PRÓLOGO 1/3 - Natiel

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Bem vindos a "Amedrontado"!!! 

Acompanhem a música que está no topo da página para acompanhar o capítulo e excelente leitura para todos!! 

Fui despertado por um estrondo. Apressei-me, ainda zonzo e cambaleante pelos corredores da casa.

– O que houve? O que aconteceu? – Apertando os olhos, segui até a cozinha de onde podia ouvir movimentos e lamentações.

– Desculpe, irmão... – Era Adriel, com uma mão apoiada num encosto de cadeira. – Deixei a panela cair sem querer.

Estranhando a cena perguntei:

– Por que você está mexendo com isso? Cadê o Daniel?

– Ele foi a feira – respondeu enquanto se esforçava em recuperar os utensílios caídos. Apressei-me em ajudá-lo e assim continuou: – Se esqueceu que dia é hoje?

– Ah, é claro...

Suspirei incomodado com aquele meu lapso. Daniel costumava ir à feira com muita frequência, ainda assim era estranho ver Adriel na cozinha...

– E o que você está fazendo aqui Gado?

Ele me olhou e franziu a testa.

– Foi o combinado! Eu faria o café da manhã, se esqueceu disso também?

Eu fitei a minha direita, com expressão confusa. Ele continuou:

– Aliás, parece que se esqueceu até mesmo da touca.

Adriel bufou em gozação e me deu as costas, recolocando a panela no lugar.

Passei a mão pelos cabelos, como se precisasse me certificar de que estava mesmo sem a veste.

– Acho que deveria maneirar nas suas saídas – continuou meu irmão. – Suas ressacas parecem estar cada vez piores.

Seria um bom conselho para quem estivesse assim. Mas, eu não estava de ressaca. Na verdade, há muito tempo que não bebo uma gota de álcool. Ou será que...? Coloquei a mão à frente de minha própria boca a fim de sentir o bafo. Fiz uma careta, mas o odor não era de nada alcoólico. O mesmo quando funguei a manga da camisa.

Sentei em uma das cadeiras e me pus a refletir, enquanto tentava amparar minha cabeça com as duas mãos. Eu realmente não estava me lembrando de combinado algum quanto as tarefas... O que mais eu poderia ter esquecido? Pior, que grande problema ocorreu para que eu esquecesse das coisas agora? Era assim que funcionava já fazia algum tempo. Toda vez que eu passava por um grande apuro eu me esquecia deste e de todo o resto que o envolvia, incluindo momentos anteriores e posteriores. Eu tinha que me controlar... Se eu deixasse o medo me dominar, eu não sei o que me aconteceria. Será que eu poderia me esquecer de mim mesmo? Não tinha jeito... Eu precisava falar com o médico neurologista e precisava ser logo.

– E aí, cara? – Despertou-me Adriel. – Vai ficar aí ou vai ajudar?

Levantei-me e fui lavar a pouca louça que ficara do jantar. Eu precisava me distrair e o novo comportamento de meu irmão mais velho era a distração perfeita. Ele estava mais disposto, mais ativo, mais revigorado... Mas, pior mesmo, era ter que ouvi-lo cantar. Em meio aos meus conturbados problemas, gargalhei da situação, rindo, claro, bem na cara dele.

***

Anotações... Fui buscar por qualquer dessas. Revirei o quarto que, finalmente já não dividia com ninguém, a fim de tentar clarear um pouco a minha falta de memória recente. Mas foi em vão...

Quando esses lapsos começaram a me incomodar eu tentei manter um diário em que, disciplinadamente, atualizava em todo o final do dia; mas toda essa "disciplina" durou pouco tempo. Dias, talvez alguns meses... Não sei precisar ao certo. Eu até tentava escrever, mas comecei a esquecer o local em que eu guardava os escritos e, pior, comecei a me preocupar quanto ao conhecimento de meus irmãos a respeito. Eles não me poupariam se soubessem que eu mantenho um diário.

