O cortiço

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A tarde corria pelas ruas movimentadas do  Lower East Side, um bairro cinzento de Manhattan, por onde a linha férrea corria sobre a cabeça de Newt Scamander, que olhava maravilhado e um tanto desconfortável para as calçadas apinhadas de barris, carroças, automóveis e transeuntes vendendo frutas ou atravessando poças de lama com rapidez. Não reparou, porém, na criatura que atravessou a estrutura de ferro, com o lampejo de um raio. 

Um inseto gordo e azulado zumbiu subitamente, batendo as asinhas velozes como as de um beija-flor. Logo, o gira-gira desapareceu no céu parcialmente nublado. 

- Não acredito que não obliviou aquele homem - retorquiu Tina, ao seu lado, como um segurança impaciente. Carregava, furiosa, a mala cheia de doces e pãezinhos agora frios. - Se houver uma investigação, é fim par mim.

- Mas por quê? Não foi você quem...

Tina suspirou. 

 - Estou proibida de chegar perto dos Segundos Salmenianos... - Uma brisa ligeira perpassou por eles e, por milésimos de segundo, Newt finalmente vislumbrou o borrão azulado que denunciava a presença do gira-gira. A vê-lo, o inseto passou voando, fustigando-lhes o cabelos cor de palha. 

- O que foi aquilo? - indagou Tina, confusa. 

- Uma mariposa, eu acho - desconversou Newt, entreouvindo a gritaria que antecedia maus presságios. Apressou o passo com a mão nervoso no bolso esquerdo, aproximando-se da confusão na rua defronte. - Das grandes...

Curiosos se amontoavam ao redor de um prédio de cortiços, por onde uma cortina de fumaça espessa (a mistura da calefação desmantelada e da poeira que se erguia) sujava as pessoas confusas e em pânico que tomavam as escadas de incêndio, fugindo da construção abalada. 

- Ei, ei! - gritava uma voz masculina. - Se acalmem, estou tentando colher informações...

Deveria pertencer a um policial, pois próximo dali a voz de uma senhora metida em um casaco castanho abraçava três crianças assustadas, enquanto falava com o homem uniformizado. 

- Estou dizendo: foi outra explosão de gás. Não vou voltar para lá com as crianças até que seja seguro.

- Mas, senhora - apaziguou o policial -, não há nenhum cheiro de gás no ar...

Outro homem meteu-se na conversa, o casaco puído pelas traças. 

- Não foi gás, senhor. Eu vi o que foi. Foi um gigantesco, enorme, hipopó... - Um zumbindo perpassou por seus ouvidos quando Newt Scamander entreouviu a conversa, apontando-lhe discretamente sua varinha, confundindo-o -... gás. - Meneando a cabeça, o trouxa ainda levou um segundo para se situar novamente. - Gás, foi gás...

A multidão logo lhe deu razão, tomando a atenção dos policiais, que não viram o bruxo tomando as escadas em direção ao prédio de cortiços, embrenhando-se pelos moradores que desatavam em pânico, carregando alguns poucos pertences de pouco valor. 

Tina, abobalhada, continuou na rua, fitando aquela que deveria ser a grande mariposa, que rodopiou sobre os no-majs, desaparecendo outra vez. 

Problemas...

Newt levou alguns minutos entre subir as escadarias rangedouras e encontrar aquele que deveria ser o pequeno apartamento que exalava todos os cheiros reconhecíveis... Além de uma densa camada de poeira que corria por baixo da porta sem pintura e aos pedaços. 

Torceu para que o problema não fosse dos piores, mas ainda ficou paralisado ao adentrar no quarto completamente destruído, agora com uma visão panorâmica para o prédio feio defronte. Tábuas e pedaços de cimento se desprendiam sobre os restos de calefação e o que um dia fora uma cama. Tudo estava tomado pelo pó e nada poderia se assemelhar mais com um cenário de guerra. 

Animais Fantásticos e Onde Habitam - O LivroOnde histórias criam vida. Descubra agora