Capítulo 9- A Hortelã

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Em meio aos estudos, e de forma que me fizesse perder a concentração, fiz questão de relembrar-me de um infeliz fato: Não tinha dado certo e eu não podia reverter aquilo, não naquele momento. Mesmo assim uma estranha paz crescia no meu coração, talvez por saber que eu tinha feito o meu melhor.

Estava em uma aula de Anatomia tentando focar-me ao máximo nos meus testes, era uma tarefa difícil, já que alguém do outro lado do laboratório me chamava a atenção. Um homem de jeito alegre e fala estranha conversava com um amigo meu numa animação que deixava claras as possíveis intenções dele com o outro, e aquilo me fez rir um pouco. Fiquei curiosa para saber a nacionalidade do rapaz de cabelo ruivo e barba comprida, já que uma vez disseram que ele estava lá por intercâmbio. 

O professor, que mais parecia um aluno, por ser tão jovem, indicou o fim da aula e pediu um minuto para finaliza-la, o tal estrangeiro se aproximou e sentou ao meu lado como se fosse um amigo de anos. Fiquei constrangida por concluir que ele tinha percebido que eu o encarava a aula toda.

-Se for essa a questão... –Ele sussurrou. –Sim, eu sei que ele tem uma namorada. Mas foi ele quem pediu ajuda, eu não podia perder a oportunidade!

Segurei a risada e me mantive em silêncio até o término da aula, e ele tratou de me acompanhar assim que me levantei.

-Aquilo nem passou pela minha cabeça, mas devo dizer que é verdade. –Soltei rindo logo que sai da sala. –Se bem que ele tenta provar sua masculinidade de uma maneira tão exagerada que as vezes tenho minhas dúvidas...

-Brincadeiras e homens lindos a parte, meu nome é René, René Beaumont, mas nunca me chame por esse nome ou eu te deserdo assim como os meus pais. é ótimo.

-Meu nome é Samantha, mas jamais me chame assim ou eu te deserdo também. Sam para mim é perfeito. –Brinquei repetindo suas palavras. –De onde você veio, Rê?

-Do interior da França... Um lugar onde não há sinal de celular nem vida inteligente. –Ele falou num tom de piada, mas sério, como se só a lembrança do lugar já o entediasse.

Inferi que, por ser no interior, a sua casa haveria de ficar num local extremamente calmo, e como devia ser bom morar num local como esse. Externei isso e ele me olhou como se eu fosse louca. 

-Depende do que considera como "Calmo".  A cidade até que era, já a minha casa... Estou feliz por estar aqui, só não faço ideia de onde estamos. – Ele olhou para os lados e só então me dei conta de que eu não fazia o caminho que a maioria dos alunos faziam para sair da universidade. Senti um pouco de pena e continuei meu trajeto. Rindo da fala dele, me dei conta do seu português quase perfeito. Não tive coragem de lhe perguntar sobre o assunto e parecer indiscreta.

-E o que está achando de Portugal?- Mudei de assunto numa tentativa de começar um assunto melhor.

Ele respondeu com um certo entusiasmo que achava o lugar incrível, e conversamos por algum tempo sobre a minha Lisboa aos olhos dele. Passamos a andar com passos mais lentos e senti como se ele realmente fosse um grande amigo, e pensei em como eu adorava conhecer pessoas com quem eu me sentia confortável em agir e falar da minha forma.

Chegamos no portão principal após poucos minutos de conversa, a Clarissa lá estava me esperando com uma cara não muito feliz. Apresentei-o para a versão mal-humorada da minha amiga e logo me despedi, rumo ao nosso lugar de estágio, mas sem antes prometer que conversaríamos mais tarde. Se eu demorasse com a conversa, seria fuzilada mais tarde.

Peguei-me pensando no que o René queria dizer com "te deserdo assim como os meus pais", A frase não me soava como uma brincadeira, e senti o desejo de descobrir mais sobre aquilo. De certa forma eu me identificava. Fui obrigada a voltar para a Terra, onde tinha trabalho a fazer.

SamanthaWhere stories live. Discover now