Capítulo vinte e três, sobre castigos - outra vez

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Eu estava recebendo o meu.

Em dose dupla.


Lembram o que eu disse sobre a segunda forma de ser mortalizado?

Exatamente.


Eu tinha vencido a morte, por mais estúpida que Jason fosse.

E no instante em que o corpo inerte dele bateu no chão e desapareceu, meus sentidos começaram a me trair.

Senti algo flutuar em minha mente, como se se desprendesse dali.

Mas eu não podia me perder, não ainda.


Forcei meus pés a caminhar pelo mar de folhas secas no chão, porque já não podia fazê-lo de outra forma.

E então caí.

Caí ao lado dele.


Um buraco escuro manchava sua camisa de vermelho e, daquela vez, eu pude tocá-lo.

Era a única forma de senti-lo, pelo menos uma vez antes que tudo deixasse de fazer sentido.

Porque era o que ia acontecer.


Mas aquilo não importava.


Eu estava com ele.

Meu humano irritante das letras faltando era finalmente meu e estava em meus braços.

Como eu tanto queria.


Seus olhos azuis ainda se abriram mais uma vez, parecendo perdidos e felizes ao mesmo tempo.

Sua mão grande se levantou, tocando meu rosto.


- Anjo...


Tentei sorrir, mas algo quente escorreu dos meus olhos ao invés disso. Algo salgado que tocou meus lábios, e fez o humano limpar minhas bochechas com um toque trêmulo.

Eu peguei sua mão, sentindo o calor que saia dali.

E então, como uma força que estava guardada em meu peito todo esse tempo, eu simplesmente sussurrei.

- Ian.


As covinhas se formaram uma última vez quando ele sorriu.

Seus lábios brancos também se abriram uma última vez quando ele falou.


- Você veio...


Fiz que sim e mais líquido quente escorreu dos meus olhos.

Quanto tempo mais ele ia aguentar?

Quanto tempo mais eu ia aguentar?


Levantei sua cabeça em meus braços e aproximei seu rosto do meu, até que nossos lábios se tocaram.

O beijo proibido o pegou de surpresa, e meu humano tentou reagir.

Mas ele já não conseguia.


Quando o soltei, tudo o que restava em minhas mãos era um corpo.

Um casulo vazio.

Alguém já tinha desatado o nó, talvez até o próprio Gregory.


Ele não estava mais lá, iria para o meu mundo.

E eu ficaria no dele.

Sozinha.


Sozinhos.


Uma eternidade por um beijo.

Pode parecer uma escolha errada, e talvez seja.


Mas naquele momento era tudo que eu precisava.


O homem que me chamava de anjo [FINALIZADA]Onde histórias criam vida. Descubra agora