Capítulo 3

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Então foi isso, Tadayoshi pensou enquanto deitava na palha, encarando o teto. Aquela criança perdeu a mãe, mas não se entregou ao desespero ou quer vingança. Apenas uma chama chamada de determinação sobrou. Ele sorriu. Só de ver alguém assim valeu a pena vir pra essa vila.

O espadachim fechou os olhos, mas apesar de seu cansaço, o sono não veio. Não era o baixo choro vindo do quarto do chefe, mas a imagem do olhar do menino em sua mente. Coçando a cabeça, ele procurou dentro de suas roupas um dos poucos pertences que tinha para se distrair.

Tadayoshi possuía cinco coisas no momento. Um era a faca do bandido que tinha pego hoje. Duas ele roubou na última cidade por onde passou quando fugiu após descobrirem sua identidade. E as outras pertenciam a sua antiga vida

As duas uma vez pertenceram ao seu mestre e para Tadayoshi, a espada e o diário de seu mestre eram igualmente importantes.

O pequeno livro era tão velho e gasto e Tadayoshi lera tantas vezes ele temia que as páginas caíssem ou a tinta desbotasse. Mesmo assim, ele sempre lia quando não conseguia dormir, e toda vez conseguia escutar a voz de seu mestre. E por aqueles breves momentos, o espadachim sentia que o velho samurai estava ao seu lado mais uma vez, e que sua morte não era verdade.

Seu mestre era conhecido entre nobres e camponeses, e quase todos o consideravam uma lenda. Os próximos a ele diziam que ele podia ser considerado uma criança crescida. Sempre que Tadayoshi pensava em quão diferente as imagens eram, o espadachim não conseguia deixar de rir.

Para ele, seu mestre era alguém apressado, sempre pronto para uma briga... não, duelos, como ele dizia, e adorava irritar pessoas arrogantes, especialmente nobres que se consideravam importantes demais. No entanto, nas ocasiões mais inesperadas, o samurai era alguém calmo que analisava tudo antes de agir.

Sua letra refletia isso. Onde ele contava sobre suas lutas e aventuras, era quase um garrancho ilegível, como se seu mestre escrevera ainda no calor das batalhas. Mas quando escrevia sobre seus próprios mestres, a família, sobre o futuro ou sobre Tadayoshi, ou como ele gostava de falar, o moleque, a letra era clara, bonita e de algum modo parecia gentil.

Quando as noites eram pacíficas, e Tadayoshi não precisava se preocupar se acordaria com a cabeça ou não, o espadachim chorava enquanto lia.

A razão pela qual Tadayoshi lia e relia o pequeno diário era simples; encontrar quaisquer pistas que pudessem levar até o motivo por trás do último pedido de seu mestre. O velho samurai não escrevera o que aconteceu, nem onde aconteceu. Nada além de informações vagas antes da luta. No entanto Tadayoshi acreditava que tinha deixado passar um detalhe, alguma descrição, qualquer coisa.

Então ele leu e releu mais uma vez, mas sem encontrar nada. Droga, Tadayoshi pensou, guardando o diário enquanto a exaustão voltava. Respirando fundo, ele desistiu e tentou dormir na noite quente de verão.

Sumire-dono acordou cedo para preparar a comida. Apesar de não ser necessário, ela tentou fazer o mínimo de barulho possível para não perturbar o estranho em sua casa. Ou talvez ela não quer falar comigo, Tadayoshi percebeu. Apesar de manter os olhos fechados, ele tinha acordado ao primeiro sinal de movimento na sala.

Ele não tinha certeza quanto tempo passou, mas em algum momento Daisuke-dono também saiu do seu quarto. O espadachim permaneceu como estava enquanto o velho se juntava a sua mulher na cozinha. Pelos sons, eles tiveram sua refeição lá.

Ainda assim Tadayoshi não se mexeu, concentrando em sua audição. Por um momento, tudo que conseguia escutar era eles comendo, e acreditou que a refeição seria silenciosa como na outra noite, mas Sumire-dono interrompeu o silêncio.

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