Capítulo 4 - Notícias

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– Boa tarde, senhorita Helena. Nos deu um susto grande. Sente-se melhor?

O médico, um senhor de idade, tem um sorriso condescendente para mim, com a cabeça caída meio de lado. Espero que seja torcicolo, porque se for pena, já tive o suficiente de todos os funcionários deste maldito hospital.

– Sinto-me ótima, doutor, como se tivesse acabado de acordar de um acidente de carro. – digo com meu sorriso mais doce.

Nas últimas duas horas já me furaram diversas vezes e fiz mais exames do que achei cientificamente possível. Tudo isso enquanto recebia sorrisos falsos. Não gosto de ser o centro das atenções e não quero ser o alvo da pena alheia. Ninguém me deu uma resposta direta e tudo isto está me deixando nervosa.

– Entendo, pelo menos agora sabemos que seu senso de humor se mantém. – o médico diz.

– Devemos agradecer as pequenas bênçãos em meio ao caos. – falo com sarcasmo.

Qual meu problema? Se eu for boazinha talvez ele me diga onde meus pais estão. Finjo arrependimento:

– Desculpe, acho que perdi meus modos em meio ao choque.

– Compreendo. Vamos aguardar o resultado dos exames. Você é uma garota de muita sorte. Acreditamos em um prognóstico favorável, apenas um tempo de fisioterapia para a perna e você estará como nova.

Sorte? Estou toda dolorida, em cima de uma maca de hospital, recebendo olhares de pena e nenhuma resposta.

Falo com o médico com o sorriso mais falso que consigo:

– Muita sorte! E quanto aos meus pais? Eles também tiveram sorte?

Ele franze a testa, não gosto do seu ar de derrota.

– Helena, infelizmente não houve nada que nós pudéssemos fazer por seus pais. Me desculpe.

Não, não, isto está errado.

– Mas eles saíram assim que o fogo começou, doutor! Como não puderam fazer nada?– minha voz afligida se iguala com o desespero que sinto por dentro.

Ele me olha como se eu tivesse perdido minha cabeça:

– Não, querida, isto seria impossível.

Bato no colchão com frustração:

– Eu sei o que vi! Por que nesta porcaria de hospital ninguém acredita em mim?

Vejo o doutor olhar para a técnica de enfermagem. Será que vão me dopar novamente? Preciso me acalmar rápido ou vão achar que enlouqueci.

Ainda se usa camisa de força hoje em dia?

Coloco minha mão no peito, inclino um pouco a cabeça e tento imitar a voz apaziguadora de DJ:

– Me desculpe, ainda estou tão confusa. Tudo que preciso é ir para o meu lar. Quando poderei ser liberada?

Ambos olham para mim com pena e compreensão. Missão cumprida.

– A gente entende Helena, mas infelizmente não agora. Precisa ficar em observação por mais um tempo.

Todos dizem que é impossível que meus pais tenham saído antes do fogo começar. Será que as sombras são fruto da minha mente? Eu vi o que queria enxergar?

Ter esperanças é mais fácil do que aceitar a dura realidade: meus pais estão mortos, eu sou uma órfã, e não tenho mais ninguém.

♪♫ ♥ ♪♫

Está quente, o calor mantém o frio longe e a fumaça negra invade a noite, infiltrando meus pulmões. Tento tossir, mas não tenho forças e minha cabeça dói. Fogo! O carro está pegando fogo! Não posso me levantar, meu corpo pesa... Mamãe... Papai... Duas sombras nas chamas? Mamãe! Papai!

Elle - música, amor e amizade (Volume 1) - AmostraOnde histórias criam vida. Descubra agora