CAPÍTULO 04

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Aquela manhã continuava com uma aura estranha, como se uma sombra pairace sobre mim. Apesar do incômodo em cada palavra trocada com Dorian a minutos atrás no café da manhã, ele parecia ter me deixado mais inquieto que o habitual. Talvez fosse o modo como ele se aproximava sem nunca dar respostas completas, como se tudo fosse parte de um jogo no qual apenas ele sabia as regras.

O corredor parecia ainda mais longo na medida que esperava as horas no relógio, com o livro de Dostoievski no colo. As sombras das janelas projetadas no chão, alongando-se como se quisessem me prender ali. Cada deslize dado com a ajuda da minha cadeira de rodas, soava como um eco suave e, embora a casa estivesse em silêncio, eu sentia como se alguém me observasse a cada momento. Dorian ficou para trás, com nosso café da manhã desconfortável, mas era impossível não lembrar da intensidade de seu olhar e da maneira como suas palavras sempre pareciam carregar algo escondido, algum segredo que ele parecia guardar com prazer.

Saí para a sessão de fisioterapia com o senhor William. O caminho até a clínica era silencioso, a estrada cercada por árvores que se erguiam como sentinelas, mantendo a mansão oculta do resto da cidade. Havia uma melancolia nesse isolamento, uma sensação de estar preso, mesmo que ninguém tivesse me dito isso diretamente.

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Hospital de Eldengrove
Sessão de Fisioterapia
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Ao chegar à sala onde as sessões de fisioterapia eram realizadas, fui recebido pelo silêncio absoluto. Uma das paredes estava coberta por espelhos, e, ao ver meu reflexo, algo em mim vacilou. Lembranças de uma infância que não existia para mim, de uma vida que eu deveria conhecer, piscavam como flashes distantes. Tentei ignorar esses pensamentos e me concentrei em alongar as pernas, numa tentativa de despertar os músculos que, com frequência, pareciam mais desconhecidos que o próprio passado.

Meus pensamentos, no entanto, não permaneciam calmos. A morte de Victor Hawthorne ressoava em minha mente. Havia algo incômodo sobre o modo como Dorian reagiu à notícia, com uma indiferença que parecia quase... calculada. A menção do nome Hawthorne também me inquietava, como se fosse um nome que eu devesse lembrar de algum lugar.

"Que contato minha família teria com o senhor Hawthorne?" pensei, enquanto estendia a perna com dificuldade.

Foi então que ouvi passos se aproximando. A porta se abriu lentamente, e o fisioterapeuta entrou para que pudesse dar início a minha sessão. Durante a fisioterapia, o Dr. Philippe, notou que eu estava distraído. Ele tentava orientar meus movimentos com cuidado, mas meu olhar vagava para a janela. Eu sentia a presença dele, mas a imagem do corpo imóvel de Victor Hawthorne na tela da TV ainda me perturbava.

- Elliot, hoje está mais... pensativo - comentou o Dr. Philippe, interrompendo meus devaneios.

- Eu vi uma notícia sobre um homem chamado Victor Hawthorne e desde então, estou um pouco pensativo. Foi uma notícia bem infeliz - admiti facilmente, mas também esperando ouvir algum comentário por parte dele.

- Pegou todos de surpresa. Realmente uma morte muito triste - Diz ele enquanto continuava a me ajudar com a caminhada segurando nas barras.

- O que sabe sobre ele, doutor? - Pergunto curioso.

- Victor Hawthorne? Bem, ele é um nome conhecido. Ele ia se lançar na política, mesmo que com alguns boatos.

- Boatos? - Finalmente esperava uma informação útil.

- Dizem que era um homem corrupto, de muitos inimigos - O doutor Philippe olha um lado e outro para ter certeza que estávamos sós e continua em sussurra - Dizem que seu casamento foi arranjado para poder manter sua imagem e que sua esposa na verdade, é uma vítima de tráfico.

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