Noite sem fim

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Sofi fingiu estar passando mal, o balconista esqueceu nossa presença ali e correu para ajuda-la, era um senhor de no máximo 72 anos. Thomaz abriu a mochila, pegou potes de sorvete, garrafa de bebidas, salgados, eu paralisei na hora e só contribui o ajudando a fechar tudo.

Thomaz: Ta bom, vamos - cochichou. 

Fui na frente e ele me seguindo atrás, colocamos o pé pra fora do Ticktes Food e saímos correndo para o outro lado da rua, Oliver nos esperava lá. Sofi apontou para a porta dos fundos do estabelecimento.

Sofi: Aquele casal.. Roubou... Saiu por ali.. - disse pausadamente fingindo estar sem ar.

O senhor levantou rapidamente, pegou um taco de beisebol e saiu às pressas para as portas do fundo, tempo suficiente para Sofi levatar-se, sair correndo e chegar até nós. Soltamos todos gargalhadas e entramos dentro do carro.

Thomaz: Rápido, rápido, precisamos ir - trancou as portas e acelerou o carro.

Oliver passou na nossa frente, deu uma buzinada para Thomaz e acelerou mais o carro.

Cecília: O parque não era por ali? - observei entrarmos em uma avenida.
Thomaz: Aham, mudança de planos - riu - coloca o cinto. Rápido.
Cecília: Ta, ta - ri.

Thomaz estava mais de 100 por hora em uma avenida que era 60 km/h, Oliver e Sofi numa velocidade um pouco a mais. Passamos em frente a um restaurante pouco movimentado mas que havia uma viatura da policia na frente e dois policiais entrando no estabelecimento. Oliver deu uma forte buzinada e acelerou mais ainda, Thomaz nem precisou, o barulho do motor em alta velocidade já era forte demais. Os policiais correram para a viatura, depois vieram atrás de nós, quer dizer, tentaram nos acompanhar.

Thomaz: Ainda estão nos seguindo? - disse após uns 10 minutos.
Cecília: Não - olhei no retrovisor.
Thomaz: Ótimo, despistamos eles.
Cecília: Você sabia que a viatura da polícia estava naquela rua, não  é? -notei ele diminuir a velocidade.
Thomaz: Sabia, o combinado na verdade era passar por ali e provoca-los mesmo, todos os dias no fim do expediente, eles passam naquele restaurante, o tio de Sofi trabalha lá. Foi só pra dar mais uma adrenalina - riu.
Cecília: Mais adrenalina? Já pensou em pular de asa delta, mergulhar de um penhasco?
Thomaz: E se eu te disser que já fiz essas duas coisas?
Cecília: Eu acredito - ri - você é louco Thomaz!
Thomaz: Você gosta - sorriu de lado.

Ri e desviei o olhar para o caminho. Ele estacionou em uma outra praça, a nossa frente estava Oliver e Sofi, ambos se pegando no banco de trás do carro deles.

Thomaz: Virá comigo na próxima vez? - desligou o carro e me olhou.
Cecília: Talvez - sorri.
Thomaz: Gosto de certezas - riu.
Cecília: Virei
Thomaz: Eu disse que você ia gostar, a adrenalina é única.
Cecília: Foi hilário - sorri - eu congelei na hora.
Thomaz: Eu percebi.

Fechei o sorriso e ele notou meu olhar baixo.

Thomaz: O que foi? Qual o problema?
Cecília: Eu deveria estar me sentindo culpada.
Thomaz: Não está?
Cecília: Não - ergui o olhar pra ele
Thomaz: Sabe por quê?

Neguei com a cabeça.

Thomaz: Porque você esta feliz, porque você se divertiu.

Sorri de lado.

Thomaz: Vem cá - me beijou.

Ele me puxou para mais perto e sentei em seu colo, afastou mais o banco do motorista para trás e nos beijamos outra vez, ficamos ali trocando algumas mãos bobas.

Oliver: Ai casal, partiu parte dois - bateu no vidro.

Abaixei minha blusa rapidamente e encostei meu rosto no ombro dele, um pouco tímida com a chegada de Oliver ali. Thomaz o encarou sério.

Oliver: Desculpa - riu - mas ta na hora da parte dois.

Levantei a cabeça e olhei Thomaz.

Cecília: Que parte dois?

Thomaz sorriu.

Saímos do carro e ele abriu o porta malas, lá estava uma caixa de madeira aberta com uma diversidade de sprays de grafite.