Talvez eu devesse refazer os meus passos... Mas, será que seria uma boa ideia a de descobrir um grande fato esquecido, muito provavelmente, por segurança do meu próprio organismo? Eu nunca quis admitir, mas a verdade é que eu sou um covarde, minha touca está de volta a minha cabeça para assim provar e me lembrar. Tenho medo da vida, tenho medo da morte, tenho medo de esquecer, tenho medo de lembrar... Eu só não tenho panfobia, porque havia muita coisa que eu não temia ainda. E, como eu sou de me conformar rápido quanto aos meus esquecimentos, partirei para uma dessas coisas. Para que me preocupar com diário? Para que me preocupar quanto ao dia esquecido se o melhor era viver o novo? Eu tinha que aproveitar enquanto ainda estava consciente. É... pois é... Eu temia a demência. Eu estava destinado a ela, eu sabia.

Enquanto eu ainda pensava, ouvi meu celular tocar. O som vinha de debaixo da cama. O que ele estava fazendo ali? E como eu não havia pensado nele antes? Quem sabe meu telefone móvel não tinha pistas do dia anterior? Até mesmo a ligação poderia me sugerir algo... E lá vamos nós de novo! Eu tentava... Tentava... Mas, era sempre assim. A preocupação não saia de mim! Como viveria em paz com tantas dúvidas a meu próprio respeito?

Atendi sem nem olhar o identificador de chamadas.

– Alô.

Puxa, finalmente você atendeu... O que aconteceu? Por que saiu daquele jeito do show de ontem? – Era uma voz de mulher.

Ontem? Show?

Mals aí... Mas, quem está falando?

Ah qual é? Já esqueceu da minha voz ou é o resultado de uma ressaca pela qual não fui convidada? ... Isso porque havia dito que a minha voz era a mais bela que já ouvira. Eu já devia saber. Você não é diferente de nenhum outro!

Eu não conseguia formular palavras, estava embasbacado! Por certo eu aprontara, isso não era novidade, mas ter passado meu número de celular era... E agora? Investigo mais ou saio dessa provável enrascada? E como sair dessa? Bem, só me resta investigar...

­– Está com tempo? Podemos nos encontrar?

Como assim? Era por esse motivo mesmo que eu estava te ligando! Já estou te esperando faz meia hora. Não vá me dizer que nem saiu de casa ainda?

Eita! E agora? Bem... Era melhor cair fora dessa.

– Desculpe, mas... Acho que você ligou errado.

Quê?? Mas, que raio de desculpa é essa? – Alterou-se a voz. – Não me venha com essa, Jonas!

Jonas? Pus-me a rir.

– Você ligou errado mesmo – falei, em prantos pela gargalhada. – Meu nome é Natiel.

O quê???

Antes de poder rir mais durante a ligação, ouvi o som de chamada encerrada. Além de maluca era mal-educada! Será que era bonita, pelo menos? A voz era! Enfim, disso eu não saberia mais, a menos que fosse maluco o suficiente para ligar de volta... Pensando bem... Sim! Eu sou maluco o suficiente. Se bem que, com certeza, seria a pista errada. Eu podia agir como um canalha de vez em quando, mas nome falso eu ainda não havia dado; então, por certo, ela ligara errado... Ah, e quem liga?

Dei de ombros para aquelas preocupações bobas e liguei para o número que me ligara. Como pensei, realmente não pertencia aos meus contatos.

– Alô moça brava, que tal parar de me punir e dizer onde você está?

Eu realmente não prestava! Iria me encontrar com uma desconhecida que levara toco e estava rindo... Rindo de mim mesmo! Eu podia ter medo de muito, mas de mulher jamais.

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Música do capítulo: "It's My Life" - Bon Jovi (Cover By Per Frederik "Pellek" "Ãsly")

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AMEDRONTADO - LIVRO 2 [COMPLETO] - Trilogia Irmãos AmâncioOnde histórias criam vida. Descubra agora