XV

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    Mary fora embora do hospital um pouco antes de Holmes receber alta. Um carro, enviado por Mycroft, esperava os dois garotos em frente ao local.
Com alguma relutância, Watson aceitou ser deixado em casa, porém, fez Sherlock prometer que o avisaria no momento que pisasse na própria residência.
No dia seguinte, o moreno teve de permanecer em casa, por recomendação médica. E um dia fora suficiente para John contar todos os detalhes do caso para os amigos de classe, exaltando a mente brilhante do moreno.

Dessa forma, durante os outros dias em que compareceu às aulas, Holmes foi recebido como um herói. Diferente de todos os seus anos escolares, ele enfim se sentiu realmente visto pelos demais, como alguém além da comum "aberração". Inclusive Sally e Anderson ansiavam por ouvir histórias de casos passados do cacheado. Tal fato alegrava bastante Molly e John, pois passaram a ficar todos juntos durante o intervalo das aulas.

Em um desses momentos, com os cinco reunidos, Irene Adler apareceu.
- Olá. – ela sorriu e atraiu a atenção de todos.
- Irene! – Philip sorria bobo, quase se debruçando totalmente sobre a mesa.
A jovem apenas o olhou com uma expressão neutra, dirigindo-se em seguida para Sherlock.
- Sherl, eu fiquei extremamente impressionada em como resolveu aquele caso! Vou dar uma festa amanhã, na minha casa, e quero que saiba que será em homenagem a você. – disse no tom sedutor de costume, inclinando-se levemente na direção dele.

John estava a seu lado e fechou os punhos com força.
O momento foi ideal para fazê-lo se arrepender por não ter dito nada durante a semana para Holmes.
Ele estava esperando a coragem o preencher, para conseguir declarar que estava perdidamente apaixonado pelo moreno. Por mais que Mary tivesse dito ter visto o "olhar" entre os dois, dando a entender que Holmes devolvia o sentimento, o medo da rejeição era enorme. Ele sentia a necessidade de formular muito bem suas frases, de fazer tudo calculado.

- Isso não é necessário, Adler. – o moreno comentou.
- É mais que necessário. – ela revirou os olhos, com um sorriso logo depois. – Vejo todos vocês amanhã, às 20 horas.
Não esperou que alguém respondesse, apenas partiu. Tinha certeza de que todos os convidados apareceriam, pois não perderiam a chance de estar na mesma festa em que a maravilhosa Irene Adler.

- Quem diria, hein? Irene Adler dando uma festa em sua homenagem! – Sally comentou surpresa. Deu algumas batidinhas no ombro de Holmes, que se afastou ligeiramente.
- Ouvi dizer que as festas dela são sempre as melhores! – Molly tentou disfarçar a animação, sem muito sucesso.
Hooper, Anderson e Donovan continuaram o resto do intervalo conversando sobre a festa do dia seguinte, sem notar o silêncio de John. Sherlock também ficou quieto, porém, para ele não era algo tão estranho.

Por isso, aliás, percebeu rapidamente o quanto era inusitado que John adotasse tal comportamento. Ele poderia ter feito suas deduções, mas resolveu que perguntaria o motivo, como qualquer amigo faria. Todavia, não queria questioná-lo em frente aos outros, esperaria pela a situação adequada.


A última aula fora a de biologia e como de praxe, os alunos saíram apressados. Molly dispensou a companhia de John, pois passaria a tarde na casa de Sally, escolhendo a roupa que iria usar na festa de Adler.
Holmes aproveitou a deixa para oferecer sua própria companhia ao loiro, que apenas assentiu com a cabeça em concordância.

- Greg está em casa? – eles acabaram de atravessar a rua do colégio, tendo Sherlock iniciado a conversa.
- Não. Aliás, vou ter que encontrar algo para comer. – ele reclamou, sabendo que qualquer coisa que fizesse não seria boa.
- Bem, se você quiser, pode almoçar comigo. Em casa. – o moreno disse pausadamente, analisando o rosto do outro.
Ao dizer que seria na casa do Holmes, John teve a expressão alterada. Um misto de vergonha e ansiedade, vontade e ponderação.

