Capítulo 8 - 07/09/2009 - 06/06/2010 Ônibus das 17 hrs

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06/06/2010

Ainda que estivesse presa dentro do quartinho da farmácia onde Beatriz trabalhava, Cléo sentia-se livre por poder sair dali logo. Beatriz e ela fizeram um acordo de ninguém saber sobre ela, e no domingo Cléo entraria no ônibus e iria para sua casa, em paz, retomando sua vida de antes. Beatriz levou algumas revistas para a fugitiva ler enquanto estava ali naquele quartinho, e na madrugada de sexta para sábado, e sábado para domingo ela aproveitou para sair na rua, mesmo com todo o frio, o casaco emprestado de Beatriz não foi suficiente de livrá-la da friagem, mas era ótimo poder circular em paz pelas ruas, sem destino, mas com a sensação de liberdade que lhe foi tirada há alguns meses. Sobre Vicente, Cléo não pensava muito, não queria falar ou pensar sobre ele, mas sabia que alguma hora eles iriam se esbarrar, mas sua boca não ficaria fechada e ela iria atrás da polícia para colocá-lo atrás das grades.
No pequeno relógio digital que ficava em cima do balcão da farmácia, Cléo certificou-se antes de sair que eram 1:40 da manhã, horário propício para caminhar pelas ruas pacatas daquela cidade. Saiu por uma portinha de saída, e foi caminhado com o chinelo velho da irmã de Beatriz, enquanto esfregava as mãos nos braços, a fim de munir-se daquele ar frio que lhe cortava o rosto. Onde morava fazia frio em junho, mas ali era mais do que frio, era uma Sibéria.
A mente de Cléo pensava em tudo, pensava em Rodrigo e em como ela queria que ele estivesse se sentindo preocupado com o sumiço dela, pensava em sua mãe, quem ela sabia que estava realmente abalada com aquele desaparecimento, entretanto tentava evitar ao máximo pensar em Vicente, mas não podia, foram meses, semanas vivendo de maneira indigna e miserável dentro de um quartinho, enquanto ele lhe abusava. Nunca sentiu tanto nojo de alguém como sentiu de Vicente, e se pudesse faria o que pudesse para fazê-lo pagar, nem que fosse possível fazer o mesmo que ele fez consigo.

