Capítulo 21 - A caverna

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Na estrada a moto não parava de roncar. Meu cabelo voava sem nenhuma proteção em minha cabeça. Minha ansiedade já dominava minha pele fazendo com que o vento que batia em mim arrepiasse meus pelos do braço. As mãos escorregavam com o soar frio que expeliam dos meus poros, enquanto eu via que a gasolina já estava acabando na central da motocicleta.

Entrei na via oposta da que eu estava, para voltar até um posto de gasolina que eu tinha passado a mais ou menos um quilometro dali. O posto tinha uma pequena cafeteria em seu interior, então iria parar lá para tomar alguma coisa antes de tomar viagem até a gruta da estação de trem.

O posto de gasolina parecia vazio quando eu estacionei, mas entrando no local percebi um homem sentado no chão fumando seu cigarro com os olhos fechados. Ele estava por volta dos seus trinta anos e colocava as mãos na cabeça como se estivesse pensando em algo.

- Com licença. - Eu disse saindo da motocicleta e indo até ele. - É você quem coloca a gasolina?

- Sim. - Ele disse se levantando. - Mark Monte, prazer. - Ele me deu a sua mão como cumprimento.

- Kyle Hones, prazer. - Apertei sua mão e a chacoalhei.

- Quantos litros? - Ele disse indo até a mangueira.

- O suficiente para ir à estação de trem.

Eu dei todo dinheiro que tinha e ele pegou, o colocou numa caixinha e tirou algumas moedas me dando de troco. Tirou a mangueira de onde ela estava estacionada e colocou na motocicleta enchendo seu tanque.

- A cafeteria está aberta? - Perguntei.

- Está, mas se eu fosse a senhorita não entraria lá.

Tirei minha visão da cafeteria e olhei para o Senhor Marck. Ele me olhava como se já me conhecesse. Tirou o cigarro da boca e jogou a fumaça pela boca inclinando a cabeça para que eu não a inalasse, mas não tirou os olhos de mim.

- Por quê?

- Nós te conhecemos, Senhorita Kyle. Nós assistimos noticiário. - Ele tirou a mangueira e fechou o tanque. - Duas garotas fugindo, uma de um sanatório, uma por ser acusada de matar outras pessoas, e uma criança desaparecida.

Eu tirei meu olhar dele e voltei para a cafeteria.

- E por que você não ligou para a policia ainda?

- Nós de lugares distantes fingimos não conhecer ninguém. Contrabandistas, assassinos, chefes de máfias... Passam por aqui todos os dias e fingimos que nada aconteceu ou a outra opção é levar um tiro na testa. Mas não posso dizer o mesmo dos visitantes daquela cafeteria, eles não vão ser tão mudos como eu.

Eu olhei de volta para ele e abaixei meus olhos olhando para a motocicleta. Peguei em seu guidom e sentei.

- Obrigado. - Eu virei e o olhei nos olhos.

- O que seja que for fazer na estação de trem... Espero que tenha êxito. - Ele disse.

Deixei de o olhar e acelerei, me deixando com um aperto no coração. Pensando no que as pessoas estavam pensando de mim e no que meu pai estaria fazendo para tentar me achar.

Quando cheguei à estação de trem as coisas estavam calmas. Algumas pessoas estavam em horário de almoço então não tinha muita lotação nos vagões e nem nas estações de desembarque. Enquanto andava perto dos trilhos, vi um velhinho sentado no chão tocando seu violão, cheguei perto e agachei.

- Boa tarde. Meu nome é Kyle. O senhor sabe se por aqui perto existe uma gruta, ou uma caverna?

Ele ficou calado e continuou a tocar seu violão, terminou uma musica e começou outra me ignorando. Peguei as moedas do troco da gasolina e joguei no seu chapéu que já estava no chão. Ele consecutivamente parou a música e olhou para mim devagar.

- A chuva de mortos... Ela está próxima. - Ele disse fixando seu olhar em mim.

- Você é um deles? É um fantasma?

- Eles irão te visitar... Agora vá. - Ele disse apontando seu indicador direito para o horizonte. - Ela te espera.

Olhei para o horizonte e lá estava a caverna depois dos trilhos. Eu o olhei de volta e ele já tocava outra vez aquela musica. Percebi que ele não era um fantasma quando outras pessoas colocaram moedas em seu chapéu.

Andava rápido entre os trilhos como um trem. Não me importava se viria um atrás de mim a qualquer instante, eu sentia que ela estava ali, que ela me esperava. "Há quanto tempo será que ela se esconde lá?" pensava comigo mesmo enquanto minha mente turbilhoava de ideias do que fazer quando vê-la novamente.

Cheguei até a frente da caverna e seu interior estava aceso por causa do sol que pairava do seu lado contrario no céu. Não dei nem mais um passo quando vi o pequeno corpo, que não estava longe, deitado ao chão. Corri gritando "Emmy", enquanto chorava e pedia para que ela estivesse apenas dormindo.

Mas não estava, seu vestido tinha manchas de sangue, elas ainda estavam molhadas. O que me deixara ver que alguém tinha ido ali há pouco tempo. O buraco que estava em seu peito era de bala. Aferi seu pulso e ele não tinha nenhum batimento. Abraçando minha filha ao chão, como sempre a colocava para dormir, e deixando minhas lágrimas banhá-la, vi um botão. Um botão marrom de uma camisa. "Pode ser do assassino" pensei comigo mesmo. Então uma lembrança veio a minha mente, alguém que eu vira naqueles dias usava uma camisa com botões iguais a esse. Levantei limpando as lágrimas.

- Eu te buscarei, Emmy. Mas antes preciso resolver uma pendência. 

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