✝️ Ao longo de seus quarenta e poucos anos, Gregório interessava-se apenas por seu ofício de sacerdote. Desde noviço, aprendera a se dedicar à fé e aos rituais da igreja, tornando-se um padre culto e respeitado em sua comunidade.
✨ Mas tudo muda qua...
O dia começara mais cedo para mim, não por pressa, mas pela inquietação que me acompanhava desde a noite anterior. Saí do grupo reflexivo antes do habitual, justificando compromissos urgentes. Era verdade, mas também uma desculpa para tentar conter a ansiedade que me consumia. Enquanto percorria uma longa viagem de ônibus, minha mente já estava na sala da gerência do museu, antevendo o que viria. Sabia que as câmeras de segurança haviam registrado o beijo que dei em Estela, e imaginar a gravidade das consequências era inevitável.
Ao entrar na sala, senti os olhares severos que já esperava. Recebi a advertência de minhas chefias de forma resignada, sem protestos. Havia algo nesses olhares que carregava mais julgamento do que o próprio beijo em si, ocorrido em horário de expediente. Como se a diferença de idade entre mim e Estela ou minha posição como mero segurança, frente à sua condição de artista, pesassem ainda mais para aquelas pessoas. Esses pensamentos iam e vinham, mas o que realmente importava era outra questão. Insisti na conversa até garantir que Estela não teria algum problema. Sua exposição ocorreria durante todo o mês, e nenhuma penalidade seria lançada sobre seu trabalho. Era isso que me aliviava ao sair dali, mesmo sob o escrutínio de olhares que ainda pareciam me seguir.
Cheguei na exposição, repleta de pessoas que caminhavam entre os quadros, gerando um murmúrio ao redor. Permaneci em um canto discreto, longe de qualquer atenção, apenas observando os visitantes que paravam diante das obras de Estela, absorvendo cada detalhe. Sentia um orgulho imenso. Aqueles traços iam além da arte; eram fragmentos dela, pedaços de sua alma que eu conhecia tão bem. Ver seus desenhos sendo apreciados pelo público, ganhando vida nos olhares atentos, era como presenciar a extensão de sua força e beleza.
Então, a vi. Estela estava cercada por um pequeno grupo, conversando animadamente. Parecia confiante e envolvida em uma felicidade genuína. Por um momento, relutei em me aproximar, mas seus olhos me encontraram de soslaio. Ela me olhou com um misto de emoções que eu não conseguia decifrar completamente. Logo depois, se despediu do grupo e caminhou em minha direção, e me lembrei da noite anterior.
Estela estava preocupada com a ideia de que eu pudesse desaparecer de sua vida novamente. Sua angústia a levou a me entregar algo muito íntimo, o seu diário, um gesto que carregava tanto significado que ainda ressoava no meu coração. Nós precisávamos conversar. E não apenas sobre o passado, mas sobre tudo que estava por vir.
– Oi – disse ela, se aproximando com um sorriso hesitante.
– Parabéns pela exposição. – Respondi, com os olhos cheios de carinho.
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– Obrigada. – Seu sorriso se ampliou, e havia algo radiante em sua expressão. – Uma pessoa muito especial me motivou a seguir desenhando, depois de um período difícil que vivi. Que vivemos. – Suas palavras soaram carregadas de ternura, os olhos esverdeados fixos nos meus, deixando claro que era a mim que ela atribuía aquela conquista.