A escolha do coração

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Alexandra tomou seu café pensativa. A noite quando Zenon invadiu a tenda para lhe roubar beijos,  ela sentiu um arrepio, a emoção de ser alvo da paixão de alguém. Era humana, e mesmo que sua experiencia se resumisse ao Zenon, ela não podia negar o encantamento que toda a situação causava. Ele era terno e doce, carinhoso apesar de tímido, e seu toque incendiava Alexandra. Ele mostrou o desejo sim, a paixão. Eles certamente não seriam infelizes juntos, Alexandra agora conseguia ver Zenon como sua mãe e outras mulheres do clã o viam, um homem forte, confiável e protetor. Em contrapartida, havia John, sim, a ternura que brotava nela cada vez que o via, cada vez que ele mostrava um pedacinho de sua alma a ela. Sem sequer um único toque, ele revirava suas emoções de ponta a cabeça, ele a irritava, e ao mesmo tempo a divertia, sentia que ele tinha tanto a dizer, e cada dia queria descobrir um pouco mais. Como patrão ele era rude e exigente, porém justo e sempre muito preocupado com o bem estar tanto de seus funcionários, como de seus animais. Como amigo, era bom ouvinte, atencioso. Mas era o olha dele, mais que qualquer outra coisa que derretia seu coração, aquele azul profundo e intenso, que ela sempre pegava olhando-a de forma doce e especulativa, com alegria e as vezes exasperação, aquele olhar, que parecia a beira de um precipício quando ela recuperou a consciência após a queda. Ela simplesmente não conseguia evitar, estava perdidamente apaixonada por ela, mesmo sabendo que nunca poderia viver este amor, mesmo lutando contra ele, ela o amava, e isso ela já não era capaz de negar a si mesma. Assim, ela se contentava com o mero prazer de observa-lo, de ser sua amiga.
- Tem certeza que está bem para trabalhar? - Zenon perguntava enquanto caminhavam até a fazenda Mackenzie.
- Estou ótima Zenon, não se preocupe, nem dor estou sentindo. - ela mentiu. Sua cabeça doía como o inferno, e seu corpo parecia ter sido atropelado por uma manada.
- Você está muito quieta. - ele a obsevava, a princípio preocupado pela queda, agora se perguntando se ela estava chateada com ele. - Você não gostou que eu fosse em sua tenda a noite?
Ela o encarou confusa por ser arrancada de seus pensamentos tão distantes
- Sei que passei dos limites ontem, e que se alguém nos pegasse estaríamos metidos em problemas, mas simplesmente não conseguia dormir pensando em você. - ele a encarou, apesar de toda sua timidez.
Alexandra parou, e olhando para ele pegou em sua mão.
- Zenon, eu não sou tão impressionável, nem tão covarde. To cansada dessas regras, vamos nos casar e mal nos conhecemos, eu sequer sei qual a sua comida preferida. - ela soltou as mãos dele e bufou em frustração, e ao mesmo tempo rindo da situação ridicula, virou e continuou a caminhada.
- Doce . - eles pararam mais uma vez se olhando. - Qualquer tipo de doce. - ele agora dava aquele sorriso tímido, por estar revelando um pouco mais dele mesmo. - As vezes, quando não temos nada doce em casa, eu como um torrão de açúcar.
Ela o encarou abismada e ao mesmo tempo encantada com tal revelação
- Bem, posso esquecer de qualquer mantimento, exceto o açúcar.
Com essa declaração eles começaram a rir, na verdade gargalhar até a entrada da fazenda.
Zenon começava a se afastar quando Alexandra o chamou
- Eu gostei. - ela declarou - Do beijo, de você ter ido me ver a noite.
Com isso ela saiu correndo entrando na fazenda com suas bochechas incendiando de vergonha, deixando para trás um Zenon com um largo e bobo sorriso na cara.
Assim que entrou nos estábulos, teve que encarar um belo sermão de Finn por não ter ficado em casa descansando.
- Minha cabeça é mais dura do que você pensa Finn. - ela respondeu sorridente e de bom humor.
A verdade é que apesar de ser um escocês ruivo enorme e rabugento, Finn era muito atencioso, e tão preocupado quanto John com o bem estar de todos.
- Moça, você precisa se cuidar. - ele disse carrancudo, e em seguida a designou para tarefas mais leves.
