As ruas de Nova York eram absurdamente mais movimentadas que as da Trafalgar Street na hora do rush, até mesmo quando o Rei Edward resolvia aparecer rapidamente para seus súditos em uma carruagem de capota aberta. E tal fato era o que mais encantava Newt Scamander, que espichava o pescoço pelas calçadas úmidas e encobertas nos becos por uma bruma quente de calefacões desmanteladas.
Acima de sua cabeça, um metrô deslizava com rapidez até o outro lado da ilha. Um caminhão do corpo de bombeiros ordenava que os veículos dessem passagem para que pudessem chegar mais rápido à sua emergência; mulheres paravam nas lojas e vitrines, fofocando sobre tecidos, perfumes e a última moda da idílica Paris, do outro lado do mundo.
Newt já estivera por lá e esperava voltar em breve, mas o que tinha que fazer era mais importante. Tinha de encontrar o doutor a tempo de comprar uma passagem para o próximo navio, até o fim daquele dia. Não pretendia passar mais do que uma noite na América, prevendo a pior das hipóteses.
Mas, como sabemos, Newt Scamander não era clarevidente.
Tomou a rua defronte a um imponente banco - branquíssimo a comparar com as demais construções vizinhas assoladas pela industrialização e umidade daqueles meses de inverno. As chaminés estavam sendo impiedosas, enquanto mais lareiras eram acesas.
Porém, novamente, sua atenção foi roubada por um intenso burburinho de pessoas excitadas paradas para ouvir o clamor de uma mulher miúda posta em vestes roxas, sobre a escadaria do banco, afim de tornar-se mais alta e imponente; sua voz, para todos os efeitos, fazia o serviço completo.
Declaravam-se a Sociedade Filantrópica da Nova Salem. A mulher miúda, mas não menos persuasiva e carismática, chamava-se Mary Lou Barebone - uma versão puritana do Meio-Oeste dos anos 1920. Tremulando às suas costas, um homem ostentava uma faixa com o símbolo de sua sociedade: mãos que seguram orgulhosas uma varinha quebrada em meio a reluzentes chamas amarelas e vermelhas.
- ... esta grandiosa cidade cintila com as joias da invenção do homem! Salas de cinema, automóveis, o rádio, luzes elétricas... tudo nos ofusca e enfeitiça! - Não era incomum ouvir discursos persuasivos naqueles últimos anos. O fim da Primeira Guerra Mundial não significava que o ânimo de grupos conservadores houvesse esmorecido, pelo contrário, pareciam cada vez mais atiçados.
Mas, à primeira vista, no que ele ainda não havia ainda visto a faixa muito bem, Newt aproximou-se, achando que não passava de uma comoção interessante, no meio daquela cidade tão diferente. Sem julgamentos, apenas puro interesse.
Absorto, Newt esbarrou em uma senhorita que mal se mexia, não menos interessada no discurso, enquanto mordiscava aos poucos um cachorro-quente onde a mostarda sujava o lábio superior. O chapéu enterrado na cabeça escondia o penteado e o pescoço junto da gola virada para cima.
- Oh... peço mil desculpas. - Por um momento seus olhares se encontraram, porém nada mais veio em resposta da moça do que um seguido revirar incomodado. Parecia espionar todos os presentes.
- Mas onde há luz, há sombra, meus amigos. Há algo à espreita em nossa cidade, causando destruição, depois desaparecendo sem deixar rastros... - continua Mary Lou. Ao lado, um homem grande com um bigode fino e respiração ofegante chega nervoso em direção à multidão, segurando uma maleta de couro marrom surrado e metido em um terno que não lhe caia bem.
- Precisamos lutar... juntem-se a nós, os Segundos-Salemianos, em nossa luta! - Finalizou Mary Lou, triunfante, como se chamasse seu batalhão para a guerra.
O homem de maleta ainda lutava para passar a multidão, mas não pareceu culpado quando também esbarrou na mulher com o cachorro-quente.
- Com licença, mocinha, só quero chegar ao banco... com licença... só quero... - desculpou-se, aturdido. Tropeçou na maleta de Newt, pousada no meio do caminho, e caiu subitamente, como um desenho animado, desaparecendo por alguns segundos. Newt ajudou-o a levantar-se.
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Animais Fantásticos e Onde Habitam - O Livro
FanfictionJá imaginou como seria ler o filme de Animais Fantásticos como um livro? Sentir a emoção de tentar descobrir o que vai acontecer a cada capítulo? Foi exatamente o que eu quis descobrir e sentir quando comecei a escrever essa fanfic. Newt Scamander c...