Capítulo vinte, sobre verdades

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Ah, elas aparecem.

Cedo ou tarde, mesmo que você insista em escondê-las, elas saltam de seus poros e inundam seu mundo até que você decida se render.

E às vezes pode ser tarde.

Às vezes pode ser doloroso.


Exatamente como eu estava prestes a descobrir.


Dizem que um criminoso sempre volta ao local do crime, e humanos estúpidos também.

Adivinhe para onde eles estavam indo?


Exatamente.

Infelizmente o ferimento na perna do meu humano inútil e irritante não tinha sido tão grave como eu gostaria, o que significava que ele já estava andando outra vez.

Sem muletas.

E montando acampamento naquele mesmo lugar de semanas atrás.


- Você precisa enfrentar seus medos – o primo bonitão disse a ele, terminando de passar a armação por um dos lados da barraca. – Sabe, não é bom ficar traumatizado.


Ah, mas é claro que é.

É uma ótima idéia, uma idéia incrível, na verdade.

Alguns traumas não deveriam ser quebrados jamais, ser atacado por um urso muito menos.


Mas humanos são idiotas.

São ridículos e não pensam.

E só servem para causar problemas.


- Eu sei, vou buscar lenha mais tarde. – meu humano inconseqüente respondeu um tanto apreensivo, mas depois seus lábios carnudos se contraíram em um sorriso que sulcou as covinhas malditas em suas bochechas brancas. – Talvez eu encontre meu anjo lá outra vez.


Oh.


Oh.


Oh.


Não, não, não, humano.

Fique bem aí, não se mexa.

Não se atreva a dar um passo na direção daquela floresta, não senhor.


- Quando é que você vai desistir dessa idéia, Ian? – insistiu o primo, fazendo a primeira pergunta sensata do dia. – Você viu coisas. Você sabe que não existe.

- Existe sim e eu vi. – seus olhos azuis de repente ficaram sem foco, como se ele estivesse perdido em uma lembrança distante. Eu sabia que estava. – E não foi só lá. Foi no hospital, e na piscina e...

- E?

- Deixa pra lá. O que importa é que ela vai me proteger. Sempre me protegeu.


Oh, não.

Não, não, não, não.

Não.


Humanos devem perder o resto de juízo que lhes resta quando passam por experiências de quase morte.

Ou talvez esse fosse só o caso do meu humano.

Era difícil saber.

E eu não ia ter tempo de descobrir.


Porque embora estivesse completamente fora de si naquele momento, ele tinha razão em uma coisa:

Eu tinha o protegido.


Mas não conseguiria protegê-lo outra vez.


O homem que me chamava de anjo [FINALIZADA]Onde histórias criam vida. Descubra agora