O início de uma lenda

Inocente

Panelas soltavam fumaças e apitavam em harmonia no fogão, um aroma de comida caseira sendo preparada tomava conta da cozinha quase ocultando o cheiro das rosas amarelas recém colhidas que enfeitavam a mesa de jantar juntamente com algumas velas, os pratos, talheres e taças já estavam estrategicamente dispostos somente esperando a chegada da refeição. Lílian estava toda arrumada com um vestido preto levemente rodado e maquiada, um avental branco com babados protegia seu traje enquanto ela cozinhava, não queria uma mancha de molho em sua melhor roupa. Alimentava Harry com uma mão enquanto mexia a panela com a outra e em pequenos intervalos dava um gole em sua taça de vinho tinto.

Tentava pensar somente na música do piano que Tiago estava tocando na sala de estar, estava totalmente nervosa. Iria dar uma grande notícia para o marido naquela noite, mas ainda não decidira se aquilo era bom ou ruim, não conseguia se decidir. Inventara uma desculpa para toda a preparação daquele jantar, disse que queria relembrar os momentos antes de Harry nascer quando eles todas as noites iam a um restaurante ou saiam para dançar.

Observava o filho bocejar com maior frequência, terminou de dar a última colherada e o pegou no colo, abaixou o fogo e foi indo em direção à porta. Parou um pouco antes para analisar onde o marido estava e vendo que ele continuava a tocar o piano foi até uma gaveta e pegou um papel que estava dobrado em três partes, deu um pequeno sorriso ao ler o que estava escrito pela milésima vez, já até sabia decor cada mínimo detalhe do conteúdo da carta, deu um beijo estalado na bochecha do filho e deixando com a marca do batom vermelho.

-O jantar já está pronto?- Tiago apareceu na soleira da porta, nem havia percebido que a música havia cessado. Com maestria escondeu a carta atrás do corpo do bebê para que não fosse vista.

-Está sim, só vou fazer o Harry dormir e poderemos aproveitar a nossa noite- respondeu com um sorriso maroto.

- Você quer que eu vá e faça isso? Você trabalhou tanto, descanse um pouco- fez menção de o pegar, mas não podia deixar que visse a carta antes do momento certo.

-Fique tranquilo, adoro fazer isso, e você já o colocou ontem, hoje é a minha vez- respondeu indo em direção às escadas.

Acomodou-o em seus braços e enquanto andava pelo corredor dava pequenas balançadas vendo seus olhos relutantes cerrarem aos poucos, o quarto dele era o último, ao entrar deixou a carta em cima da cômoda e pasou a cantarolar, ainda o balançando, uma canção que sempre ouvira de sua mãe, sua respiração estava quase se tornando regular até que ouviu o som do abajur caindo e se quebrando no andar inferior.

-Querido? Está tudo bem ai?- perguntou sem obrer nenhum resposta.

***

Sirius acabara de estacionar sua moto na frente do esconderijo de Pedro, queria saber notícias dos Potter já que não podia visita-los, recebia recorrentes cartas deles entregues por Pettigrew, mas não era o mesmo, sentia muito saudade de todos eles.
Estava também a visita-lo por estranhar que não tivesse aparecido na Ordem ou dado notícias há alguns dias. Retirou o capacete e organizou o cabelo usando o retrovisor. O sentimento de que algo estava errado cresceu em proporções absurdas assim que viu toda a casa apagada e a porta de entrada aberta. Pegou a sua varinha e foi entrando pé ante pé iluminando o caminho por onde passava. Os móveis estavam todos no chão e espalhados, uma perfeita cena de arrombamento e sequestro, perfeita até demais. Tentou procurar pelo resto da casa se encontrava o amigo, porém foi uma tentativa frustrada, não havia ninguém lá.

Sentiu um aperto forte no estômago, tudo indicava que algo muito errado acontecia, começou a suar frio. Mandou um patrono para Dumbledore avisando sobre seus receios e seguiu para a sua moto, colocou o capacete e quando se sentou respirou fundo torcendo para não estar certo e imaginando uma desculpa para dar para explicar o porquê ele sabia do endereço dos Potter mesmo não sendo o fiel do segredo.