Um passeio ao inferno

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No dia seguinte às intempéries, a vida estava um pouco mais complacente

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No dia seguinte às intempéries, a vida estava um pouco mais complacente. Acordei com um sorriso lindo e uma caneca de café. Existe coisa melhor do que isso?

— Bom dia, dorminhoco! — Leon sorriu.

— Bom dia! — esfreguei minhas pálpebras e sorri.

Sentei na cama e segurei a caneca de café nas mãos. Ele me beijou e deitou ao meu lado. Coloquei minha perna sobre ele e ficamos conversando sobre soluções para nosso dia.

— E aí, o que iremos fazer hoje? — disse ele.

— Ainda não sei. Temos aula mais tarde, né ?! A vida sempre precisa voltar aos eixos.

— Verdade! Quer sair agora cedo ou vai ficar em casa até a hora da aula? — perguntou ele.

— Hm... Vamos pensar nisso! Cinema? — sorri inocentemente.

— Tá beleza! Adorei! Iremos ao cinema então. Descontrair, de vez em quando, é sempre bom.

— Claro!

Levantamos da cama, tomamos um banho, vestimos roupas bem leves e saímos para um dia tranquilo e harmonioso. O dia estava florido, o céu límpido, de um azul quase idílico, com jasmins e girassóis iluminando as ruas de um paraíso bucólico. Sonho de um dia primaveril, borboletas e beija-flores enfeitavam o ar com suas danças silenciosas e modestas, trazendo paz ao nosso artístico e gracioso recanto.

O cinema estava vazio, comum para uma segunda feira à tarde. Fomos à bilheteria, compramos os ingressos, as pipocas e os refrigerantes. Entramos na sala e sentamos nas duas poltronas da última fileira. Leon jogou uma pipoca em meus cabelos.

— Só para estrear minha pipoca. — ele riu.

— Idiota! — peguei uma pipoca e joguei nele. — Para você ficar mais doce. — ri e virei para frente.

Ele beijou meu rosto e passou o braço em volta da minha nuca.

— Eu já sou um cara doce. Sei que você ama meu jeitão de ser. — ele piscou.

— Você é meu ogro fofo favorito! — sorri.

— Eu sei disso!

Ele virou para o telão. Assistimos ao filme com risadas e comentários sobre os acontecimentos. Ele me beijou e, logo em seguida, deitei a cabeça no peitoral dele. O filme era sobre uma família que foi passar férias no campo e várias coisas surpreendentes e hilariantes ocorriam no decorrer da narrativa. Quando a sessão terminou, saímos do cinema e fomos para casa.

Olhei para o relógio e as horas passavam muito rápido. O tempo, inimigo dos desavisados e dos que morrem de amor. Ah! As horas... Sempre foram responsáveis por acontecimentos ruins e maravilhosos na história do planeta; as guerras mundiais, o surgimento da escrita e do fogo, o lançamento das bombas no Japão, a industrialização e, porque não, a criação do mundo. Um segundo pode destruir nações, matar pessoas, construir invenções revolucionárias; sim, ele é muito poderoso, mas cuidado, o tempo pode ser cruel e implacável com aqueles que subestimam sua ira e debocham de sua incomparável fonte de poder.

Entramos em meu quarto e tomamos um banho. Essa noite será um possível pretexto para a vida voltar ao normal. Nos arrumamos e guardamos nossas coisas. Entramos no carro de Leon e fomos para faculdade. O ambiente estudantil estava em luto, um silêncio imperioso reinava supremo nos corredores e nas salas de aula. Uma nuvem de escuridão pairou em nossas vidas e tornou tudo um suplício eterno. As pessoas apáticas, tristes e com medo, não falavam uma palavra, não expressavam um gesto.

Lise não estava na aula, Gabriel sentou ao fundo da sala com um olhar pesado e bravo, Thor permanecia indiferente como sempre e os outros continuavam atormentados e pávidos com os monstros que habitavam nas profundezas de nossas almas. A morte de alguém traz mudanças inauditas em uma cidade pacata, principalmente quando é a ida de um ente querido.

Me despedi de Leon e sentei em uma carteira qualquer. A professora estava explicando o conteúdo mais importante do semestre, porém ninguém conseguia fixar as atenções nela. A tristeza revelou o lado mais atormentado de cada indivíduo presente em North East, a bondade havia sido extinta desse refúgio paradisíaco e as pessoas ficaram combalidas pela espera de dias mais tranquilos.

Em um certo momento da aula, barulhos estranhos e muito altos começaram a soar no outro lado do prédio. Os gritos ensurdecedores ressaltaram a prévia do que estava por vir e o pânico foi geral.

— Tiros!!! — uma menina gritou.

— Abaixem-se! — a professora exclamou.

Os ecos de pavor eram estrondosos, a maldade travava uma batalha indelicada com a vida. Infelizmente, a maldade venceu! Os passos de pessoas correndo eram estrépitos, um alarme soou na escola e o silêncio assenhorou-se do ambiente. Nenhum som, nenhuma luz, nenhuma esperança! Ouvimos o barulho de metal e um chute muito forte derrubou a porta.

Um homem entrou na sala com uma metralhadora terrificante e um olhar demoníaco. Ele estava com vestes pretas e uma máscara de esqui, que só expunham seus olhos castanhos e sanguinolentos. O indivíduo, com um porte ímpio e atroz, apontou a arma e começou a atirar em todos no recinto. Fechei os olhos e comecei a pensar em minha família, meus amigos e minha vida.

— Não quero morrer agora! Está fora de cogitação! — pensei apavorado.

Eu estava encolhido em um canto da sala, com todos os questionamentos fervilhando em minha mente. Os céus clamavam por piedade e o Deus da Morte por compaixão. Olhei para frente, quando o homem chegou perto de mim, sorriu e apontou a arma em minha cabeça.

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