𝐒𝐂𝐑𝐄𝐀𝐌

033.

21 de Outubro de 2016 - 08h13

Hospital, Redwood- Califórnia

Milly e Tessa observavam Ewan, com seus corações apertados, vê-lo lutar a cada passo mexia com elas de um jeito que nem conseguiam expressar em palavras. Há seis dias ele havia acordado do coma e cada momento em que passou desde então havia se provado um desafio doloroso para ele e para qualquer um que estivesse acompanhando seu processo de recuperação.

Milly observou a mão direita dele tremendo levemente ao segurar a beirada da cama para se apoiar, enquanto a esquerda estava pressionando a cintura, onde ainda cicatrizava uma de suas muitas feridas. Ela reconhecia o esforço dele e sabia que ele estava se recusando a mostrar qualquer sinal de fraqueza, embora a dor fosse visível em seu rosto, Milly teve que conter o impulso de correr até ele para ajudá-lo, pois na primeira vez que Ewan se levantou sozinho e ela correu para ampará-lo, ele deu a ela um sorriso forçado que disfarçava sua frustração e disse: Pode deixar, Milly. Preciso fazer isso sozinho. Preciso aprender a caminhar de novo, não a ser carregado.

— Ele está indo bem, né? — Tessa olhou para ela, esperançosa. — Depois de ontem, pensei que… — Mas Milly mal ouviu o fim da frase, pois sua mente voltou para a noite anterior, quando ela descansava no estreito sofá do quarto de hospital.

No meio da madrugada, o grito dele rasgou o silêncio e Milly despertou sobressaltada. Ewan estava sentado na cama, com a expressão contorcida em pânico absoluto, seu peito subia e descia em respirações descompassadas, como se o ar ali fosse insuficiente. Ela saltou do sofá e se aproximou, tentando suavizar seus movimentos para não assustá-lo ainda mais.

Milly se sentou na beira da cama e tocou seu rosto com ambas as mãos. Quando seus olhares se encontraram, ela percebeu que ele havia recuperado as lembranças de todo aquele horror que havia vivenciado.

Ainda preso em seu próprio terror, ele olhou para ela quase como se não a reconhecesse e Milly sentiu seu estômago revirar, temendo que as lembranças fizessem com que ele tivesse ódio dela por indiretamente ter lhe causado tanto sofrimento, mas então, seu semblante assustado se dissolveu. Milly viu a forma como o queixo e os lábios dele tremeram, e então, num gesto quase involuntário, Ewan tombou a cabeça no colo dela e seu choro explodiu com uma força que ele parecia ter guardado por muito tempo.

Apesar da angústia de vê-lo tão fragilizado, uma parte dela sentia-se aliviada por ele finalmente se permitir desmoronar. Ela havia conversado com Tessa há alguns dias sobre a reação dele de aparente indiferença e aceitação de tudo que lhe ocorreu. Milly esperava gritos de revolta contra ela, algo explosivo para combinar com o horror que ele havia passado, para combinar com a própria dor dela, mas segundo a Doutora Schein, a reação dele era uma resposta típica para um trauma psicológico tão extremo.

Milly o abraçou com força, desejando desesperadamente poder apagar seu sofrimento, apagar aquelas memórias, mas sabia que nada que dissesse ou fizesse poderia desfazer o que ele havia passado nas mãos daquele maldito psicopata. Enquanto ele chorava, ela acariciava suas costas suavemente.

— Tudo bem, você não está sozinho. — Ela sussurrou, depositando um beijo no topo da cabeça dela e sentindo-o se afundar ainda mais no colo dela.

Por longos minutos, os soluços de Ewan ecoaram pelo quarto, Milly sabia que ele precisava soltar o sofrimento que vinha suportando em silêncio desde que acordara então permaneceu ao seu lado, dando a ele o conforto que, naquele momento, era tudo o que podia oferecer.

As lembranças de Milly foram interrompidas quando o som agudo do toque do seu celular corta o silêncio do quarto. Ela enfiou rapidamente a mão no bolso da jaqueta e pegou o aparelho. Na tela, o nome "Mãe" piscava junto ao ícone de ligação. Ela bufou, já antecipando o conteúdo da conversa. Milly apertou os lábios, hesitante, mas atendeu.