Londres, 1826.Dentro de instantes chegaremos a Pwelly House, a propriedade do Conde em Londres. Mesmo daqui da estrada eu já avisto a casa e o grande jardim localizado na lateral. A última vez que estive aqui eu era apenas uma menina que corria pelo jardim sem entender seu lugar no mundo. Sem perceber o seu frio propósito. Mas, dessa vez é diferente. Eu compreendo meu destino. Casar-me. Um matrimônio com quem meu pai considere conveniente. Enquanto os cavalos finalizam o percurso, analiso novamente minha situação: é meu dever ser recatada, graciosa, evitar falar demasiadamente, em hipótese alguma expressar uma opinião divergente a de qualquer homem, não posso desrespeitar a mais simples regra. Preciso ser perfeita para ostentar o título do meu futuro marido.
A filha de um Conde deve comportar-se de acordo com sua prestigiada posição.
Assim que a carruagem para, a portinhola é aberta e alguém me estende a mão. A sonolência, causada pelas horas exaustivas de viagem, turva ligeiramente minha visão. Quando seguro a mão de quem me ajudará a descer do veículo, meu corpo cansado se move e meus olhos deixam a penumbra da carruagem para se exporem à luz. Nesse momento, consigo vê-lo. Meu coração imediatamente reage pulsando em um ritmo desordenado, como se não soubesse mais como agir. De repente, eu também não sei como agir. Permaneço letárgica. Um homem alto, de constituição incrivelmente forte está diante de mim. O seu rosto respeitosamente encara o chão, de modo que não posso definir se trata-se de um homem belo ou não. Um fascínio inquietante toma posse de mim, acabo agindo impulsivamente e aperto discretamente sua mão que se encontra unida à minha. Uma tentativa silenciosa de atrair sua atenção. O homem levanta o rosto e me encara rapidamente com uma expressão interrogativa, antes de fitar o chão novamente. Ele é lindo. Sua pele levemente beijada pelo sol realça o verde profundo de seus olhos. Seu cabelo é um emaranhado de fios grossos negros como carvão. Os traços do seu rosto são retos e bem definidos. Eu nunca vi um homem de beleza tão magnífica.
__ Você seria caridosa o suficiente para desocupar a criadagem e descer de uma vez? Eu pretendo sair da carruagem e ir para os meus aposentos antes do sol se pôr. - a voz irritada de minha irmã me desperta.
Desço depressa; sem olhar para trás caminho em direção ao meu quarto. Subo as escadas atordoada. "Controle-se Isadora".
Quem é ele? Sei que se perguntasse ao meu pai a resposta seria um simples "ele não é ninguém". Pela sua vestimenta simples, estou certa que se trata de um criado. "Ele é um criado", repito mentalmente, no alento que essa circunstância me faça voltar à sã consciência. Entretanto, não consigo deixar de sentir no pulsar galopante do meu coração que algo mudou a partir de hoje.************
_Fez boa viagem, milady?
Assim que entro no meu quarto encontro Elga à minha espera.
_Estou exausta, mas ao menos não choveu, o que facilitou o trajeto. E como eu fui ensinada a sempre comemorar as pequenas bênçãos. Então, sim, a viagem foi boa.
_Vejo que foi ensinada por alguém de grande sabedoria - Ela graceja.
_E de impressionante modéstia. – Acrescento, rindo.
Elga lança-me um sorriso, enquanto desfaz minha bagagem. Além de ter me ensinado tudo o que sei trabalhando como minha preceptora, em todos esses anos a considerei como uma mãe, já que minha verdadeira mãe morreu logo após o parto e a nova Condessa não me quis como filha. Olho ao redor e admiro os aposentos, meu pai realizou consideráveis melhoras desde a última vez que estive aqui. A mobília esbanja elegância. As cortinas tem um tom azul-celeste alegre, com pequenos bordados de flores brancas que me fazem lembrar um céu com nuvens.
_Tudo encontra-se do seu agrado, milady?
_Estaria, caso você dispensasse esse tom formal, Elga. Aborrece-me esse tratamento distante entre nós. – Eu a encaro e observo o seu olhar culpado e ao mesmo tempo temeroso. Como se ela estivesse lutando para decidir como agir.
_Me desculpe. – Elga se apressa em envolver-me em seus braços e afagar meus cabelos. Agora me sinto em um lar, é o pensamento que me sobrevém a medida que me aqueço em seu abraço. – Foi ordem do Conde, minha menina. Ele não fica feliz com a sua proximidade com os criados.
Não me surpreendo. O Conde não tolera nenhuma atitude que ele considere como insubordinação. Todos têm que estar resignados em sua imposta posição. Certa vez, ao me ouvir chamar Elga de mãe, ele me castigou severamente. Eu tinha cinco anos e minha preceptora era quem me vestia, me ajudava no banho, contava histórias de princesas até eu dormir, cuidava de mim quando acabava doente e dizia que me amava. Aos olhos de uma criança, aquilo nada mais era do que zelo maternal. Porém, meu pai julgou minha atitude como errada e constrangedora. Desde aquele dia eu não a chamei outra vez de mãe em voz alta. Elga jamais me disse, mas eu sei que ela também foi castigada pelo meu erro.
_ Você sabe que é a luz da minha vida, meu pequeno raio de sol. – Ouço-a dizer – Apenas compreenda que há situações...
_Não careço que me explique, Elga. – A interrompo ao ver a aflição no seu rosto. – Eu compreendo. Apenas não precisa agir assim quando ele não estiver por perto.
Termino de tranquilizá-la beijando-lhe o rosto.
_Ele não irá me tirar você. – garanto. – Tudo, menos você.
_Eu observei alguns criados – Mudo de assunto, tentando dissipar o clima triste. – Eu vi empregado que desconheço. Ele é jovem e altos, seus olhos são verdes e o cabelo negros como a noite. Ele
_Não! – Ela me interrompe, sobressaltando-se.
_O quê?
_Fique longe dele, minha menina.
_Foi apenas uma pergunta desinteressada movida pela curiosidade. – Minto. Ainda sinto como se a minha mão fumegasse onde a sua tocou. E seu olhar pungente transformou-se em uma lembrança viva e constante.
_Para o seu bem e o dele espero que esteja sendo sincera. – Elga começa em tom de repreenda – Ele é um rapaz de boa aparência, admito. Mas também é um homem honrado e muito pobre com três irmãs a quem prover e ele necessita deste serviço. Então, seja o que tiver em mente, minha menina, desista antes que as consequências sejam irremediáveis.
_Eu apenas queria saber o nome dele. - Minto novamente. Agora sentindo uma pontada de culpa. - Apenas o nome.
_Nós o chamamos de Henry. Seu nome é Henrique Hutler.
_ Henrique... – Sussurro como se seu nome surtisse um efeito hipnotizante em mim.
Quando, enfim, me deito para dormir o seu nome ainda ecoa em minha mente.
Henrique...Henry...
O nome que eu devo esquecer.
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[COMPLETO] A dama e o cavalariço
Ficción históricaUma paixão proibida transformada em um amor que não pôde ser impedido. Quando Lady Isadora Pwenlly chegou a Londres para a temporada de 1826 estava resignada com o que o futuro lhe oferecia: um casamento por conveniência. O que a dama não previa é q...