Anoitecer

47 1 0
                                    


— Jaqueline Cher...

O breu tomava conta de todo ambiente, exceto por uma fresta no teto que emitia luz sobre o corpo de um homem acorrentado. De cabeleira ruiva e de rosto magro e ossudo deixava transparecer as olheiras de quem não dormia há dias. Nada se parecia com a fera que tentou me matar a algumas noites anteriores. Estava estirado ao chão, numa posição de crucifixo, um sorriso malicioso brotou em seus lábios. Com os olhos medi a corrente ao qual estava preso, calculando a distancia mais segura. O galpão estava repleto de algumas caixas e grande tonéis de aço, não tentei imaginar o que trazia lá dentro. Meus passos foram cuidadosos, e novamente aquela sensação de inferioridade. Eu era só uma humana, nada me comparava a uma fera como aquela.

—Na verdade é Lilian. Tentou me matar, não se lembra?

O rapaz ergueu a cabeça, e sustentou o tronco sobre os cotovelos. Suas roupas eram brancas, desde a camisa de mangas longas até a calça, o que me fez perceber que assim como eu, estava nu quando chegou ali.

—Duas vezes — Disse irônico: — Não se lembra?

Deitou-se novamente, mas dessa vez usou as mãos para apoiar a cabeça numa posição relaxante. O que eu estava fazendo? Batendo papinho com o lobisomem que quase arrancou minha garganta. Ousei me aproximar um pouco mais, traçando uma linha imaginaria entre nós dois.

—Então foi você da primeira vez. Mas ainda me chama de Jaqueline. Não sou Jaqueline, na verdade não entendo porque você tentou me matar!

Ele arfou como se estivesse cansado, e com o dedo enriste apontou para mim, virando a cabeça para me fitar, então novamente pude reconhecer seus olhos:

—Vocês humanos tem que parar de pensar que somos seres que protegem a natureza. Somos demônios, não salvamos pessoas, nos alimentamos delas, é assim que somos. Além do mais você me lembra muito a vadia da Jaqueline.

— Conheceu Jaqueline?

Era impossível, até onde eu sabia lobisomens não viviam tanto tempo.

Ele se sentou cruzando as pernas, e sedutoramente colocou uma das mechas dos cabelos crescidos para trás.

—Ora, ora... Mais do que imagina — Lançou um olhar de luxuria sobre meu corpo, recuei alguns passos: — Mas tenho que reconhecer que não me daria ao trabalho de matá-la, do jeito que as coisas estão conspirando ao meu favor, você vai morrer antes que eu tenha o prazer de arrancar o seu rim.

—Não pode me assustar. Sei do que está falando, eu já sei sobre o Vlad, sobre Jaqueline...

—Então não vou precisar explicar como continuo vivo — Pareceu decepcionado antes de exibir um sorriso macabro, onde seus olhos se ascenderam amarelados e os seus caninos ameaçadores: — Fiz com o meu hospedeiro o mesmo que Jaqueline vai fazer com você, só que ela vai precisar de uma... Ajudinha.

— Está falando de bruxaria? Foi assim que tomou o corpo do seu hospedeiro? Porque se for...

—Eu tive mais sorte, meu hospedeiro era um ser sobrenatural, um licantropo, não precisou de feitiços. Quando completou a idade em que eu tinha quando morri, eu voltei, simples assim. E se soubesse mesmo sobre Vlad, não estaria aqui agora...

—Está mentindo!

—Porque eu mentiria? Fui mandado pela própria Janeth, irmã de Jaqueline, acho que já foram "Apresentadas" — Riu de maneira suspeita: — Acho que se arrependeu de ter tentado salvar a sua pobre irmãzinha... — Trincou os dentes — Não pense que Jaqueline é um anjo imaculado. É um demônio, uma vadia da pior espécie, pena que Janeth descobriu isso tarde demais...

A Desolação Do VampiroOnde histórias criam vida. Descubra agora