Thomaz: Já usou um desses alguma vez?
Cecília: Nunca - ri - onde vamos pixar?
Thomaz: É arte bebê, arte - brincou.
Sofi: Qualquer muro vazio que encontrarmos.
Oliver: Sofi é experiente em grafites - sorriu.
Thomaz: Verdade, precisa ver os desenhos dela.
Sofi: Obrigada garotos.
Thomaz: Tá legal, vamos lá. Escolham suas armas e mão na massa - pegou o spray azul e deu alguns passos atrás para que pudessemos escolher os nossos.

Peguei o spray vermelho, Sofi o amarelo e verde, Oliver o preto. Deixamos o carro ali e caminhamos pelo quarteirão em busca de muros vazios sem ninguém por perto para grafitarmos e pixarmos.

Cecília: Não sei como usar isso corretamente - olhei Sofi começando seu desenho.
Thomaz: Eu te ensino - largou os spray dele no chão e se aproximou.

Ele parou atrás de mim, grudou meu corpo no dele e deslizou a mão para a minha, encaixou meu dedo no guincho do spray e me guiou para formar um desenho qualquer, formou um coração, olhei para ele e sorri.

Oliver: Aula de putaria ou aula de como pixar?  - notou nossos corpos bem colados.

Thomaz riu e voltou a me olhar.

Thomaz: Agora é com você bebê - se afastou, pegou o spray dele e começou o grafite.

Oliver: Somos um desastre nisso Cecília, vamos pixar! - riu - deixa a arte do grafite com esses dois ai.
Sorri.

Tivemos que interromper nossa"obra de arte" 15 minuto depois, uma senhora da casa ao lado que estavamos usando saiu para a rua, nos viu e ameaçou chamar a polícia. Guardamos nossos perteces e saímos correndo, ela foi bem generosa, nos deu 5 minutos para irmos embora. Thomaz deu a mão para mim e corremos juntos para o carro.

Thomaz: Falou galera, vejo vocês amanhã!  - gritou para Oliver e Sofi do outro lado.
- "Té" mais- gritaram juntos, entraram no carro e saíram.
Eu estava com os sprays, encarregada de guardar no porta-malas, mas quando me aproximei do carro notei duas crianças parada em frente ao vidro dos bancos de trás olhando atentamente a mochila jogada no banco. Era um menino de aparentemente 4 anos e uma menina talvez uns dois anos mais velha, ambos usando trajes rasgados e chinelos imendados com fita. Olhavam atentamente a mochila, me aproximei mais e notei que dali dava para observar os salgadinhos e potes de sorvete, senti um aperto no coração e chamei por Thomaz.

Thomaz: O que foi? Algum problema?
Cecília: Vem cá - pronunciei ainda olhando as crianças vidradas na comida dentro do carro.
Thomaz: O que eles estão olhando? Ei crianças! - balançou a mão na frente do rosto dos dois.

Pareciam ter saído do transe, eles deram alguns passos para trás, aparentemente com medo, e o garotinho abraçou a menina. Larguei os sprays no chão e olhei Thomaz.

Cecília: Estão olhando a comida dentro da mochila.
Thomaz: Ah - ele disse ainda as olhando.

- Fome - sussurrou o garotinho.

Thomaz abriu o carro, pegou os salgadinhos, pacotes de batata frita e os três potes de sorvete que havia pêgo, arranjou uma sacolinha no porta luvas, colocou a comida dentro e entregou as crianças. Ambos abriram um sorriso de orelha a orelha e abraçaram forte Thomaz.

- Obrigado tio - disseram juntos.

Sorri e os olhei se afastarem.

Thomaz: Tomem cuidado!

A menina se virou, deu uma piscade-la e continuou andando.

Thomaz: Todo lado ruim tem seu lado bom, roubamos mas demos a alguem que precisa - sorriu.

Retribui o sorriso, orgulhosa e satisfeita com a atitude dele.
Guardamos os sprays e entramos no carro.

Thomaz: Partiu casa - ligou o carro.
Cecília: Esta sendo a minha melhor noite, não queria ir pra casa agora.
Thomaz: Quem disse que é pra sua? A nossa noite ainda nao acabou - olhou para a garafas de bebida no banco de trás, olhou para mim e colocou a mão na minha coxa, arrepiando-me.

Olhei para a mão dele, sorri e o olhei.

Cecília: Partiu cama.

Ele sorriu de lado e acelerou o carro.

O diário de Cecília..Onde histórias criam vida. Descubra agora