07/09/2009
Cléo e sua melhor amiga, Gabriela iriam a uma festa no centro, e para isso Cléo mentiu para sua mãe dizendo que ia dormir na casa de Gabriela, mas elas foram a uma badalada festa organizada por um grupo de um colégio caro, onde Vicente trabalhava. As meninas não estudavam lá, mas Gabriela tinha conhecidos nesse colégio, e Cléo só seguia a amiga.
— Vai ter bebida? - Perguntou Cléo ainda dentro do metrô, antes das amigas chegarem na festa.
— Claro que vai, Cléo. Você vai pegar experiência com o tempo, e logo vai beijar um menino também, porque já passou da hora disso. - Comentou Gabriela, fazendo Cléo ficar ruborizada. Gabriela, ou Gabi era a menina bonita e popular da sala, muito contrário de Cléo que era quieta e não chamava tanta atenção assim. Com seus cabelos loiros lisos, nariz arrebitado e traços finos Gabriela conseguia quem quer que fosse, então não tinha problemas em se envolver ou conseguir ingressos para festas, ao contrário de Cléo, que era desajustada, não bebia, não fumava, não usava drogas e muito menos beijava na boca, e isso era motivo de grande zoação em seu grupo de amigos.
Não demorou muito para as duas chegarem na estação central, e guiada por Gabi, Cléo caminhava em direção à festa. O evento ocorria em uma casa velha que ficava na subida de um morro, e na porta da casa Gabriela encontrou dois rapazes que conhecia, e deu um abraço nos dois, cumprimentando-os e apresentando Cléo.
— Essa é a Cléonice! - Os três riram, mas Cléo não disse nada, apenas esboçou um sorriso amarelo. Era hábito de Gabi fazer piadas desse tipo.
— Que nome horrível. - Comentou um dos rapazes. - Vocês podem entrar. - Gabi deu um beijo no rosto do garoto e entrou segurando o pulso de Cléo, que inexperiente não tinha noção do que fazer.
Dentro daquela casa, mais especificamente na sala havia luzes piscando, e um som alto tocando Pokerface da Lady Gaga. Gabi começou a dançar e Cléo imitou os passos da amiga, só que mais tímida que ela. As duas dançaram até chegarem dois rapazes. Um era negro, camisa polo e cabelo enrolado curto, e segundo Cléo, tinha um sorriso muito bonito. O outro tinha cabelo curto, um corpo atlético e era mais alto que o amigo.
— Gabizinha, não disse que ia trazer companhia. - Disse o rapaz negro, sorridente.
—Guto, Rodrigo! - Gabriela parou de dançar para abraçar os dois rapazes.
— A mocinha não tem língua ou é metida assim mesmo? - Perguntou Rodrigo.
— Meu nome é Cléo. - Cléo estendeu a mão para ser apertada pelo garoto, que riu da atitude da menina, indo lhe dar dois beijos em cada lado do rosto.
— Não sei como conseguem se divertir sem bebida? - Disse Augusto, ou Guto.
— Que bom que tocou nesse assunto. Por favor, traga bebida para nós. - Cléo temeu o comentário da amiga, afinal nunca havia posto nenhuma gosta de álcool na boca, mas estava ali para se divertir, e se álcool estava no protocolo, por que não?
Os quatro caminharam até a cozinha, onde as bebidas estavam e cada um pegou uma garrafa de Ice para beber. A música que tocava no momento era Clumsy da Fergi, e Gabriela dançava descontroladamente, sem vergonha, e bebia aquela bebida como se fosse refrigerante. Já Cléo, um pouco mais recatada, dava poucos goles, já que sua garganta ardia com aquele gosto de álcool em sua boca, mas se forçava a curtir. De repente, a menina viu sua amiga beijando Augusto, e isso lhe deixou sem reação, já que estava ali sozinha com o outro, que dançava mas lhe lançava olhares diferenciados.
De repente, Cléo sentiu a mão forte de Rodrigo apertando sua cintura, e seu rosto se aproximando do outro. Cléo ficou nervosa, afinal, era um rapaz bonito, mas desconhecido. Mesmo assim, permitiu-se obedecer os passos que seriam seguidos por Rodrigo sem retrucar, e foi assim que ele se aproximou mais de seu corpo, e desceu suas mãos para o traseiro avantajado da adolescente, apertando-o. Era incomodo para Cléo, mas ela não falou nada, e também não demorou para ele trocar seu traseiro por seu rosto, e iniciar um beijo de língua. Cléo dançou conforme a música, que no momento era Give to me, da Madonna.
Cléo bebeu, dançou, beijou Rodrigo, bebeu, beijou Rodrigo, dançou, beijou, bebeu, bebeu, beijou, bebeu e desmaiou, acordando dentro do carro de Vicente.
— O que eu tô fazendo aqui? - Perguntou Cléo, deitada no banco de trás do carro.
—Ainda bem que eu cheguei pra te buscar, sua imprudente. - Disse Vicente, ríspido.
— Hã? - Cléo apertou os olhos - Como assim? Ah é, eu comentei com você da festa... - A cabeça de Cléo doía bastante. - Tô com dor de cabeça.
Vicente deu uma risadinha antes de começar a falar.
— Quando a gente bebe, sentimos muita vontade de ir ao banheiro, por isso fazemos muito xixi e não repomos o líquido que saiu. Daí temos dor de cabeça. Você vai ficar lá em casa essa noite, sua amiga nem pra cuidar de você... - Vicente parou em um sinal e acendeu seu cigarro.
— O que aconteceu de verdade? Eu só lembro de estar dançando e cair no chão, porque tudo ficou preto.
— Desidratação e carga alta de álcool no corpo de uma inexperiente. Fica longe dessas festas, e dessas pessoas. Alguns são meus alunos, e não valem a comida que comem. Eu fui lá pra te buscar mesmo, não consegui dormir pensando no que poderiam fazer com você, Cléo.
Vicente levou Cléo para sua casa, e entrou na ponta dos dedos com a menina, sem que sua irmã, sobrinho ou mãe acordassem. Depois entrou em seu quarto e trancou a porta, para levá-la até um banheiro que ficava em seu quarto, ligando o chuveiro gelado para empurrar a menina lá dentro. Cléo gemeu ao sentir o contato da água gelada, mas Vicente segurava seu ombro com tanta força, que ainda que suas pernas estivessem bambas, ela não cairia no chão. Depois de se molhar, Vicente puxou uma toalha que estava pendurada no box, e respeitoso secou o corpo pardo de Cléo, sem retirar sua roupa molhada enrolou-a na toalha colocando-a na cama.

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