Capítulo 2 - Alexander

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- Sinto muito, Alex. - Suzana me abraça.

- Eu também.

Enxugo mais uma lágrima quando ela se vai. Eu odeio isso, na verdade, odeio meu irmão por estar me fazendo passar por tudo isso. Ele poderia ter aguentado mais, reagido e vivido. Porém me deixou aqui, sozinho, a mercê de...Deus, eu acho. Ele era o único que me entendia, que me conhecia. Estávamos no Iraque, esperando uma ordem do nosso superior, me afasto dele por cinco minutos e olha o que acontece, Miguel morre. Havia um espião, um espião que não devíamos ter o deixado entrar, avisei tanto para Miguel ficar longe dele... e quando aquele desgraçado conseguiu o que quis, matou meu irmão e mais dois soldados, e me deixou paraplégico.

Saí de dentro daquela casa o mais rápido que pude, e com aquela geringonça era meio difícil. Eu tenho que ir embora daqui o mais rápido possível, sem ele não consigo mais fingir. Toda minha vida fui uma pessoa que meus pais queriam que eu fosse, uma pessoa que não fosse igual ao homem que é biologicamente meu pai. Ser o filho perfeito da família Nogueira, ser o filho que eles nunca tiveram. Mas como ser isso quando você nunca foi desejado por ninguém? Sinceramente, acho que vou pra uma dessas ilhas desertas e apodrecer lá, quem iria se importar comigo mesmo?

Tá, tudo isso deve estar confuso, aliás, eu sou confuso. Ah, que piada. Eu não sou filho do meu pai, quero dizer, sou filho do meu pai, mas não sou. Minha mão, Magda, é casada com Marcus que é o pai do meu meio irmão; minha mãe engravidou de um homem que é... meu pai. E adivinha quem era o filho da minha mãe com o outro cara? Eu! Que empolgante, não sério. Tipo eu só sou um filho de um desgraçado que é drogado e alcoólico. Não julguem minha mãe, ela só estava no lugar errado e na hora errada. E como a religião da perfeita família não permite o aborto, e Magda acha que eu não tenho culpa de ter me formado e que Deus me colocou na vida dela por algum motivo, eu não morri quando era apenas um feto. Consequente minha vida é uma...

- O que ainda está fazendo aqui? - procuro o dono da voz, que conheço desde que nasci.

Ergo o olhar para o filho perfeito da família Nogueira, André. Sério, Deus. Por que não fez que ele tivesse ficado dentro daquela casa fazendo a sua obrigação? Já basta conviver com esse cara me atormentando a vida toda e agora, que meu irmão morreu ele vai fazer o acerto de contas. Sério, agora que ele vai começar o show dramático dele, dizendo que mamãe deveria ter se livrado de mim no momento que soube da minha existência, e que eu só trouxe mais desgraça para a vida perfeita deles, que sou a ovelha negra do bando. Deveria estar agradecido por não terem me largado na sarjeta? Por Deus, poderiam me ter colocado em um orfanato, ter me deixado com alguém ou até mesmo me largar na sarjeta, quando tiveram as milhares oportunidades.

- Sei lá. Esperando um meteoro me atingir e Deus salvar o resto. - Ele revira os olhos e bufa. - Errei, estou esperando você e toda sua "perfeição" saírem daqui e me deixarem em paz. - fiz aspas com os dedos.

- Por favor, Alexander! Por que não foi embora das nossas vidas ainda? - cerrei os punhos e me aproximei dele. - Cara, desencana! Não tem mais por que você ficar aqui; seu irmãozinho já morreu há um bom tempo. Ele não está mais aqui, morando aqui - apontou para a casa que morávamos, pelo menos ele - Fingindo ser da família, porque nem você nem ele pertencem a ela. - Um soco no estômago teria doído menos.

- Engraçado, não acha?

- O que? - perguntou irritado.

- Que eu, sendo filho de quem sou, tenho menos coisa podre do que você, sendo filho de quem é.

Seus olhos começaram a faiscar de raiva, ele trincou se maxilar e serrou tanto os punhos, que eu acho que as unhas estavam machucando a palma da mão.

- Não sou eu quem é filho de seu pai. - E foi embora.

Vou ser bem sincero, essa briguinha não foi nada comparada as que tínhamos antigamente. Lembro de uma que tivemos, fomos parar no hospital, pois eu tinha "quebrado" o braço dele e o André fez o mesmo com meu nariz. Apesar de tudo, me sentir um pouquinho melhor por saber que aquele desgraçado teve que fazer uma cirurgia pra que o braço voltasse ao normal. Quem mandou mexer com um cara que vivia nas ruas?

É, talvez eu tenha um pouco da escuridão do meu pai. Todos têm um pouco, certo?

Até Que A Luz Se ApagueOnde histórias criam vida. Descubra agora