Era noite de natal. E vovó Margaret estava me enlouquecendo com todos os preparativos para a ceia. Ela corria de um lado para o outro igual uma barata tonta procurando pela cozinha da pousada uma travessa maior que coubesse seu frango recheado. Junto a ela estava sua amiga Anastácia, que não sabia se desformava o pudim ou se ajudava a pobre senhorinha desorientada.
Desisti de vovó quando ela começou a surtar sobre o esquecimento do molho de alcaparra e fui direto para o Hall da recepção afim de terminar minha decoração para a festa.
Os hóspedes que ainda tínhamos foram convidados a participar da confraternização se assim desejassem. Apenas alguns poucos confirmaram presença. Os restantes foram para outros destinos fechando a estadia na pousada para passar a data comemorativa com suas famílias.
Enquanto a cacofonia se instalava na cozinha e os outros ainda não haviam chegado, eu estava tranquila e sorridente no Hall, na ponta do pé para alcançar o galho mais alto da árvore montada no centro do salão.
Eu já estava vestindo meu vestido de camurça coral furta cor que descia justinho no corpo até um pouco acima do joelho. Meu cabelo preso só na lateral se derramava pelo ombro com grandes cachos soltos acompanhando a franja loira repicada. Usava meus brincos de prata e a pulseira que ganhara de papai de aniversário há muito tempo atrás.Em fim, depositei a brilhante estrela dourada no topo da árvore. Dei dois passos para trás e contemplei orgulhosa o trabalho que havia feito. A pousada tinha ficado linda.
Uma música tocava suave e abafada vinda da área de lazer onde a mesa para a ceia estava montada. As grandes portas de vidro atrás do balcão davam entrada a ela, enquanto a vista para o belo jardim bem cuidado de vovó Margaret sendo banhada pela luz do entardecer enchia os olhos em deslumbramento. Velas flutuantes tremeluziam calmamente boiando sobre a piscina próxima a mesa, deixando o ambiente convidativo, aconchegante e romântico. As luzes dos postes de jardim estavam acesas. Seu metal de cobre brilhava alaranjado ao refletir os últimos filetes do sol. Sobre a grande mesa de madeira branca polida, a porcelana fina de vovó estava servida. Taças e talhares envoltos em guardanapos de cor vermelho sangue combinavam bem com o pequeno vaso de flores disposto no centro. Deixei nascer um sorriso satisfeito em meu lábio enquanto observava cada detalhe com muito orgulho e fascinação.
Tudo estava perfeito. Do jeitinho como eu sempre imaginei. Meu coração se encheu de alegria e paz. Mas, logo outro pensamento atravessou minha mente. O inoportuno pensamento de sempre. "Queria que mamãe estivesse aqui pra ver. Que meu pai estivesse aqui pra...", interrompi o pensamento quando aquele buraco me sugou para dentro dele novamente. Queria que minha família estivesse toda reunida outra vez.
Penso como seria se nenhuma tragédia tivesse acontecido em nossas vidas. Onde meu pai jamais teria se transformado em um homem triste e amargurado, perdido pela morte prematura da esposa. Em como minha vida teria sido diferente. Talvez, se nada de ruim do passado tivesse acontecido, mamãe ainda estaria aqui, decorando essa árvore ao meu lado com vovó Margaret nos servindo biscoitos. Papai estaria conversando e dando altas gargalhadas com vovô Otávio na sala, Seu Marcos estaria feliz e vibrando com a chegada do primeiro netinho enquanto Débora devorava uma coxa de frango despreocupadamente ao lado de Dário, e... Felipe e eu... Bom. Eu não sei. Talvez tudo seria bem mais fácil para nós dois.Eu nunca iria saber.
Senti o coração afundar pouco a pouco no peito. Resolvi afastar esse sentimento o quanto antes e deixá-lo bem longe de mim pois, não queria me entristecer. Nem muito menos lamentar. Nem hoje nem nunca mais. Felipe me disse uma vez que precisava ter mais fé em mim mesma, que precisava vencer meus gigantes sozinha. Ninguém poderia fazê-los por mim. Essa tristeza que carreguei durante a vida toda precisava sair dos meus ombros. O bloqueio tinha que sumir. Eu precisava superar. E estava disposta a fazer isso. Mesmo que demorasse, mesmo que fosse tão difícil... Eu iria ser plenamente feliz de agora em diante. Estava decidido.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Um caipira em minha vida
Roman d'amourHelena Rocha é uma moça sonhadora e apaixonada. Tão apaixonada que decide ela mesma fazer o pedido de casamento a seu namorado, Richard White, um famoso milionário de NY, que a propósito, tem sérios problemas com compromisso. Essa história não poder...