Inícios #03 - Primeiros capitulos

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Para escrever um bom primeiro capítulo, você tem que, antes de tudo, pensar no porquê de eles serem tão importantes (principalmente, se não houver um prólogo). Pra que eles servem? Para capturar a atenção do seu leitor e os fazer continuar lendo. Um primeiro capítulo chato é um tiro no pé e uma provável sentença de morte e esquecimento para seu livro. E isso, obviamente, é algo que você não quer.

Falando de um modo mais prático, o propósito do primeiro cap é bem simples, e pode ser dividido com igual facilidade. Primeiros capítulos servem para:

Apresentar seus personagens principais;Apresentar um pouco da rotina/vida deles;Dar os indícios do "conflito" que (provavelmente) mudará suas vidas.

E o que é que esse "conflito"? É justamente aquilo que faz sua história existir. PeguemosCidade dos Ossos, por exemplo. O conflito de Clary é a entrada dos Caçadores de Sombra em sua vida e o sequestro da sua mãe. Mesmo que esses fatos não ocorram todos no cap 1, temos uma "prévia" deles, algo que nos mantem com o livro aberto. Se esse conflito (pode ser chamado de mudança também) não existisse, não haveria porque contar a história de Clary, uma menina normal do Brooklyn criada por uma mãe solteira.

Então, ao planejar seu primeiro capítulo, pense nesses três pontos. Obviamente você não precisa sair fazendo uma biografia do seu personagem (muito pelo contrário), mas deve deixar algo dele logo nas primeiras páginas. A rotina também é bastante importante, principalmente se o conflito for algo mais "dramático". O livro que estou escrevendo, por exemplo, em sua terceira (e mais séria até então) versão, tinha um monte de coisa acontecendo no primeiro cap. O melhor amigo da protagonista seria sequestrado nele e ela partiria em sua busca nos caps seguintes, mas eu só tinha dado aos dois umas três páginas juntos. Como o leitor conseguiria se identificar com a minha protagonista se mal compreendia seus sentimentos pelo tal melhor amigo sequestrado? Como, se mal os tinha vistos juntos e só sabia o que tinham passado pelo que ela falava ou pensava?

Simples: não poderia. É aquela velha história doshow, don't tell. Para fazer o conflito mais intenso, você deve mostrar como era a vida do seu protagonista antes, para dar um contraste. E, ao mostrar essa normalidade, dar os "indícios" de que algo vai mudar. Por exemplo, digamos que sua história envolva um segredo de família, um que sua protagonista não sabe. Mostre-a fazendo o que faz usualmente, indo à escola, falando com os amigos, etc, mas escreva ela notando seus pais conversando de modo estranho antes de ela entrar na sala, ou sua mãe guardando rapidamente um pedaço de papel velho na gaveta ao vê-la. Mesmo que esse conflito só apareça depois, é importante ir deixando pistas.

Mas há um perigo nisso também: o de se prolongar demais no cotidiano, no período em que nada especial acontece e você está só apresentando os personagens, os lugares e as demais coisas. Demorar muito aqui é fatal.Ninguém quer saber a vida comum do seu personagem. Querem, no máximo, um contraste entre ela e a vida após o conflito/mudança, e só. Demore demais e você perde o leitor, demore de menos e ele não vai conseguir se conectar aos seus personagens. Praticamente uma armadilha.

É claro que há métodos que fogem dessas "regras", como o In Media Res, ou simplesmente o de começar no meio e não no início. Mas mesmo usando essa técnica, é preciso sim mostrar o "antes"; por meio de flashbacks, por exemplo. A segunda série do Mundo Emerso, Guerras do Mundo Emerso, tem como personagem principal a Dubhe. As coisas mudam já no primeiro capítulo e praticamente não há In Media Res, mas a autora usou capítulos adicionais para mostrar seu passado e sua relação com personagens citados ao longo da trama. Foi uma jogada inteligente, e que balanceou muito bem o livro.

Outra coisa sobre primeiros capítulos é, obviamente, a primeira linha. Sua primeira linha (ou pelo menos primeiro parágrafo) tem que ser um anzol para seu leitor, algo que o faça parar e dizer, opa, isso parece ser interessante. Existem centenas de milhares de livros por aí. Você tem quer ser rápido ao capturar o leitor antes que ele vá nadando até o livro mais próximo.

Para ser sincera, não importa se você começa com ação ou não. O que importa é o modo como essa ação ou não-ação é mostrada para o leitor e como seus personagens são inseridos. Se tem um dragão mecânico perseguindo seu protagonista pelo primeiro capítulo inteiro, por que eu deveria me importar? Eu não conheço seu protagonista, e a ideia de gastar sabe-se lá quanto do meu tempo lendo páginas de uma perseguição que não me afeta em nada não é lá muito atrativo (mas isso pode mudar se algo sobre seu personagem ou a situação em geral for mostrado também).

Por outro lado, talvez eu não esteja com muita vontade de ouvir uma explicação extensa sobre seu mundo logo na primeira página. Mais uma vez, por que eu deveria me importar?

A chave é fazer seu leitor ficar curioso sobre o que vai acontecer ou já aconteceu. Se você conseguir fazer isso, há 99% de chance de lerem seu livro até o final.

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