CAPÍTULO 6

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Estas foram as duas semanas mais longas da minha vida. Compareci a vários bailes. E em todos eles me vi compelida a dançar com Lorde Hadwerty, Duque de Grafton. Além de acompanhá-lo em passeios pelo Hyde Park e suportar suas visitas contínuas a Pwenlly House na hora do chá. A cada novo encontro com o Duque sinto-me um pouco mais destroçada. Não consigo considerar nenhum evento desta temporada prazeroso, pois sempre me agoniza a certeza de que irei encontrá-lo, fazendo-me sentir como uma presa encurralada à espera do abate. O meu casamento com aquele homem asqueroso já é tido como fato incontestável para o meu pai. Eu sou a única ainda relutante a aceitar a situação (o que parece ser um mero detalhe irrelevante).
_Mas e quanto ao seu plano? - Elga me questiona, assim que acabo de narrar o baile da noite anterior, onde mais uma vez tive que suportar as atenções de Lorde Hadwerty.
Elga é a única que sabe do meu grande plano. Nem tão grande assim... Na realidade, pensando nele agora parece demasiado tolo.
_Meu plano tornou-se inviável, uma vez que para seduzir um homem faz-se necessário passar um tempo no mesmo recinto com ele. - Explico irritada.
Quando conheci Lorde Willian Denvalle, Duque de Spencer, eu pensei que talvez ele fosse a solução para o meu dilema. Se eu pudesse conquistá-lo... Certamente um casamento com ele é preferível a casar com um ancião perverso. E somente conseguir outro duque faria meu pai reconsiderar sua decisão quanto ao Duque de Grafton.
_Desde aquele dia em que ele me tirou para dançar no baile de Lorde Hadwerty, eu nunca mais o vi em nenhum lugar - continuo a explicar - O homem simplesmente sumiu da face da Terra.
_Sinto muito, minha menina. Em minhas preces eu rogo para que você possa ao menos casar com um homem capaz de lhe despertar algum apreço.
Ao ouvi-la me pego pensando em Henrique Hutler, como fiz incontáveis vezes desde que o conheci. Ele é o único homem que desperta algo em mim. Nunca mais voltei ao estábulo, quando quero cavalgar Thimoty trás Aurora até à casa. Entretanto, não consigo evitar o desejo de vê-lo que corre em minhas veias quando saio para caminhar pelo jardim. Em algumas ocasiões eu o avisto de longe, enquanto ele cumpre algumas de suas tarefas. O cavalariço sempre desvia seu olhar do meu, obstinado a ignorar minha presença. Embora esteja claro o quanto ele me despreza não posso evitar desejá-lo. Simplesmente, não posso.
_Elga, não se preocupe comigo. Eu pensarei em outro plano.
_Caso tenha dito isso com a intenção de tranquilizar-me, sinto dizer que o efeito causado foi o oposto.
Eu franzo a testa, fingindo estar consternada, mesmo admitindo internamente que eu não sou experiente em traçar bons planos.
_Para que você precisa de um plano? - Uma terceira voz invade a sala.
Kate. Logo atrás dela vem Isabelle, carregando em seu colo Gaspar, o gato obeso que ela leva para onde vai.
_Katherine, não é educado entrar em um ambiente sem cumprimentar os que estão presentes. E também não é educado se intrometer na conversa alheia. - Elga a repreende, numa tentativa clara de desviar seu interesse da nossa conversa.
_Eu conheço as regras de etiqueta, Sra. London - Kate diz, abandando sua mão, em sinal de pouco caso – Se as descumpro é por prazer e não por ignorância.
Observo enquanto Kate senta-se à minha esquerda e Belle na poltrona à frente da minha. Quando pergunto se elas me acompanham no chá, ambas assentem. A caçula ainda tenta me convencer a servir chá para Gaspar, mas eu nego veementemente. O gato já está roliço além da conta.
_Pobre Gaspar... - Belle se queixa.
_ É pelo bem dele. - Pondero. Contudo, minha irmã continua com o cenho franzido, alisando o pelo do animal, parecendo desolada.
