Óleo de Prímula

Capítulo 21

Andrezza sobe as escadas lentamente e tem medo de cair estatelada no asfalto, pois a revelação de Antony ainda é muito perturbadora. Sei que ele está me olhando, mas não posso me virar para uma despedida. Senão tenho certeza que correrei de volta para o carro e direi que nada mais importa. Apenas a vida que temos pela frente e a certeza de que faremos de tudo para que possamos encontrar o nosso eixo. Mas não posso. Não posso.

Ela percebe que a porta principal está entreaberta e, do outro lado, Alexandre está parado feito um dois de paus.

- O que você está fazendo aqui? Quer me matar de susto????

- Eu estava tentando ouvir sua conversa, mas vocês estavam sussurrando.

- Alexandre...que vergonha, meu filho.

- Olha, eu reconheço que foi errado, mas o fato é que você precisa me ouvir, Andrezza. Você precisa acordar, menina. Que habilidade é essa que você desenvolveu de se boicotar tanto? Você é assim desde a faculdade. Sempre arrumando um jeito de tornar as coisas mais complexas, de se martirizar com o seu destino. Eu sei que não fui um homem legal na sua vida. E gostaria muito de ser um bom amigo. Como amigo tenho que te falar que você está com 40 anos. E nessa idade que as mulheres começam a apodrecer...

- ALEXANDRE !!!

- ... você está, surpreendentemente, ficando ainda mais bonita. Você é a nova mulher de 40 anos, minha querida. Tem o mundo na palma da mão. Tem o poder de controlar sua vida e é o pilar de sustentação da nossa família. A guerreira que sai para caçar é você...eu sou o cozinheiro da nossa caverna imaginária. Eu te admiro como mulher. Te admiro como profissional e mais ainda como mãe.

Ele me dá um beijo na mão e retoma:

- E o que essa mulher poderosa está fazendo com ela mesma? Você teve um problema com o cara e claro que não foi legal. Tulio viu que ele te empurrou. Mas você transformou esse coitado numa mosquinha desse tamanho depois disso. E está com medo de voltar a viver de verdade. Eu posso saber por que?

- É tão difícil, Alexandre. Fica aquela sensação de que eu não tenho idade mais para isso. Apesar de ser muito nova ainda...ao contrário do que você pensa! Mas falando sério, agora. Me diga, sinceramente: você não tem medo de não conseguir se reinventar? Eu acho que não tenho mais tempo para me perder de mim mesma.

- Minha querida, quando eu te conheci eu tive certeza que não haveria mais nada na vida que fosse importante. Acho que o sentimento foi tão forte que eu mesmo fiz um trabalho inconsciente de te afastar de mim. O que temos hoje talvez seja mais duradouro do que aquela paixão avassaladora. Mas olhando você e o franguinho eu percebo que poderia ter feito tudo completamente diferente. E muito melhor.

- Ahh, Alexandre...para você as coisas são mais fáceis.

- Besteira! É que você tem essa lógica dualista que não a abandona. Preto e branco. Bem e mal. Ganhar ou perder. É uma lógica responsável por grande parte das aflições que te consumiram pela vida.

- Mas é que você estava sempre de férias, não é? Alguém tinha que ter um fio de preocupação para conseguir administrar a nossa vida...

- Ahhh, Andrezza. Você me transformou numa muleta. Olhava para o nosso relacionamento de um jeito superior, matando-o por dentro, mas deixando que ele vivesse por fora. Você queria uma atitude minha? Eu estava feliz, minha cara! Naquele egoísmo da juventude, EU estava feliz. Mas você, não. Sofria. Perecia. E não "arredava" o pé dali.

- Ouvir você falar assim parece que a culpa era só minha.

- Voltou ao dualismo...neste momento estamos analisando só você, ok? Podemos tirar um dia inteiro para falar dos meus defeitos.