Por trás das máscaras

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- Durante a minha vida inteira eu me escondi de mim. Rejeitei viver a minha identidade para fingir ser quem eu não era. Meus pais achavam que eu era um objeto sem sentimentos que não percebia as crises conjugais que tinham todos os dias. Mas na verdade eles achavam isso porque era isso que eu demonstrava ser. Eu era aquela bonequinha vazia que estava sempre sorrindo. Por dentro eu gritava e me debatia, mas por fora... Por fora eu estava bem. Minhas máscaras foram se aprimorando cada vez mais. Na minha adolescência eu me envolvi com caras que "supriam" qualquer necessidade afetiva que eu tivesse. Isso aos olhos de quem me via, porque na verdade, cada boca que eu beijava era um veneno que eu queria que me matasse de uma vez por todas. Até que eu conheci o Joan. O Joan sabia me entender e com ele eu me sentia alguém...

Melissa dizia cada palavra com os olhos fitos em Edu.

- Com ele o monstro que havia em mim se acalmava e meus sorrisos se tornavam sinceros. Mas com o tempo eu fui perdendo o encanto. Eu não fui ensinada a amar. Eu não sei como se faz isso. Apesar de me sentir bem, eu nunca revelei pra ele quem eu era. Eu resolvi empurrar com a barriga aquele relacionamento desgastante pra mim, mas onde eu fingia ser feliz...

Joan estava chorando e todos em silêncio ouvindo as palavras de Melissa

– Era melhor estar com ele do que em casa, que mais parecia um inferno. Até que um dia meu teatro foi longe demais e eu acabei engravidando. Fingi com todo o cinismo do mundo que estava feliz com a criança, mas só eu sabia o quão terrível aquilo era naquele momento. Eu que queria morrer, agora estava gerando uma vida dentro de mim. Eu pensei em aborto, mas eu não tive coragem...

Joan estava em um estado de choque e profunda angústia. Cada palavra daquela massacrava seus pensamentos e dissolvia qualquer lembrança boa em dor e agonia. Melissa não ousava olhar para mais nada além dos olhos de Edu. Uma força desconhecida veio como um impulso e fez estourar a caixa de verdades que ela trazia dentro de si. Nada mais importava. Ninguém mais importava. Não existia mais ninguém ali além dela e Edu.

- Dois meses depois da descoberta da gravidez, o Joan e eu saímos de moto para a casa de uns amigos. Eu sabia que não podia, mas eu não me importava com a criança. Não me importava a vida. Não fazia diferença a morte. No espaço de tempo de um piscar de olhos, um carro prateado surge à nossa direita em alta velocidade. A pancada nos lançou pra longe. Eu sofri um aborto e o Joan fraturou uma vértebra da coluna. Ali acabou tudo. O único laço que me prendia a ele morreu naquele acidente...

Melissa parou por alguns segundos e pensou um pouco. Todos estavam em silêncio. Ela então olhou para Joan e friamente disse:

- Eu sou a Melissa. O monstro que você nunca deveria ter conhecido. Você foi tolo em acreditar que eu te amei. Na verdade eu não sou capaz de amar ninguém. Não sou digna de viver nem tampouco capaz de morrer. Minha mãe quis me abortar e falhou. Aos sete meses eu caí na piscina e não me afoguei. Aos dezoito eu tomei pílulas de feijão, mas meu corpo rejeitou e eu vomitei na hora. Naquele acidente você perdeu a capacidade de andar, o bebê perdeu a vida, mas eu, eu saí ilesa! Eu tentei fugir dessa maldição vindo para São Paulo, mas olha só! Fui abusada - disse olhando para o Anderson - fui perseguida por um maníaco e ainda levei um tiro! E eu não morri! Você está surpreso? Vocês estão surpresos? A vida me detesta e a morte me rejeita. Que proveito eu tenho disso? Agora vocês conhecem a verdadeira Melissa. A que tenta ser alguém, mas fracassa. A que não serve nem para ocupar um lugar no necrotério!

Joan aproveitou a atenção de todos para Melissa e num movimento rápido e preciso, pegou o revólver da mão do Anderson.

- Cala a boca! - disse apontando o revólver para ela.

- O que você pensa que vai fazer? A morte tem nojo de mim.

Melissa olhou novamente para Edu, passou o braço envolta de seu pescoço e aproximou seus rostos.


- Eu sei o que é querer desesperadamente uma coisa que foge sempre de você. Eu vou beijar a morte, beije-me também.

Melissa beijou-o num beijo doce e ao mesmo tempo quente e ofegante. Anderson tentou tirar a arma das mãos de Joan, mas foi tarde demais.

(Tiro)

...


"A morte é o presente mais aguardado de alguém,  tanto que passamos uma vida inteira esperando por ela" IssaAraujo

Nota da autora: Me digam o que estão achando por favor. Preciso saber se vale a pena continuar. Thanks!

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