Só esta noite

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- O sotaque dele é horrível - o oficial comunicou entrando na sala de seu superior com uma careta de desgosto.

O outro - um homem redondo com um bigode ensebado lhe enfeitando a cara cheia de sardas - retumbou uma risada estrondosa na pequena sala. Seu corpo rechonchudo movimentou-se conforme suas risadas exageradas, inevitavelmente contagiando o outro mais jovem, que ria continuamente, feliz por sua piada ter agradado tanto seu chefe.

- Esses ingleses... - começou, ainda com dificuldade, limpando uma lágrima fajuta do canto dos seus olhos. - São todos uns frangos que nunca soube nos enganar com esses sotaques inconfundíveis e insuportáveis.

- Eu sempre desconfiei - concluiu o soldado.


O superior sorriu, satisfeito, esquadrinhando seu soldado e lembrando-se que ele conseguira a informação de que tanto necessitava: o tal morador novo da Rua Frieden era inglês e 0 mocinho desgraçado que se dizia seu "primo" o estava abrigando há meses e, o que é pior, muito provavelmente tendo relações com o porco inimigo.

Mas os alemães eram mais espertos do que todos julgavam e, ao invés de matá-lo de forma bem torturante - como manda o figurino - eles iriam usá-lo como informante. A retaguarda alemã na Polônia estava perdendo a força e o tal inglês seria muito útil informando quais os próximos passos dos Aliados. Assim, as Potências do Eixo ficariam preparadas para qualquer ataque que ocorresse naquela área tão importante de domínios germânicos e não perderiam sua principal conquista desde 1939.

E o energúmeno ainda facilitara as coisas, pois fora se aliar ao Partido Nazista. Então, "sendo um cidadão tipicamente alemão", ele tinha o dever de ir para a guerra, como qualquer outro que se aliava. Eles fariam tudo por debaixo dos panos e apenas diriam que sabiam de tudo quando ele já estivesse lá, no campo de batalha, sem nenhuma alternativa ao não ser dizer quais eram as táticas aliadas. Perfeito.

- Eu queria poder informar a todos do mundo que essa guerra não está perdida - o superior murmurou, acendendo um charuto caro. -Nós vamos trucidar a todos - esperançou-se.

E, realmente, trucidariam. Mas não a todos. Não a quem queriam. Não a quem merecia.

❀❀❀

A porta da pequena casa da Rua Frieden abriu-se melancolicamente, revelando um soldado de ombros caídos, e cenho franzido em desgosto, preocupação e medo.

Harry Styles estava combalido em desesperação.

Sentia sua vida caindo pelo ralo, de um modo lento, torturante, como se ele estivesse preso num sonho e estivesse impedido de fazer algo para que tudo não desmoronasse.

Fora aliar-se ao Partido, como Zayn tanto insistira, sem realmente acreditar que isso fosse fazer alguma diferença. Não acreditava em mais nada, apenas na certeza mais absoluta de que seria preso e, muito provavelmente, morto. Acreditava na certeza absoluta de que perderia seu alemão.

E isso o fazia sangrar, o fazia perder o ar. Era terrível de um modo que ele jamais imaginou existir.

Ele finalmente havia encontrado alguma razão para viver, algo ao que agarrar-se, mas isso também lhe fora arrancado, como sua família e sua liberdade, há tanto tempo.

Melancolicamente, perguntava-se o que faria da sua vida agora. Estava preso a Alemanha, como um bom cidadão que cumpre seu dever e se alia ao Partido, para ajudar o país no que for preciso. Isso o enojava. Estava aliado ao Partido, aliado a Hitler e a tudo o que ocorria de horrível naquele país.

Ensina-me a Viver ❀ Larry VersionOnde histórias criam vida. Descubra agora