EXPLORANDO OUTROS MUNDOS E PROTEGENDO O NOSSO

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Em seus vários estágios de desenvolvimento, os planetas estão sujeitos às mesmas forçasformativas que operam em nossa terra, tendo, portanto, a mesma formação e provavelmente a mesma vidageológica de nosso passado e, talvez, de nosso futuro; mas, além disso, estas forças estão atuando, emalguns casos, em condições totalmente diferentes daquelas em que operam sobre a Terra, e por isso devem desenvolver formas diferentes das conhecidas pelo homem. O valor do material desse tipo para asciências comparadas é tão óbvio que dispensa qualquer comentário.ROBERT H. GODDARD, CADERNO DE NOTAS (1907).Pela primeira vez na minha vida, vi o horizonte como uma linha curva. Era acentuado por umafina camada de luz azul-escura - a nossa atmosfera.Sem dúvida, não era o "oceano" de ar de que me haviam falado tantas vezes na minha vida.Fiquei aterrorizado com a sua aparência frágil.ULF MERBOLD, ASTRONAUTA ALEMÃO DO ÔNIBUS ESPACIAL (1988).


Quando se olha para a Terra do alto de uma órbita, vê-se um mundoencantador e frágil incrustado no vácuo preto. Mas espiar um pedaço da Terra pela vigiade uma espaçonave não se compara à alegria de vê-la inteira contra o fundo preto ou,melhor, passando rapidamente pelo campo de visão de quem flutua no espaço sem oestorvo de uma nave espacial. O primeiro ser humano a ter essa experiência foi AlexeiLeonov, que saiu da Voskhod 2 para o primeiro "passeio" espacial em 18 de março de1965: "Olhei para a Terra", recorda ele, "e o primeiro pensamento que me passou pelacabeça foi: O mundo é redondo, afinal de contas. Num relance, eu podia ver deGilbraltar ao mar Cáspio... Eu me sentia como um pássaro - com asas e capaz de voar.

Quando se vê a Terra de um ponto ainda mais distante, como fizeram osastronautas da Apollo, o seu tamanho visível encolhe, até restar apenas um pouco dageografia. Fica-se impressionado com a sua auto-suficiência. Um átomo de hidrogêniovai embora de vez em quando; um rufo de poeira cometária aparece. Gerada na imensae silenciosa usina termonuclear nas profundezas do interior solar, a luz do Sol sederrama em todas as direções, e a Terra intercepta o suficiente para criar um pouco deiluminação e o calor necessário aos nossos objetivos modestos. Afora isso, este pequenomundo é auto-suficiente .

Da superfície da Lua pode-se vê-la, talvez como crescente, e até seuscontinentes ficam então indistintos. E de um ponto de observação além do planeta maisafastado, é um mero ponto de luz pálida.

Da órbita da Terra, o que impressiona é o arco luz suave do horizonte - aatmosfera fina da Terra vista tangencialmente. Compreende-se então por quê já nãoexiste um problema ambiental local. As moléculas são estúpidas. Devido à suaignorância insondável, os venenos industriais, os gases de estufa e as substâncias queatacam a camada protetora de ozônio não respeitam fronteiras. Eles se esquecem danoção de soberania nacional. E assim, graças aos poderes quase míticos de nossatecnologia (e à predominância do pensamento de curto prazo), estamos começando - emescalas continentais e planetária - a criar um perigo para nós mesmos. Simplificando:para que esses problemas sejam resolvidos, muitas nações terão de agir de comumacordo durante muitos anos.

Mais uma vez me impressiona a ironia de que os vôos espaciais - concebidosno caldeirão das rivalidades e ódios nacionalistas - tragam consigo espantosa visãotransnacional. Quando, mesmo por pouco tempo, se contempla a Terra do alto de umaórbita, até os nacionalismos mais profundamente arraigados começam a ser corroídos.Parecem brigas de insetos numa ameixa.

Se estamos presos a um mundo, estamos limitados a um único caso; nãosabemos que alternativas são possíveis. Então - como um conhecedor de artefamiliarizado apenas com pinturas da tumba de Fayoum, como um dentista que só sabe tratar de molares, como um filósofo que estudou apenas o neoplatonismo, como umlingüista que somente conhece o chinês ou como um físico cujo conhecimento dagravitação se limitasse à queda dos corpos sobre a Terra - nossa perspectiva se encurta,nossas intuições ficam limitadas, nossas capacidades de previsão restritas. Ao contrário,quando exploramos outros mundos, o que antes parecia ser a única forma possível deum planeta revela-se na faixa média de um vasto espectro de possibilidades. Ao olharpara esses outros mundos, começamos a compreender o que acontece quando temosexcesso de uma coisa ou carência de outra. Aprendemos como um planeta pode darerrado. Adquirimos uma nova compreensão, prevista pelo pioneiro do vôo espacialRobert Goddard, chamada planetologia comparada.

Pálido Ponto Azul-Carl SaganOnde histórias criam vida. Descubra agora