15: onde ninguém vá nos perturbar

38.7K 3.8K 1.8K
                                    

SILVIA PONDEROU ATÉ concluir que a coisa mais sensata a se fazer era tentar lidar com o demônio que elas já conheciam – ou seja, o Professor Tomás

Ops! Esta imagem não segue nossas diretrizes de conteúdo. Para continuar a publicação, tente removê-la ou carregar outra.

SILVIA PONDEROU ATÉ concluir que a coisa mais sensata a se fazer era tentar lidar com o demônio que elas já conheciam – ou seja, o Professor Tomás. Além do evidente elemento de vantagem que era a própria Alana, provavelmente a melhor distração que elas conseguiriam arrumar para ganhar algum tempo, seria mais fácil tomar sabe-se lá quais providências em relação a Tomás Barth do que a um suposto traficante de drogas, sem rosto e sem nome até onde elas sabiam.

— Proponho o seguinte plano: — disse Silvia, afastando a cabeleira do rosto enquanto metia o tablet dentro da mochila — Alana, que já está acostumada com essa sacanagem, vá distrair o Tomás por pelo menos uma tarde, garantindo especialmente que ele não use o celular para checar e-mails ou mensagens. — e, dirigindo-se para Alana: — Acha que pode fazer isso?

— Claro que ela pode. — comentou Brenda, com desdém — É só enfiar a língua na garganta dele de novo, unir o útil ao agradável.

Alana revirou os olhos.

— Eu posso fazer isso, Sil. — garantiu, se preocupando em não demonstrar o quanto ela gostaria de ocupar o Professor Tomás para que ele não prestasse atenção em mais nada. E quem podia culpá-la? Se você tivesse ganhado um beijo como aquele, também estaria pouco se importando com essa história de traficante.

— Ótimo. Assim que ele sair do Colégio para almoçar, eu e Brenda entramos na sala dos professores. Eu só preciso de alguns minutos com o computador dele para pegar todas as informações que precisamos saber. — concluiu ela, atordoada — Depois disso, Alana dê um jeito de ocupar o Professor à tarde... — e ao ver os olhares julgadores de Brenda, acrescentou — Tudo em prol de nós mesmas, é claro.

— Como assim? — protestou Brenda, sacudindo o rabo-de-cavalo de um lado para o outro — Eu é que não vou entrar na sala dos professores para roubar o computador do Tomás!

— Mas entrar na propriedade dele e tacar fogo em tudo, sem problemas. — ironizou Alana, soltando uma risadinha nasal.

— Eu fiz isso por você, tonta. — argumentou Brenda, e Alana até consideraria isso um gesto de meiguice, se não viesse pelo tradicional olhar assassino-incendiário de Brenda — E a propriedade nem era dele.

— Dá pra vocês duas pararem? Nós já temos um prato cheio aqui, sem vocês duas tentando se explodir! — Silvia já estava bem cansada de ter que repreender as briguinhas infantis de Alana e Brenda, e estava particularmente consumida pela ideia de que um traficante vingativo viria atrás delas pelos dois milhões de reais (ou pior) — Depois eu e Brenda damos um jeito de trabalhar com o que descobrimos. Se ele estiver limpo, menos um problema. Se não... a gente vê o que faz a partir daí.

— Eu vou atrás do Tomás. — falou Alana, definitivamente. Olhou para ambas as meninas pela última vez antes de seguir pelo corredor, quase não conseguindo acreditar que há apenas alguns meses tudo que faziam juntas era assistir a filmes ruins, e agora estavam invadindo propriedades, incendiando coisas, hackeando sistemas de polícia e roubando dados pessoais de computadores de um de seus professores.

Procurou o Professor por praticamente toda a escola, e ele não parecia estar para ser encontrado. Não pôde deixar de sentir uma pontinha de ciúmes ao pensar que ele devia bem estar às gargalhadas com a Professora Cristina, fato que a preocupava muito mais do que a possibilidade de que ele fosse efetivamente um traficante de drogas.

