O céu profundo é, de todas as impressões visuais, a maissemelhante a um sentimento.SAMUEL TAYLOR COLERIDGE, CADERNO DENOTAS (1805)
O azul de uma manhã de maio sem nuvens ou o vermelho e o laranja de umpôr-do-sol sobre o mar levaram os seres humanos ao deslumbramento, à poesia e àciência. Não importa o lugar onde vivemos sobre a Terra, não importa qual seja a nossalíngua, costumes ou política, temos um céu em comum. A maioria de nós espera esseazul-celeste e ficaria estupefata, com boas razões, se acordasse ao amanhecer edescobrisse um céu sem nuvens que Los Angeles e da Cidade do México seacostumaram com céus marrons, e os de Londres e Seattle com céus cinzentos - masmesmo eles ainda consideram o azul a norma planetária).
Entretanto, há mundos com céus pretos e amarelos, talvez até mesmo verdes.A cor do céu caracteriza o mundo. Joguem-me sobre qualquer planeta do Sistema Solar;sem sentir a gravidade, sem olhar para o solo, somente com uma rápida olhada para oSol e o céu, acho que posso lhes dizer com bastante acerto onde estou. Esse tomfamiliar de azul, interrompido aqui e ali franceses têm uma expressão, sacré-bleu!, quenuma tradução aproximada seria "Céus". Literalmente, significa "azul sagrado". Semdúvida. Se houver algum dia uma verdadeira bandeira da Terra, essa deverá ser a suacor.
Os pássaros voam no azul, as nuvens estão ali suspensas, os seres humanos oadmiram e com ele convivem, a luz do Sol e das estrelas esvoaça por ele. Mas o que éafinal? Onde termina? Qual o seu volume? De onde vem todo esse azul? Se é um lugarcomumpara todos os seres humanos, se caracteriza o nosso mundo, certamentedevemos saber alguma coisa sobre ele. O que é céu?
Em agosto de 1957, pela primeira vez um ser humano elevou-se acima do azule olhou ao redor - quando David Simons, oficial da reserva da Força Aérea e médico,tornou-se o ser humano mais alto da história. Sozinho, ele pilotou um balão até umaaltitude superior a 30 quilômetros e, pelas janelas de vidro grosso, vislumbrou um céudiferente. Atualmente professor da Escola de Medicina da Universidade da Califórniaem Irvine, o dr. Simons lembra que acima de sua cabeça havia um roxo forte e escuro:havia alcançado a região de transição, em que o azul do nível do solo esta sendoinvadido pelo preto perfeito do espaço.
Desde o vôo quase esquecido de Simons, pessoas de muitas nações voaramacima da atmosfera. É agora evidente, depois de repetidas experiências humanas (erobóticas) diretas, que no espaço o céu diurno é preto. O Sol brilha resplandecente sobrea nave. A Terra lá embaixo é brilhantemente iluminada, mas o céu acima é preto como anoite.
Eis a descrição memorável de Yuri Gagarin sobre o que viu no primeiro vôoespacial da espécie humana, a bordo da Vostok 1, em 12 de abril de 1961:
"O céu é totalmente preto; e, contra o pano de fundo desse céu negro, as estrelas parecem umpouco mais brilhantes e mais distintas. A Terra tem um halo azul muito bonito, muito característico, quese pode divisar com clareza, quando se observa o horizonte. Há uma transição harmoniosa de cores, doazul suave para o azul, depois para o azul escuro e o violeta e, então, para a cor totalmente preta do céu. Éuma transição muito bela."
Evidentemente, o céu diurno - todo esse azul - tem alguma conexão com o ar.Mas quando você olha para o outro lado da mesa na hora do café da manhã, o seucompanheiro (em geral) não é azul; a cor do céu não deve ser a propriedade de umpouco de ar, mas de um grande volume de ar. Se examinada atentamente a partir doespaço, a Terra aparece rodeada por uma fina faixa azul, da espessura da atmosferainferior; na realidade, é a atmosfera inferior. No topo dessa faixa, é possível ver o céuazul desaparecendo gradualmente na escuridão do espaço. Essa é a zona de transiçãoque Simons foi o primeiro a invadir e Gagarin o primeiro a observar do alto. Num vôoespacial de rotina, começamos na parte inferior desse azul, penetramos em toda a suaextensão alguns minutos depois da decolagem, e depois entramos naquele reino semlimites em que a simples respiração é impossível sem elaborados equipamentos de vida.Para a sua própria existência, a vida humana depende desse céu azul. Temos razão emconsiderá-lo suave e sagrado.
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Pálido Ponto Azul-Carl Sagan
No FicciónOBS: """os capítulos estão com um problema no espaçamento entre as palavras, dentro de uma semana será corrigido""" Por que gastar fortunas com programas espaciais quando há tantos problemas aguardando solução a poucos metros de nossas casas? Para...