VIII

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 VIII

Alexander Rutherford bateu à porta de uma relojoaria velha que conhecia há quinze anos.

Percebeu que ninguém atendeu, o que era raro, porém plausível atualmente. A cortina da vitrine estava fechada. Bateu mais uma vez, insistente.

E mais uma vez, nada.

— Chris, eu sei que você está aí, é o Rutherford! – gritou.

Em alguns segundos, um pedaço da cortina se moveu, e Rutherford viu um olho castanho mel. Logo em seguida ouviu barulho de chaves e a porta se abriu.

Christopher estava destruído demais para alguém que acabara de ser aclamado cientista do ano. Barbudo e grisalho, com uma camisa velha e surrada. O cabelo estava crescido e despenteado. Parecia dez anos mais velho do que realmente era.

— Bom dia, professor. Desculpe. Ontem ninguém me deixou em paz.

— Suponho. Posso entrar? É melhor manter trancado. – o professor tirou a cartola e entrou quando Chris abriu a porta e deixou-o entrar.

A velha loja cheirava a óleo de máquina, ferrugem e mofo. Era um cheiro interessante e metálico. Melancólico, porém. Havia relógios parados nas paredes e mostruários empoeirados. Coisas de altíssima qualidade, só que sujas.

Quando Chris fechou a porta, Rutherford lhe perguntou.

— Ainda trabalha com relógios? O meu precisa de uma limpeza, sabe. – ele olhou o homem.

— Claro. Posso vê-lo? – Chris estendeu a mão, e Rutherford lhe entregou o relógio de bolso prateado.

— Você não larga essa velharia mesmo, né? – Chris deu um sorriso cansado e repousou a peça numa mesa. – Pegue uma cadeira, mas está suja. Tudo está sujo.

— Isso inclui você. – o professor riu ao pegar uma cadeira empoeirada.

— Nem tanto. Eu preciso ir num barbeiro, mas acho que não consigo chegar lá em menos de meio dia. E fica ali na esquina. – Chris pegou sua caixa de ferramentas minúsculas.

— A fama parece agridoce.

— Não entendo suas metáforas, Alex.

— Você está destruído, e não é a aparência. Posso ver. Está tão mal quanto na época de Ristevski.

Chris suspirou.

— Só é estranho. Isso tudo. Não me acostumei. Falta lubrificação nas engrenagens, nada mais. Esse aqui tem quinze anos e nunca quebrou, nem acredito que foi o primeiro que vendi. – ele mudou de assunto.

Rutherford aceitou a mudança, mas ainda voltaria àquilo.

— Cuido muito bem dele. Ainda lembro o sorriso que você abriu quando aceitei comprá-lo. Isso não teve preço.

Chris sorriu e derramou óleo devagar no pequeno mecanismo, depois fechou, em silêncio.

— Suponho que queira ver meu autômato. – Chris entregou-lhe o relógio após fechar a tampa e acertar as horas.

— Não faço questão. Quanto foi a manutenção?

— Nada, Alex. Só de estar aqui já me paga. – ele elevou a voz nas palavras seguintes: – Luce, faça chá para nós.

Rutherford ergueu as sobrancelhas.

Luce? Finalmente conseguiu uma namorada? – disse à meia voz.

Chris riu daquilo.

— Não. Continuo tão solteiro e abandonado quanto você. Luce é o apelido que dei para o autômato.

O Orbe de Reidhas - Legend of Raython, spin-off #1Onde histórias criam vida. Descubra agora