Capítulo 4- Mesa 6

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Conduzi o carro sem quase conseguir respirar, o último acontecimento repetia-se na minha mente centenas de vezes a cada segundo. Há meses que eu não sabia o que havia entre nós, e não sabia dizer se tive uma confirmação ou se aquilo só piorou toda a confusão. O fato de existir a possibilidade de ele estar apaixonado por mim me deu arrepios; e se eu pensasse que ele podia me amar acabaria por bater o carro.

Eu simplesmente não o amava daquela forma, não estava apaixonada, e não saberia o que fazer se isso não fosse recíproco da parte dele. Nunca, nem por um segundo nos imaginei juntos. E era por isso que eu não entendia o porque daquilo mexer tanto comigo, devia ter sido apenas um beijo, mas soava como um erro enorme.

Logo que cheguei em casa tive vontade de ligar para ele e dizer tudo aquilo, mas não era a hora certa, e claro, eu era uma grande covarde. Decidi que o melhor a se fazer era deitar e dormir, por várias horas, mesmo que a minha vontade fosse dormir por anos.

Acordei no dia seguinte com o celular tocando, novamente meu corpo congelou, não tive dúvidas de que seria ele, e realmente era.

...............

Cheguei no local marcado sentindo cada parte do meu corpo tremer, quem dera fosse pelo frio de 11 graus que fazia no momento. Encolhi-me sob uma árvore que havia na rua, mesmo vestindo uma jaqueta de couro e cachecol, o frio era enorme. Por sorte ou azar ele não demorou muito a chegar, e veio logo me cumprimentando com aquele abraço que fazia até a minha alma aquecer.

Entramos no ambiente com a temperatura mais amena, e quase que lendo meus pensamentos, pediu um café puro para mim e um refrigerante para si. Aquilo era loucura, eu nem sequer deveria estar ali, não ainda.

-Eu queria mesmo falar contigo depois de ontem... – Ele falou quase nada nervoso comparado a mim naquele momento. Além da ansiedade, sentia meu rosto corar cada vez mais, não era fácil encarar meu melhor amigo depois de tudo. –Está tudo bem?.

Permaneci calada observando a rua através do vidro que dominava a fachada do lugar. Ainda era cedo, e eu gostava de ver e imaginar a vida de cada uma das pessoas que por ali passavam, apressadas. Para onde estavam indo, o porque de tudo aquilo, quais eram suas alegrias e tristezas da vida.

Mas naquele momento eu só conseguia pensar na minha, e no que viria a seguir.

-Diego, eu não acho que vamos resolver coisa alguma aqui hoje.- Falei logo depois de uma senhora ruiva de avental azul-claro nos servir.

-Então está aqui por que?

-Eu queria ouvir o que você tinha a dizer.- Respondi segurando com força a xícara de porcelana, o cheiro de café lembrava-me da minha mãe, mas não trazia consigo boas memórias.

Ele endireitou-se na cadeira, estalou os dedos, olhou para o chão, mesa, teto e qualquer outro canto da cafeteria.

-Ouça, eu sinceramente nunca entendi o real significado das suas atitudes, nunca entendi o que sentia por mim além do que já sabemos. Eu não quero te magoar, nem nunca quis que houvesse algo mal explicado entre nós, que é o que acontece agora. Mas, Sam...- Ele suspirou depois de atropelar palavras atrás de outras. -Para mim, você é minha amiga de anos e nada mais, só que eu nunca havia percebido isso até ontem! E sobre o beijo. acho que quis ter certeza do que eu sentia, por que até então eu também não a tinha. Fiquei até com medo de estar te iludindo de alguma forma, ou de você estar sofrendo por tudo isso.

-Eu acho que estava passando pelo mesmo. – Menti forçando um sorriso, se eu falasse algo mais era capaz de estragar tudo, não acharia ruim se um raio caísse na mesa naquele instante. 

Eu tremia como nunca antes, mas ele pareceu bem calmo, o que me fez duvidar um pouco de seus sentimentos.

-Tem certeza?- Ele perguntou sem acreditar nas minhas palavras.

-Não é tão simples.- Murmurei. –Isso tudo é muito recente, não dá pra falar uma dúzia de palavras e sair daqui como se nada tivesse acontecido ontem, porque aconteceu.

-Não precisa ser tão complicado, eu já expliquei os meus motivos de fazer o que fiz!- o Diego parecia incrédulo. –Foi o mesmo contigo ou não?

-Eu disse que vim aqui apenas para ouvir o que você tinha a dizer. 

-E já ouviu tudo, satisfeita?

Dei o último gole da bebida amarga disposta a sair de lá no mesmo instante, sentindo que não aguentaria estar a sua frente por mais um segundo sequer. Fiz menção de levantar mas ele impediu-me.

-Samanta, pode falar o que quiser pra mim. O que te impede de se abrir comigo? Eu falei algo que não devia?

-Diego, esquece. – Falei sentindo o nervosismo aumentar. –O que eu sinto e acho de tudo isso é mais um problema meu do que seu.

-E o que é, então?!

-É só que eu não acho justo!- Falei elevando o tom de voz. –Porque pra você é fácil lidar com isso, está sempre com alguma garota ao seu lado, mas eu me tornei uma delas. Só que pela primeira vez desde sempre eu estava gostando daquele caos que criamos entre nós.

Ele assentiu com a cabeça e sorriu de canto, encarando a mesa de madeira escura.

-Para mim também não é fácil lidar com isso, Sam. Porque existe uma grande diferença. – Sua expressão deixava-me curiosa para entender o que ele queria dizer. –As mulheres com que eu fico nunca chegarão aos seus pés.

Ergui as sobrancelhas e me vi sem reação, mas ele acompanhava-me, vermelho.

-O que quer dizer com isso?

-A questão é que eu te amo demais para querer ficar contigo. Eu não acho que você mereça esse idiota que eu sou, porque sei que eu iria te magoar de alguma forma. Assim como já fiz e estou fazendo agora. 

Respirei fundo processando aquelas palavras que atingiram-me como um soco no estômago, eu mal conseguia respirar.

-Por isso prefere que as coisas continuem assim? Porque você tem medo de me machucar?

-Não. Porque você merece muito mais do que eu posso te dar.

Ok. Não conteste, não insista, não estrague tudo.

Assenti voltando o olhar para fora, o sol começava a clarear o lugar onde estávamos, o que era no mínimo aconchegante. Uma musica alegre passou a ecoar pelo ambiente, tirando o clima pesado e ao sério que havia alí. Encarei-o sorrindo por alguns segundos, enquanto ele se distraia com qualquer outra coisa .Não sabia o por que, nem a fonte daquilo, mas algo nele continuava me atraindo, e a lembrança daquele beijo voltava a fazer os meus sentidos se desconcertarem.


SamanthaWhere stories live. Discover now