Ela passa o dedo com carinho no rosto do pequeno Chris da foto.
– O Chris. Eu o vi saindo escondido enquanto tentava entrar mais cedo para te ver. Ele usava um moletom grande com capuz, mas eu o reconheceria de qualquer jeito...
Chris está aqui! "Acorde Elle, eu voltei por você. Agora é sua vez de voltar por mim." Eu pensei que estivesse sonhando, mas ele realmente veio me visitar! Ou será que esta parte foi um sonho mesmo?
– Por que ele sairia disfarçado? – digo escondendo meu entusiasmo.
Sam dá de ombros, incerta:
– Ele disse que não queria ser reconhecido. Acho que ficou feliz quando me viu... Ele me abraçou e disse que estava com saudades...
Sua voz mostrava a insegurança que ela mantinha escondida embaixo de muitas camadas de sarcasmo e brincadeiras.
Tento animá-la:
– Ele só não quer aquelas loucas da escola babando! Imagina só, já é difícil para você com ele longe, se elas descobrissem que Chris está de volta. Você nunca mais teria paz.
Sam ri, mas é um sorriso triste.
– Você acha que se este acidente tivesse sido comigo ele teria voltado tão rápido?
Sento-me na maca e passo a mão em seus cabelos lisos, colocando-os atrás da orelha, como costumava fazer com seu irmão quando ele estava abatido.
– Ei, não fique assim! O Chris te ama muito e faria tudo por você – Sam acena com cabeça, concordando – Mas ele evita seu pai como uma praga e você morar lá resultou nisto. Tenho certeza que ele vai procurar você e sua mãe.
– Sim, Chris vai ficar naquele haras enorme fora dos limites da cidade. Ele disse que iria mandar um segurança buscar nós duas. – ela está mais animada.
– Não sabia que aquilo era um hotel.
Sam sorri com tom conspiratório:
– E não é, mas quando se tem dinheiro e fama pode-se conseguir o que quiser para ficar longe do papai...
Começamos a rir, quando a porta do quarto de repente é aberta e como se tivesse sido invocado, eis que surge O Delegado, com seus quase dois metros de puro autoritarismo ariano.
Sam pula da cama e bate continência:
– Senhor, boa tarde, senhor. Permissão para vazar daqui, senhor!
É quase impossível conter o riso. Sam é a única que quando tenta mostrar algum respeito consegue ser ainda mais desrespeitosa. O Delegado a examina da cabeça aos pés. Está irado por causa do uniforme, enquanto Sam apenas sorri com falsa doçura para o pai, pega sua bolsa e sai correndo o mais rápido que pode.
Agora estou a sós com O Delegado, respiro fundo e me preparo para o golpe. Nada de bom pode vir de uma visita dele. Será que já descobriu a volta de Chris? Ele poderia me culpar por isto... Mas quando seu olhar se vira para mim, não é raiva, frieza, pena ou mesmo o distanciamento habitual que percebo em seu semblante: é pesar.
– Ah, minha filha, que tristeza tem sido essas últimas horas!
Ele se aproxima da maca e me abraça meio sem jeito. Estou em choque, acho que só recebi abraços dele em meus aniversários e até uns seis anos de idade. Choramingo, não só por emoção, mas também por minhas costelas doloridas, e ele me solta um pouco.
– Perder seus pais foi uma tragédia, mas achar que ia perder você tem sido uma tortura. Você é como uma filha para mim também. – ele me fala com emoção.
Eu não sabia que este homem era capaz de sentir, muito menos expressar qualquer emoção. Devo ter morrido e ido parar em alguma realidade alternativa. Eu sofro uma concussão e ele que fica com sequelas? Não sei como reagir. Uma filha para ele? Não muito reconfortante, considerando como ele agiu com Chris, que é o filho dele.
– Obrigada, senhor, estou bem agora. – digo com desconforto.
Ele aperta meu ombro, volta a ficar em uma posição ereta e retira uma caderneta de um dos bolsos. Acho que o momento união acabou.
– Me desculpe Helena, mas esta visita não é apenas social. Preciso do seu depoimento. Você lembra de algo que possa ajudar a identificar o outro carro envolvido no acidente?
Ele fala em modo policial e sinto que tenho dez anos e estou sendo novamente interrogada pela destruição do sino histórico da Igreja. Não que eu tenha alguma relação com este pequeno incidente de destruição do patrimônio público, claro. Não preciso pensar muito para saber a resposta:
– Não vi nada do outro carro, estava escuro, o senhor sabe que não há postes naquele trecho e a única luz vinha dos faróis. Além disso, não lembro de muita coisa, tudo ainda está confuso na minha cabeça.
Decido não falar das sombras nas chamas, ninguém nunca vai acreditar em mim mesmo.
– É, eu sei, menina, mas tinha que perguntar. – ele fala sem olhar para mim.
O que ele tanto anota neste papel? Deve estar fazendo rabiscos, pois eu não falei nada de relevante. Não sirvo para ajudar a trazer justiça para os meus pais, sou uma inútil. Preciso fazer algo da minha vida.
– Se eu lembrar de algo, direi. – falo com sinceridade.
– Ok, me procure se precisar de qualquer coisa. – seu tom de voz é plano, acho que esgotou seu estoque de emoções.
Ele começa a sair, mas para segurando a maçaneta.
– Imagino o que você pensa de mim, mas eu não sou um vilão. Chris tinha uma escolha e a decisão dele foi humilhante para mim. Eu sei que ele está na cidade e o que está tentando fazer por você – ele se vira para mim com o rosto solene – Você também tem uma escolha, pode vir morar em nossa casa, Sam iria adorar. Não precisa segui-lo nesta vida degradante e promíscua que ele leva.
Minutos atrás achei que O Delegado poderia ter um coração, mas ele só pensa no seu estúpido orgulho. Tolo teimoso.
– Não sei do que o senhor está falando, não vi seu filho – olho para ele com a raiva acumulada durante anos – Mas se alguém deveria sentir vergonha é o Chris, por ter um pai egoísta, autoritário, teimoso que se acha o dono da verdade só porque é o delegado! O senhor tem sua vida tão limitada no mesmo ciclo repetitivo que não percebe como o próprio filho é talentoso e quanto ele conquistou sozinho nos últimos anos! E se ele tivesse morrido? Me diga! Você viveria bem com isso?
Ai, meu Deus! Disse tudo sem pausa, meu peito sobe e desce do esforço e da raiva. Eu realmente devo ter batido minha cabeça forte para finalmente estar enfrentando O Delegado e falando deste jeito. Estou me tremendo, porém se eu desmaiar ele não vai me prender, não é? Ele está tenso, punhos fechados ao lado do corpo.
– Como disse, não sou vilão, por isto darei uma pequena indulgência. Ele tem três dias antes que eu reabra o caso do sino da igreja. Encontrei algumas digitais interessantes que não apareceram nos autos da época, estamos compreendidos?
– Claro. – digo com falso desinteresse.
E sem mais palavras ele vai embora. Eu sabia que não deveria tê-lo irritado! Quais as chances de convencer Sam a entrar na delegacia e destruir algumas provas?
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AVG
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