Quatro anos depois
Quando era pequena, descobri que precisava de um esconderijo secreto. Não que meus pais fossem ruins e eu precisasse fugir deles: na verdade, não sabia que queria um até que entrei no meu pela primeira vez.
A escada para o sótão ficava acima do meu quarto, escondida atrás de um falso espelho. Foi meu presente de aniversário aos quatro anos, lembro-me bem daquele momento:
Minha festa havia acabado e eu ainda estava vestida de Cinderela e Chris de príncipe encantado. Mamãe nos colocou em frente ao espelho e disse:
– Vamos Elle, empurre a moldura, quero mostrar meu presente!
Era pesado e Chris precisou me ajudar. Quando terminamos, havia uma enorme escada! Subimos correndo e eu cheguei ao topo sem fôlego e sem palavras com tamanha alegria: estava em um mundo encantado!
As paredes eram pintadas com flores de todas as cores, árvores e um castelo! O chão parecia grama; mamãe explicou que era um carpete. E tinha um janelão de vidro, eu podia ver toda a rua e meu quintal. O sol ao longe já estava se escondendo, pintando tudo de laranja, parecia mágica!
Olho para o Chris e ele aponta para o teto. A luminária era em formato de sol e quando a luz se apagava, várias estrelas se acendiam formando um céu só para mim. Eram tantas novidades que eu não conseguia ver tudo. Estava em meu próprio jardim encantado. Todos os meus brinquedos estavam aqui, arrumados em prateleiras ou caixas. Havia também um pequeno palco com cortina.
Minha mãe se vira para o Chris e diz:
– Aqui não seria o cantinho especial da Elle sem um lugar para você, não é?
Ela aponta para o outro lado e vemos vários brinquedos de menino junto com um pequeno violão. O sorriso no rosto dele brilha mais que a luz do sol.
– Chris, querido, lembra como eu e Elle ficamos felizes com sua apresentação da escola? Você parecia um anjo cantando e tocando! Sua professora é minha amiga e me disse que você gostou tanto e aprendeu muito rápido, mas seu pai não gosta muito, não é?
– Não, tia Liz, só a mamãe achou bonito.
Ele não estava sorrindo mais, seu papai não era como o meu, ele nunca brincava com a gente, não parecia ser feliz. Antes eu tinha medo dele, mas comigo e com Sam ele não era tão mau, só com Chris.
– Eu sei, amor, sua mãe ficou muito orgulhosa de você, ela te ama muito, lembre-se sempre disso. Eles dois te amam. –ele apenas balança a cabeça concordando – Mas eu percebi que você merece ter seu próprio violão. Você pode brincar com seu violão aqui nesse palco. Esse é o mundo encantado de vocês, o esconderijo secreto dos dois.
Chris a abraça forte:
– Obrigado, tia, estou tão feliz!
Eu pulo de alegria.
– Mamãe, a senhora é a melhor mãe do mundo!
Ela nos abraça e diz:
– Lembrem-se crianças, esse tem que ser nosso segredinho, ok?
– Sim!
Nós dois gritamos e pulamos. Em seguida, mamãe foi embora e brincamos até adormecer no nosso lugar especial.
Sentada aqui, tantos anos depois, sinto a lembrança agridoce. A atitude da minha mãe pode ter sido controversa. Ela deu um presente sabendo que o pai da criança não aprovaria e isto definiu o futuro dele. O que teria acontecido se não fosse aquele primeiro violão?
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