Sinais

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O dia passou depressa, mas do que eu imaginava por sinal, e a Emily ter trazido o meu almoço tornara tudo ainda mais estranho. Ela me encarava enquanto comia, mas ignorei este fato. Eram claro os sentimentos que ela nutria pelo Kian, porém decidi não perguntar, seria muito atrevimento.


Me preparei antes que todos acordassem novamente, era meio estranho ficar só durante todo o dia e a noite ver pessoas encherem aquele lugar como um playground noturno.


Nada melhor do que fica sozinha num banheiro feminino com a casa repleta de vampiros. Chacoalhei os pensamentos para fora de minha cabeça. Eu não conseguia mesmo depositar fé naquele pequeno colar reluzente em meu pescoço.


O único barulho daquele lugar era o secador de cabelos defeituoso que Freya me emprestou, o pobre aparelho somente desligava se fosse arrancando da tomada. Eu me remexia ao som de Leona Lewis que saia do estéreo portátil. Meus cabelos eram chicoteados pelo ar quente que, de vez ou outra, me causava arrepios.


Enquanto isso, ouvi passos firmes que vinham do corredor principal, vagarosos e despreocupados. A luz do banheiro feminino cortava a escuridão batendo contra a parede vinho florida, e minha sombra se projetava no chão. Diminuiu os passos. O dedo enfeitado por um grande anel rubro deslizou pelas paredes lisas até encontrar o batente envernizado da porta:


— Pensei que estivesse um pouco cedo pra estar acordada — Disse animada e risonha, achando que se tratava de Freya. Continuei: — Pode me passar a escova?


Os olhos azuis encaravam minha figura curiosa. Vestida de um pijama colorido quadriculado, devia agradecer Freya e o seu ótimo gosto para roupas. Os cabelos desgrenhados sobre o rosto impediam minha visão. Que tipo de garota deixa a porta do banheiro aberta enquanto seca os cabelos? Eu, eu sou esse tipo de garota. Não pensei que devesse me preocupar no completo silêncio e calmaria em que tudo se encontrava. Os lábios rosados e opacos do estranho se curvaram num sorriso involuntário de sarcástico.


— Eu agradeceria se fizesse isso um pouco mais rápido — Insisti.


Ele seguiu para a pia onde eu tateava a mármore em busca do objeto. As mãos frias entraram em contado com as minhas mornas e suadas, o choque foi imediato. Pendi os cabelos para trás. Meus ossos congelaram até a morte quando me deparo com o rosto pálido e enigmático, em um meio sorriso avaliador:


— Obrigada — Agradeci.


—Não, eu é que agradeço. Não devia tê-la tratado como tratei hoje. Além do mais, eu não quero que se sinta na obrigação de me ajudar somente por se parecer com Jaqueline.


— Eu fiz isso por mim — Okay, na verdade não. Mas acho que ele não precisava saber disso, saber da minha obsessão repentina.


Ele se aproximou fechando a porta atrás de si, meu sangue já não bombeava mais com a mesma intensidade, seus olhos pareciam me enfeitiçar enquanto me encurralava contra a pia, levantando meu queixo para fitá-lo:


— Eu preciso de sangue — Sussurrou ao meu ouvido.


Eu preciso dizer que não tinha mais controle da minha consciência? Ou do que eu fazia ou faria por ele caso simplesmente pedisse? Inconscientemente curvei o meu pescoço, e mesmo que meu corpo implorasse para que eu saísse ás pressas, eu permaneci. Minhas mãos suadas e minha respiração levemente acelerada, tudo era um aviso.


Pude senti-lo enterrar suas presas contra a minha pele, uma dor aguda e sufocante que espalhava vibrações por cada músculo. Me agarrei ao tecido de sua camisa e arfei quando fui erguida e posta sobre a bancada da pia, de modo possessivo afagava meus cabelos enquanto se alimentava ferozmente. Pensei em tudo o que ele disse mais cedo, sobre o que sentia quando tomava o meu sangue, e sobre os prováveis pensamentos terríveis e sujos que se formavam em sua mente. Mas o que importava? Eu queria aquilo, não é mesmo? Queria pensar que eu seria única que ele não machucaria em seus piores momentos, a única que tinha algum poder sobre ele, algo perigoso, já que naquele momento era exatamente o que ele estava fazendo, me machucando, se alimentando de mim como se fosse um deposito de sangue humano. Mas eu não conseguia parar.


Envolvi sua cintura com as pernas enquanto o resto do meu corpo estava totalmente imobilizado. Sua pele antes fria e lisa se tornava cada vez mais quente, ele se movia em mim num perfeito movimento de sucção. Tudo agia de modo tão natural, nem as drogas mais fortes me davam aquela sensação inebriante. Toquei seus ombros e ele nos separou violentamente, se encostando a parede como um animal assustado:


—Porque parou, já está satisfeito?


Ele franziu o cenho como se concentrasse em alguma coisa, e levando as mãos à cabeça massageou as têmporas como se doessem.


— Eu não ia conseguir parar — Revelou como se finalmente acordasse de um transe hipnótico.


—Não me machucou, eu não senti — Tentei convencê-lo, mas as coisas pareciam piorar. Ele olhou para o meu pescoço, então instintivamente levei as mãos ao lugar ferido. Me voltei para o espelho. Eu estava sangrando feito um porco. A mordida dilacerou meu pescoço e uma tontura chegou a minha cabeça, desci da pia e cambaleei sentindo tudo girar a minha volta. Rapidamente Kian me amparou, e como na primeira vez que nos encontramos ele me ofereceu o seu sangue: — O que está fazendo, Kian?


—Impedindo que morra de hemorragia — Eu aceitei o seu pulso contrariada. A culpa estampou os seus olhos de forma tão perceptiva. Luke disse a verdade, eu não ia mudar nada, mas não era ele quem precisava de mudanças. Como se cura alguém que não quer ser curado? Eu precisava de ajuda, não conseguia negar nada a ele, e dessa maneira ele iria me matar: — Eu não queria que isso acontecesse.


— Não foi o suficiente? — Me sentei ao chão fitando o seu rosto confuso.


—Não, Não foi.


—O que você precisa Kian?— Quis saber, vendo que todos os meus esforços não faziam a mínima diferença: — Um animal talvez?


— Não. Algo maior como... Um vampiro.




A Desolação Do VampiroOnde histórias criam vida. Descubra agora