No-maj

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Extremamente confuso, Jacob Kowalski andava pelas ruas mais humildes e movimentadas de Nova Iorque olhando a todo momento sobre o ombro, para ver se não estava sendo seguido. Assombrado com os acontecimentos recentes, ele mal percebia que aquela maleta que carregava não continha o mesmo peso da sua própria, que ela não exalava o delicioso cheiro dos pães e doces que aprenderam nos balcões da cozinha de sua querida avó. 

Aquilo tudo não poderia ter acontecido, não! Não era possível! Mas como ele teria parado do outro lado das grades do banco, visto um homem virar uma estátua, depois ter reaparecido do lado de fora do banco? Ainda não possuía as respostas que acalmariam seu cérebro no-maj em pânico, mas tudo o que queria era sair do meio da multidão que se desenrolava aos pés do metrô sobre suas cabeças. 

Entre as ruas sujas e cheias de trabalhadores braçais, muitos vendiam verduras e outros alimentos a preços acessíveis, o frio assolava com o vento trazido dos becos e do cais do porto que soava as chaminés e motores ao longe. 

Agradecido por estar de volta à pensão decrépita onde se instalara a fim de conseguir uma vida melhor na grande Manhattan, subiu o vasto caminho de escadas que levava aos últimos quartos, acompanhado pelo rangido dos corrimões antigos de madeira. Atirou a maleta sobre a cama com uma colcha marrom feia e não percebeu quando alguma coisa ali dentro reclamou. 

Frustrado, encarou um retrato simples dependurado sobre o dossel da cama, ao lado da janela, que trazia o riso farto de uma senhorinha usando pérolas longas. 

— Desculpe, vovó. — Sentou-se na escrivaninha perto da porta e lamentou por poucos minutos sobre sua última chance perdida. O que faria então? Não tinha mais opções a não ser o empréstimo do banco. O salário da fábrica mal pagava o aluguel barato e suas necessidades... Teria que voltar para a casa de seus pais...?  Aceitar que estava derrotado...

De repente, ouviu um clique. Olhou para trás e o fecho dourado da maleta havia se desprendido. Sentou-se para concertá-lo — pois não poderia comprar uma nova tão cedo, já que aquele havia pertencido ao seu avô; mal tocara na superfície de couro falso e o outro feixe se abriu. 

Uma proeminência despontou em uma dos lados e pareceu, por um momento, que a coisa teria ganhado vida. Dando pequenos saltos, ela, então, começou a soltar grunhidos... Teria aquele homem rogado um feitiço em seus pãezinhos? 

Assustado, Jacob recuou para a parede do retrato de sua avó. A maleta estancara. Tomando coragem, ele se aproximou, apoiado sobre a colcha, para bisbilhotar nas brechas das abertura.

Alguma coisa molenga e raivosa saltou em seu colo e soltou um grunhido como de um porco, remexendo-se em suas mãos, tentando atacá-lo. Segurando-o como se levasse uma descarga elétrica, Jacob fitou aquela criatura bege e sem pelos que lembrava um porco espinho pelado. Um segundo estrondo escapou da maleta, ricocheteando no teto e explodindo o forro infiltrado que deixou escapar restos de pinturas. A coisa invisível (ou rápida demais para ser vista) caiu sobre a cama e atirou-se contra a janela, assustando tanto Jacob quanto o porco-espinho pelado em suas mãos. 

Jacob piscou, pois achou também ter visto uma espécie de beija-flor passar zunindo pelos cacos que se desprendiam dos restos da moldura da janela. 

E, finalmente, um terceiro estrondo mil vezes maior, que, primeiramente, derrubou o quadro de vovó, onde jazia um fundo falso. Um bramido reverberou pelo quarto e a última coisa que viu, antes de despencar com a nuca sobre a cômoda, foi a parede despencando sobre a calçada abaixo.  

Animais Fantásticos e Onde Habitam - O LivroOnde histórias criam vida. Descubra agora