Mistérios

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— O prazer é todo meu.

E estava mesmo sendo. Mesmo que sua presença misteriosa causasse calafrios desde os meus pés ao ultimo fio de cabelo. Lançou-me um olhar familiarizado, como se não fosse à primeira vez que nos encontrávamos. Sorriu sorrateiro e de forma presunçosa, sem duvida era uma das raposas mais espertas, acostumadas a ter o que queria. Blake pigarreou e nos indicou os assentos, três poltronas voltadas uma para outra formando uma pequena sala de estar, logo ao lado uma estupenda mesa de carvalho que se estendia por quase toda extremidade da sala:

— Bom, já que estamos todos aqui podemos discutir os preços pelo diário de família. — Começou Blake — O diário de Jaqueline tem mais de 400 anos, foi passado de geração em geração e devo dizer que está em excelente estado de conservação Sr.Thorn.

—Soube que doaria o diário para um museu de história, Srta. Horn — Voltou-se para mim. Seus olhos se estreitaram suspeitos, me sentia uma peça falsa entregue a um especialista, acabando completamente com o meu intuito de ficar calada.

—Era minha primeira opção Sr.Thorn. Não acho que algo tão magnífico devesse ficar escondido na sala de um colecionador. Não concorda?— O encarei da mesma forma, que pareceu incomodado. Voltando seus sentidos para Blake começaram a discutir os preços, o estado do artefato e as formas de pagamento. De vez ou outra me olhava de relance, apenas para avisar de que estava ciente de minha presença.

— É um colecionador muito jovem — Afirmei. Ele e Blake me olharam surpresos. Não esboçou nenhuma reação, permaneceu com o semblante neutro que o caracterizava, sombrio.

—Não acha que é a única a permanecer com as tradições da família não é mesmo senhorita Lilian?

—Talvez devêssemos assinar o contrato e dar baixa na compra — Interveio Blake, como sempre tentando apaziguar a situação, estendendo a bandeira branca.

Eu poderia assinar o contrato, poderia mesmo, mas em toda a minha vida nunca senti uma ligação tão forte como estava sentindo por aquele objeto. Sublime, misterioso, que guardava os dias e o passado de uma ancestral. O que ela fazia e como eram seus sentimentos. Pensei no diário, devidamente guardado em minha bolsa, protegido, como nunca estivera antes. Pensei em Jaqueline, e em como estava se sentindo onde quer que estivesse, vendo seus segredos estarem prestes a serem revelados e novamente escondidos numa sala onde haveria coisas tão mais inferiores.

— Eu mudei de ideia — Me levantei.

—O que?

—Lilian o que está fazendo?— Blake parecia não ter gostado da ideia, segurou minha mão antes que eu decidisse sair da sala, algo que com certeza passou por minha cabeça. Eu não estava bancando a teimosa, ou desafiando o Blake como o mesmo parecia me dizer com seus olhos, mas não ia entregar o diário que passou pelas mãos da minha mãe, o diário que passou pelas mãos de Jaqueline a um desconhecido.

—Está completamente certo, Estou... Permanecendo com as tradições da família. O diário é muito valioso e o Sr.Thorn não pode pagar por ele.

—Tínhamos um acordo— insistiu exasperado.

— Sinto muito. Agora se me dão licença...

—Lilian! Volte aqui, Lilian!

Atravessei a recepção em direção ao elevador, onde todos os dedilhar de teclados haviam cessado e os funcionários voltados para a sala de reunião. Ao chegar ao Hall pude ver Caleb se engraçando com uma das recepcionistas que parecia mesmo estar gostando da conversa, ela estava com queixo apoiado sobre as mãos e ria com vontade. Pra isso que servem canetas!

Com o diário de Jaqueline em mãos tentei atravessar todo o salão de forma despercebida:

—Lilian! — Caleb tentou acompanhar meus passos: — A onde está indo?

A Desolação Do VampiroOnde histórias criam vida. Descubra agora