Aliás, que ideia essa da Silvia também hein? Até parece que o Tomás, provavelmente o maior nerd que já tinha pisado em Aquino, ia ser um traficante de drogas. Tomás era do tipo que usa colete de lã e fica o dia inteiro em casa lendo Hemingway e acariciando um buldogue francês. Sério, era muito mais fácil imaginá-lo ao lado de cachorrinhos fofos do que num beco escuro vendendo ilícitos a adolescentes.

Tão perdida em seus pensamentos, nem percebeu que enquanto descia as escadas em direção ao térreo, ele estava subindo, com os olhos colados no celular, digitando furiosamente. Por pouco não se esbarraram, e Alana parecia sem qualquer controle do próprio corpo quando começou a dizer:

— Oi.

— Olá. — disse ele, sorrindo aquele tal sorriso que transformava o rosto inteiro.

— Eu estava pensando... — começou Alana, que não conseguia pensar em nada. E não sabia direito se era a paranoia ou se tinha passado tempo demais ouvindo toda aquela baboseira de que o Professor era traficante, mas não pôde deixar de notar que ele se enrijecera instantaneamente antes que ela continuasse: — Quero dar o fora daqui. Com você.

Não era a sua formulação mais brilhante, mas definitivamente foi eficaz. A tensão deixou o corpo de Tomás e em questão de segundos, e os olhos dele lampejaram à luz que atravessava os vitrais do Colégio Santa Luzia para Garotas.

— Onde você quer ir? — perguntou ele, com um sorriso de canto. Alana percebeu que ele enfiava o celular no bolso da frente de sua calça de alfaiataria, longe das vistas. Ótimo, agora ela só precisava mantê-lo ali.

Onde ninguém vá nos perturbar.

Nenhuma palavra precisou ser dita depois disso. O Professor agarrou Alana pela cintura e encarou seus olhos cinzentos como quem pergunta se ela tinha certeza do que estava fazendo. E ela tinha.

Era uma sensação bem peculiar, na verdade. Ela percebia o apavoramento generalizado de suas melhores amigas, e até conseguia identificar a racionalidade daquilo, muito embora incendiar um depósito de drogas ilícitas por acidente pareça refutar qualquer traço de lógica que uma situação possa ter. Mas Alana não estava com medo. Alana só conseguia sentir... excitação.

Tinha certeza de que quando Silvia sugeriu que ela enrolasse o Tomás por algumas horas, isso provavelmente não significava agir de maneira irresponsável entrando no carro dele em plena luz do dia, bem em frente à escola, e ir até o apartamento dele – que ficava do outro lado de Aquino – para passar a tarde toda entre quatro paredes.

Quando se enfiou em seus pijamas (ou a camiseta de algodão do Professor improvisando um), e colocou a cabeça no travesseiro – ainda sem ouvir sequer uma palavra de Silvia e Brenda, que não faziam o favor de atender o telefone – ao lado do travesseiro de Tomás, se deparou com o pensamento de que aquilo era algo que não se podia dizer de qualquer garota. Afinal, quantas meninas de quinze anos podiam dizer que tinham um relacionamento (no sentido primitivo da palavra) com um Professor de Literatura que, por acaso, era um possível traficante de drogas, e comandava um pequeno cartel numa cidadezinha de interior? Ah, claro, e que, num momento passional, ela e suas melhores amigas incendiaram uma propriedade contendo toda a mercadoria?

Silvia ainda não tinha se manifestado, então ela estava perfeitamente autorizada a passar o resto da noite com Tomás, garantindo que ele não chegasse nem perto do telefone.

Pensem o que quiserem. Alana achava tudo aquilo o máximo. Senão estivesse acontecendo com ela mesma, ela não acreditaria. Pouco antes de ceder ao sono, o último pensamento que passou por sua mente barulhenta foi que talvez, e apenas talvez, não se deva confiar em Boas Meninas.

 Pouco antes de ceder ao sono, o último pensamento que passou por sua mente barulhenta foi que talvez, e apenas talvez, não se deva confiar em Boas Meninas

Ops! Esta imagem não segue nossas diretrizes de conteúdo. Para continuar a publicação, tente removê-la ou carregar outra.
Não Confie Nas Boas MeninasOnde histórias criam vida. Descubra agora