tempo, com apenas o som suave do motor preenchendo o ar. Tentei reunir coragem para perguntar, para tentar entender melhor minha situação. Era difícil, pois eu não sabia por onde começar, mas precisava de alguma resposta.

— Posso saber o seu nome e o que você é para mim e minha família? — finalmente perguntei, minha voz ainda um pouco fraca.

Ele lançou um olhar breve em minha direção, com um sorriso quase imperceptível no canto dos lábios, enquanto mantinha as mãos firmes no volante.

— Me chamo Dorian, sou próximo da sua família — respondeu, de forma simplista.

— Próximo? Um tutor não deveria ser um familiar?

— Sim, mas você não tem mais ninguém.

As palavras me pegaram de surpresa. Era estranha a sensação. Eu estava triste pela ideia de não ter ninguém, mas não conseguia entrar em luto, pois minha mente não lembrava de ninguém. Um filho que não se lembra dos pais, um neto que não sente saudade dos abraços da avó, um amigo sem memória de sorrisos. Eu me sentia uma pessoa ruim, e o julgamento era o que mais ocupava minha mente agora. Como eu poderia esquecer tantas pessoas?

— Não pense demais. Você acabou de sair de um coma. Faça o que o médico disse e, aos poucos, retome tudo que precisar — disse Dorian, trocando a marcha com os olhos fixos na pista.

— Nem ao menos… — Respirei fundo. — Nem ao menos sei meu sobrenome.

— Sinclair — ele respondeu. — Elliot Sinclair, o único herdeiro da sua família.

O Sussurro Do Silêncio Onde histórias criam vida. Descubra agora