_Não há nada demais em um pouco de chá e alguns biscoitos. - Murmura.
_Quando vejo Gaspar andando pela propriedade, fico na dúvida se trata-se de um gato ou de um bezerro.  – Kate observa.
Belle apressa-se em tampar os ouvidos do bicho com as mãos, tentando protegê-lo. O gato continua a lamber as próprias patas, claramente alheio à conversa.
_Não permitirei que ofenda meu gato!
_Mas ele é realmente muito gordo.
_Oh! - Belle agora está definitivamente irritada. O peso do seu animal de estimação sempre é um assunto delicado para ela, e Kate adora provocá-la. 
_Kath-thrine, c-como ousa...
_Damas - Elga intervém - O chá está esfriando.
Relutantes, minhas irmãs se calam e voltamos a desfrutar do chá em silêncio, mas a tensão no ar ainda pode ser sentida. Belle permanece nos encarando com um olhar furioso, à medida que afaga os pelos de Gaspar e lhe murmura palavras de consolo. O gato permanece inerte.
_A qual plano você se referia quando entramos aqui? - Kate quebra o silêncio.
Eu pressentia que ela não esqueceria o que ouvira facilmente, mas guardava alguma esperança.
_Como?! - Faço-me de desentendida.
_Assim que entrei na sala você falava à Elga que pensará em outro plano. - Minha irmã me recorda.
_Não estou lembrada - Minto. - Com certeza o assunto era sem importância.
_Entendo... - Kate lança-me um olhar desconfiado. – Pelo que eu notei não parecia ser algo irrelevante.
Tento pensar numa resposta que desestimule minha irmã a fazer ainda mais perguntas, o que é uma tarefa quase impossível. Felizmente nossa conversa é interrompida quando o mordomo entra na sala.
_Lady Isadora, lamento interromper a hora do chá – James se curva em um reverência impecável. – Contudo, o Sr. Hutler pediu que lhe transmitisse um recado urgente.
Meu corpo reage ao simples som do seu nome sendo pronunciado.
_Pois diga James - Minha voz sai num tom mais agudo do que desejado – Qual o recado?
_Ele me disse - O mordomo começa receoso, medindo suas palavras - Que deseja vê-la no estábulo tão logo seja possível.
O que será que ele quer comigo?
*********
Quando chego próximo ao estábulo, vejo Henrique no portão que leva às baias dos cavalos do Conde. Ele parece apreensivo, seu olhar me acompanha em cada passo que dou em sua direção.
_Sr. Hutler, o mordomo me comunicou que queria me ver - Explico - Algum problema?
_Infelizmente sim, milady.
_É algo em que eu possa ajudá-lo? - Uma súbita preocupação começa a tomar posse de mim. – Seja o que for pode contar com minha ajuda.
A expressão confusa e surpresa de Henrique é o reflexo do meu próprio semblante. Surpreendo-me ao perceber que apesar do pouco que nos conhecemos me importa que esteja bem. Não quero vê-lo triste como ocorre nesse instante.
_O problema não é comigo milady - Sinto-me imediatamente aliviada - Eu lamento por ter que ser o portador desta má notícia, porém milady deve saber que a sua égua sofreu um acidente.
Todo o medo que senti ainda há pouco volta a me afligir, agora ainda mais intensamente.
_ Ela está bem? - Pergunto, trêmula.
O cavalariço não responde. Também não me olha nos olhos.
_Ela está bem? - Repito a pergunta, com a voz embargada pela aflição.
_Ela quebrou as duas patas dianteiras, milady.
_Mas sobreviverá, certo? - Dessa vez minha voz sai num sussurro, pois tenho muito medo de ouvir a resposta.
_Ainda que as patas se curem com o tempo, o animal nunca mais servirá para ser montado. - O cavalariço me encara em silêncio por um tempo, como se estivesse pensando em como dizer o que precisa ser dito - O Conde ordenou que a égua seja sacrificada. Por isso pedi que viesse. Talvez queira se despedir do animal - Ele diz por fim.
_Não! - Grito.

[COMPLETO] A dama e o cavalariço Onde histórias criam vida. Descubra agora