Ao longo do dia não teve o menor sinal de John, queria perguntar a Finn onde ele estava, mas não queria ser intrometida, afinal ele poderia estar apenas cuidando de algum assunto fora da fazenda, assim continuou com seu trabalho. Ao final do seu expediente, deparou- se com George na entrada dos estabulos. Ela lançou um olhar fuzilante a ele, fazendo o menino estremecer, e olhar para o chão. Alexandra pretendia passar direto ignorando-o, mas ele tocou seu ombro.
- Por favor, me perdoa. - ele murmurou.
Alexandra se virou e o encarou duramente.
- Imagino que sua intenção não era quase me matar.
Ao dizer isso, o menino imediatamente começou a chorar, se dando conta mais uma vez da gravidade de sua ação
- Me perdoa moça, eu juro que não imaginava que você se machucaria tão seriamente.
Compadecida e apaziguada, Alexandra tocou o no ombro e sentaram-se num banco.
Ali George lhe contou como estava enciumado por Alexandra estar se saindo tão bem, que os outros garotos da fazenda o estavam atormentando por ele ter perdido o posto para uma mulher, e fazendo várias piadas sobre ela ser melhor que ele em cima de uma cela, então ele queria mostrar que ela não era tão perfeita, mas não imaginava que a queda seria.
Conversaram bastante tempo, e Alexandra se dispôs a ajuda-lo a superar o medo que ele tinha de Pegasus, pois no geral, ele tinha jeito no trato de animais, mas o fato de Pegasus ser tão selvagem o amedrontava.
- Isso fica apenas entre nós dois George.
- Obrigada moça. E mais uma vez perdão.
- Esqueça isso George. Hoje estou muito cansada, e devo admitir bem dolorida, então amanhã começamos.
- Eu posso acompanha-la moça.- ele se prontificou preocupado com o gemido que ela deu ao levantar.
- Eu estou bem George.
Ela seguiu, e quando estava chegando ao portão, ouviu uma buzina. Seu coração deu um salto no mesmo instante, porém ao se virar, viu que era apenas Finn
- Vamos moça, eu te levo hoje.
Ela entrou no carro, e um silêncio constrangedor surgiu. Finn não era do tipo falante e Alexandra não sabia quebrar o gelo. Mas em meio a tossidas, coçadas de cabelo e batidinhas nas pernas, Finn resolveu que ele precisava começar.
- Sabe moça, eu ainda não entendi como você caiu.
- Bem a cela soltou e não tive tempo de parar antes do obstáculo. Pegasus pulou e eu cai.
- Essa parte já estava clara pra mim desde ontem. O que não entendo é como a cela abriu. - ele disse isso, e a ficou encarando com seus olhos negros e inquisitivos.
- Acho que não certifiquei corretamente se a cela estava presa. - ela disse olhando pra fora do veículo, nunca fora boa mentirosa.
- É mesmo? - ele continuava encarando ela, deixando-a extremamente desconfortável - Uma tremenda falta de atenção. Acho que terei de rever seus avanços. Não é tão confiável e competente quanto eu pensei.- ele seguia alternando seu olhar entre a estrada e ela.
Alexandra suspirou e calou a dor que sentiu diante de tal comentário, sabia que a culpa não era sua, mas não podia correr o risco de levantar a ira de Finn contra George. O garoto foi um tolo é verdade, mas não era mau.
- Entendo senhor, aceito sua decisão e disciplina. - um nó se formou em sua garganta
Ele continuou olhando-a, e então abriu um meio sorriso.
- Você mente mal menina.
Alexandra o encarou sem compreender
- Mente mal, mas é leal como um cão.
- Creio que isso seja um elogio. - disse ela secamente, ainda sem entender o propósito da conversa.
- Ouvi você conversando com George. Achei generoso de sua parte não apenas perdoa-lo, mas se dispor a ajudar o moleque. Mas admito que pensei que talvez se tratasse de um estratagema para se vingar dele.
Ela o olhou de cara feia pela sórdida desconfiança.
- Peço desculpas moça, mas fiquei preocupado pelo bem estar do menino. Ele pode ser um tolo, mas é filho da minha irmã. E antes de vir te dar carona, dei-lhe uns bons sopapos para ele aprender
A imagem de um menino tão grande como George apanhando era tão absuda que a fez rir. E neste momento Finn a acompanhou.
