11-me visto de menino para invadir um estúdio de balé

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Acordo vendo uma coisa estranha.

Lúcia está sentada de pernas cruzadas em uma grama espessa e clara, e Ian está ao lado estirado no chão, apagado.

Eu poderia dizer muitas coisas, mas o que digo com os olhos semicerrados é:

-Lúcia... o quê...?

Nessa hora, Ian arregala os olhos e se vira para o lado, cuspindo água. Muita água. Me vem o pensamento de como caberia tanta água em pulmões normais.

Ele se deita de novo, o peito subindo e descendo, e Lúcia me fala o que aconteceu.

-acordei aqui, do lado de um lago, que acho que é ligado ao mar, eu acordei primeiro, e vi que o Ian estava com muita água nos pulmões. Você eu sabia que acordaria logo, aí dei um jeito de fazer ele respirar. Como pode ver, funcionou um pouquinho depois, mas acho que ele está bem.-fala olhando pra um Ian arfante e meio tonto.

Tento não imaginar Lúcia fazendo boca-a-boca em Ian. Isso seria estranho. Prefiro imaginá-la fazendo aquela pressão nos pulmões que eu não sei o nome.

-hm. Você tá bem?-pergunto a ele.

-mais ou menos. Parece que um elefante sentou em cima do meu peito e depois me enfiou água salgada goela abaixo.

-ah, então você está bem.

Vejo que aconteceu com eles o que aconteceu comigo, só a diferença é que eles não respiram na água. Agradeço mentalmente ao mar por nos ter trazido à terra.

Percebo que devo ter ficado um bom tempo deamaiada, porque minhas roupas estão encharcadas (eu não me concentrei em ficar seca) mas meu cabelo já secou. A água salgada não parece tê-lo deixado ressecado ou duro. Não que eu costume me importar com o cabelo.

-bom. Onde viemos parar?

Olho para os lados. Estamos em um lago que fica perto de uma cidade não tão pequena, com prédios e tal, e até ciclovias. Uma estrada estreita segue até uma placa que eu não consigo ler direito. Parece...

-Vem vindo a notvillo?

-o quê-pergunta Lúcia.

-a cidade.

Ela força os olhos para ver a placa e solta uma risadinha.

-acho que é Bem-vindo a Netville.

-mesma.coisa.

Ela dá de ombros.

-levante Ian!-diz depois dando um susto no dito cujo.

-eu estou vivo, obrigada por perguntarem. -diz se sentando.

-a gente já perguntou. Mas então, estamos encharcados.

-ta quente, vamos secar logo.-responde Lúcia.-mas eu estou com fome.

Sinto minha barriga roncar. Mas não achei que ela fosse ouvir.

-pelo visto, você também.

-eu tenho umas coisas aqui. Foi bem conveniente essa mochila ser impermeável. -pego um pacote de biscoitos e três latas de Pepsi.

Mas quando me curvo para fechar a mochila, o corte nas minhas costas dói um pouco, e eu respiro fundo. Esperei que doesse mais.

-o que foi?-pergunta Ian.

-nada, um machucado daquelas lanças dos índios.
Me viro e encosto, esperando que doa, maz o que sinto é uma cicatriz. Primeiro me surpreendo, depois me ligo, e imagino que a água tenha me curado. Talvez um pouco de ambrosia melhore.

O Semideus Perdido (Livro 2)Onde histórias criam vida. Descubra agora