- Tem certeza? – ele mordeu o lábio inferior, pensando no que podia falar. Ele queria. – Eu não quero incomodar...
- Não vai. – Holmes tentou disfarçar o ânimo pelo garoto estar tacitamente aceitando. – Aproveitamos para fazer a lição de Biologia.
- Claro! A lição! Boa ideia. – Watson balançou a cabeça algumas vezes, como se lembrasse a si mesmo da lição e tentando se convencer de que aquele seria o objetivo da visita.

Parte de si estava nervosa em passar uma tarde inteira na casa do outro, especialmente após ter tido consciência dos próprios sentimentos. Era como se todo esse tempo a sós tornaria aquele o momento ideal para o que tanto queria confessar.


~

- Lestrade, tem alguém querendo falar com você. – um dos oficiais avisou ao chegar na porta do refeitório.
O grisalho estranhou receber uma visita àquele horário na Scotland Yard.
O dia em especial fora dedicado para um dos treinamentos periódicos que precisava comparecer, sendo a razão de não ter conseguido passar em casa para almoçar.
Caminhou ansioso para fora do local e, se dirigindo para o hall do prédio, identificou uma figura esguia, vestida com um terno preto.

- O que está fazendo aqui? – Greg falou já impaciente. Não queria discussões em seu local de trabalho.
- Sr. Lestrade. – Mycroft iniciou a conversa como se não tivesse ouvido o outro. – Podemos conversar?
Lestrade ponderou por algum tempo, resolvendo ceder a curiosidade e indicando o caminho que deveriam seguir para uma conversa mais apropriada. Pela primeira vez detectou um tom polido por parte do Holmes mais velho.

Estavam na área externa do prédio, comumente frequentada por fumantes.
- Se você quiser de novo importunar a mim e meu primo sobre Sherlock...
- Eu vim me desculpar. – disse rapidamente, com uma expressão incomoda.
- Se desculpar? – o grisalho olhou desconfiado.
O de cabelos moreno avermelhados limpou a garganta e hesitou, mantendo o silencio por alguns segundos.

- Sim. – ele ajeitou o paletó. – Eu conversei com os meus pais e eles contaram tudo o que fez por meu irmão ano passado...
Ambos ficaram quietos novamente.
Greg não queria ser agradecido por sua atitude com Sherlock, pois agiria daquela forma com qualquer garoto perdido e necessitado de ajuda. Ele era policial, era seu trabalho!
- Não. Se fosse outro policial, não teria tido nem um terço de sua discrição e sensibilidade. – Holmes disse, como se pudesse ler a mente do outro.
- Você sabe que tenho John por perto e eu já tive a idade deles... Sei como pode ser difícil.
- A questão é que parece que com Sherlock é tudo mais difícil. 

- Ele é extremamente teimoso e isso é um fato que quase me enlouquece. – ele revirou os olhos, lembrando de todas as dores de cabeça causadas pelo cacheado. – Mas, ao mesmo tempo, é um garoto incrível.
- Eu tenho ciência disso... Éramos muito próximos quando ele era menor. Infelizmente, desde que fui para faculdade, estive ausente.
- Ele deve ter sentido sua falta. – Lestrade notou o tom nostálgico na voz de Holmes.
- Creio que minha relação atual com ele não seja das melhores devido a isso. – disse com certo pesar, mas logo buscou se recuperar. – Todavia, eu me importo com ele e busco agir da melhor forma.
- Vocês estão morando juntos, não é? Com certeza a convivência irá mudar essa situação. 

Uma expressão mais leve tomou conta do rosto de Mycroft, aquela conversa estava sendo muito melhor do que havia planejado.
- Obrigado pelas palavras, Sr. Lestrade. - passou a fita-lo nos olhos. - E peço desculpas por ter sido desagradável Domingo passado. Nem mesmo minha preocupação deveria justificar um comportamento como aquele.
- Está tudo bem, Sr. Holmes. – Greg respirou fundo e disse, balançando a cabeça como se nada daquilo tivesse mais importância.

- Por favor, Mycroft apenas.
- Só se você deixar o "Sr. Lestrade" por Greg. Mal consigo aguentar seu irmão me chamando assim, me sinto velho. Já bastam os cabelos grisalhos! – riu baixo, quebrando o clima pesado entre os dois.
Mycroft permitiu um sorriso leve aparecer nos lábios.
- Como quiser, Greg.    

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