Ele a deixou na entrada do acampamento, ignorando os olhares curiosos dos membros do clã.
Alexandra queria saber de John, mas não tinha coragem de perguntar. Assim ela apenas suspirou e abriu a porta, mas antes que ela descesse, Finn tocou seu braço e respondeu a pergunta não feita.
- Ele foi viajou, sem data pra voltar.
Alexandra achou que estava preparada, que pois de fato um dia ela iria embora com seu clã, com sua família. Mas naquele momento, a dor que sentiu ao se ver diante do fato de não vê-lo mais a destroçou. Se antes ela tinha alguma dúvida quanto à seus sentimentos, agora ela tinha certeza deles, sua vida sempre seria incompleta sem ele.
Durante os 3 dias seguintes ela se recuperou das lesões, ficando apenas os hematomas. Ela ia e voltava da fazenda, triste. Por mais que amasse seu trabalho, as coisas pareciam meio cinzas. Na noite anterior quando Zenon apareceu a noite, ela fingiu estar dormindo, e se esquivou de ter a companhia dele ao ir trabalhar no dia seguinte. Sua vida estava em total tormento, não tinha notícias de John, sentia falta da risada dele, suas brincadeiras, até mesmo suas broncas. Sua mãe preocupada, pois ela já não sentia fome, e quando chegava do trabalho estudava um pouco e ia dormir, a dor em seu peito só aumentava.
No quarto dia, ela resolveu se dedicar a tarefas mais solitárias, a fim de evitar o olhar desconfiado de Finn, e a conversa sem fim de George. Começou a escovar os cavalos em uma tristeza tão profunda, que quando se deu conta estava chorando, presentido sua tristeza, Pegasus, em um raro momento de docilidade, esfregou sua cabeça no braço de Alexandra, fazendo ela dar um sorriso triste.
- Você quer uma cenoura né.  - a menção ao seu legume preferido, juntamente com o cheiro que vinha da sacola que Alexandra carregava fez o cavalo relinchar alegremente. Ela começou a acariciar o dorso dele, murmurando palavras ternas a ele, mas sua voz estava desprovida de qualquer emoção além da tristeza. Estava tão absorvida em pensamentos que não reparou que um homem alto estava parado na soleira observado-a. Como um misto de alegria, ternura e saudade, John ficou observando Alexandra, e viu que ela conseguiu o que mais ninguém foi capaz, conquistar não só a obediência de Pegasus, mas sua fidelidade e amor, ele estava completamente chocado por ver aquele animal, considerado uma besta selvagem, tentando chamar a atenção dela. Ela de fato era uma encantadora, dominou os instintos daquele animal incrível. Dominou seu coração. Durante 4 dias fez todo o possível para ficar longe, encontrou Philippe em Edimburgo, mas não parava de pensar nela, todos os seus instintos diziam para ficar longe, mas seu coração e sua mente eram incapazes se afasta-la. Sabia que era um amor impossível, sua cultura, sua idade, suaa vidas, eram tão distintas quanto a água e o óleo. Mas contra toda a lógica, contra a racionalidade, seu coração a escolheu. Tinha experiência suficiente para saber que o sentimento não era passageiro, e que nada seria capaz de apagar dele o que ele sentia por ela. Assim, tomou a decisão de aproveitar todo o tempo que lhe fosse permitido com ela, mesmo que para isso tivesse que calar esse sentimento, não era de sua índole seduzir meninas, não começaria agora, se contentaria em apenas estar por perto, ser seu amigo, seu confidente, seu protetor. Assim, cansou de ficar parado e decidiu tornar sua presença conhecida.
- Então fico fora uns dias e você amolece no treinamento.
Ela virou imediatamente ao som daquela voz grave, da qual estava quase louca de tanta saudade. Ela o encarou com os olhos ainda umidos pelas lágrimas, o olhou espantada, mas assim que se deu conta de que não era uma alucinação, ela abriu um sorriso enorme que fez o coração de John parar. Ele pensou que adoraria beijar aquele buraco que fincavam em suas bochechas quando ela sorria. Então o inesperado aconteceu, totalmente entregue a imensa alegria de vê-lo novamente, ela mandou para o inferno as boas maneiras e o recato, avançou na direção dele, e o abraçou, não apenas com os braços, mas principalmente com seu coração.

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