XII

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XII

Um mês.

Fez exatamente um mês que Chris encontrou aquela esfera de cristal, e deu vida a seu filho, Luce.

E agora ele estava forte, mais vivo do que nunca. Fazia absolutamente tudo que um ser humano podia fazer, e tinha algumas coisas a mais.

Chris enumerou-as.

1.      Força. Luce podia erguer sua estante de ferramentas, com todas elas dentro, e com apenas um braço.

2.      Velocidade. Chris levou-o certo final de semana para correr num local longe demais da cidade, e ele fez cem metros em dois segundos.

3.      Raciocínio rápido. Luce podia realizar cálculos complicados, derivações e integrações, com milésimos de segundo, e precisão de infinitas casas decimais.

4.      Aprendizagem. O autômato absorvia todo tipo de informação e a usava sempre.

5.      Evolução. A cada dia, ele possuía uma funcionalidade nova. A última ainda assustava Chris.

— Está ficando mais fácil, pai. – Luce disse, mas não era Luce.

Chris odiava isso.

O autômato estava com sua pele, seus olhos de mel, seu cabelo. Os fios brancos, a voz, tudo era igual. Um disfarce perfeito. Mas Luce só podia desenvolver a pele de quem via.

— Que bom, filho. – Chris tirou o chapéu, acabara de chegar do barbeiro. Estava vinte anos mais novo, apesar de cansado. Sua criança lhe cansava.

— Quer que eu prepare alguma coisa? – Luce perguntou, e se desfez da pele de seu pai, voltando a ser o boneco de lata.

— Sim, por favor. – Chris se sentou em sua cama, e tirou o casaco, e todas as blusas. Seu cubículo era abafado demais, e se sentia sufocado. Mas o peito nu não tirou esta sensação de sufoco.

Chris sentia uma expectativa. Estava ansioso por algo que previu há algum tempo… a perda do controle.

Luce o obedecia prontamente, como um filho ao pai. Aliás, Luce era melhor que qualquer criança. Nunca reclamava, e sempre falava com voz alegre. Quando incorporava a pele de Chris, ele sorria sempre, e este achava estranha sua feição sorrir.

Não sorria há um mês.

Tentou de tudo para esquecer seus problemas, mas eles o perseguiam. Foi em bares, beber até esquecer o próprio nome, mas era reconhecido. Foi a bordéis gastar o dinheiro que recebeu da Academia com cortesãs, mas elas o olhavam diferente. Ficavam duas vezes mais animadas com o novo Christopher Fairmount, o cientista do ano, do que com o fracassado dono da relojoaria velha que as visitava às vezes.

Mais de uma vez Chris se perguntou quais pecados cometeu para pagar todos de uma vez só, assim.

Depois se lembrou de que não acreditava em forças divinas. Não mesmo? E aquela esfera que convenientemente caiu dos céus e deu vida a seu filho de metal? Seria o que? Sua ganância em se aproveitar daquele presente celestial resultou nisso?

Pegou-se pensando nisso de novo.

Essas malditas coisas não existem. O que existe sou eu e meus erros. Fim.

— Aqui está. – Luce trouxe ovos com bacon, o segundo café da manhã.

Chris agradeceu e se alimentou ali mesmo. Suas mesas não tinham espaço para refeições.

— Ah, pai! Posso fazer outra coisa agora. – Luce disse alegremente assim que Chris acabou de comer.

— E o que seria? – ele se levantou, queria tomar um belo banho. Não se lembrava dos verões em Rhenium Valley serem tão quentes.

O Orbe de Reidhas - Legend of Raython, spin-off #1Onde histórias criam vida. Descubra agora