A Casa dos Novos-Salemnianos

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Minha mãe, sua mãe, 

Uma bruxa vão pegar

Minha mãe, sua mãe,

Num tronco a voar

A cantoria preenchia o salão vazio e pouco iluminado que era a congregação humilde dos Novos Salmenianos. Localizada no subúrbio de Nova Iorque, aquele ponto possuia uma fachada nada convidativa, escurecida pela falta de reformas, com uma porta apertada, por onde até mesmo as dezenas de crianças famintas que passavam por ali todos os dias tinham que se espremer. Lá dentro, sobre uma mesa bem arrumada de tampo de madeira, os folhetos impressos em milhares estampavam a campanha da congregação: BRUXOS VIVEM ENTRE NÓS!, Se junte aos Novos Salemnianos!

Outra trazia a foto gloriosa de sua líder: Mary Lou. 

Modesty pulava a amarelinha escrita sobre o assoalho sem polimento, pulando em um pé, depois dois, depois um de novo. 

 Bruxa Número 1, No Rio Afogada.

Bruxa Número 2, Vai Ser Enforcada.

                                                              Bruxa Número 3, Vamos Ver Queimar.

Bruxa Número 4, Uma Surra Vai Levar.

Acima da mesa, a bandeira do movimento se erguia como se estivesse em chamas: duas mãos partiam ao meio uma varinha. Credence, um dos filhos de Mary Lou, aproximou-se da janela, onde um pombo estava empoleirado e ameaçava defecar sobre o umbral, e bateu palmas para assustá-lo. 

Mamãe não gostaria de sujeira, pensou. 

Ele fugiu no segundo aviso, assim que Chastity, sua irmã, abriu a porta apertada e ergueu um sino para a rua movimentada, em chamamento. 

Duas dezenas de crianças se apertaram pela porta estreita mais uma vez e passaram correndo para dentro do salão, interrompendo a brincadeira de Modesty. Todas estavam famintas, lambendo os beiços ao verem uma fileira de caldeirões com ensopado que Chastity e Credence remexiam, pondo em tigelas fartas. 

Mary Lou veio logo atrás, metida em um avental branco, adorável e graciosa como uma boa mãe, sorrindo para cada um deles. 

- Peguem o panfleto antes de pegarem a comida, crianças - avisou, com um sorriso tenro. 

Chastity ofereceu cinco para cada e logo eles voltavam para a fila da sopa. 

Um dos garotos, deveria por volta de 12 anos, encarava Credence com um misto de curiosidade e apreensão. O garoto mais velho mal olhava para cima: sempre parecia estar com o pescoço voltado para o chão. Mary Lou aproximou-se, atenta, passando os dedos finos pelo lado direito de seu rosto, onde, acima da sobrancelha, um sinal pintava seu rosto pálido e magro. 

- É uma marca de bruxa, moça? - perguntou, nervoso. Credence, subitamente, levantou os olhos, encarando o menino e a mãe. Por um momento, Mary Lou ficou em silêncio, pensativa. Depois sorriu e passou-lhe a tigela de sopa. 

- Não. Ele esta bem. - Faminto, o menino logo se deteve a terminar seu conteúdo. 

Credence nada disse. 


Animais Fantásticos e Onde Habitam - O LivroOnde histórias criam vida. Descubra agora