IX

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Com todo o cuidado necessário, Sherlock virou o rosto para trás tentando verificar a situação. De fato, um homem de casaco preto e capuz estava a alguns passos de distância, colando os olhos nos adolescentes a cada direção nova que tomavam.

- Precisamos encontrar um local mais movimentado, para conseguirmos despistá-lo. – John dizia e acelerava gradualmente os passos.
- Sei para onde devemos ir.
Sherlock assumiu o controle sobre a direção para a qual seguiriam, apenas tentando acompanhar a velocidade ditada por Watson.

O moreno consultava o mapa mental que possuía de Londres, encontrando a rota mais rápida até a Oxford Street. Essa era uma das ruas mais movimentadas da cidade, não muito longe de onde estavam.
Quando o loiro percebeu o destino, sorriu em aprovação.
- Ótima ideia, Sherlock. Para variar. – riu baixo, forçando-se a não esquecer a gravidade da situação.
- Você me surpreendeu. – Sherlock devolveu.
- Sou filho de um militar e primo de um policial da Scotland Yard... Sei algumas coisas sobre segurança.

A adrenalina daquela "fuga", junto à proximidade dos dois, estava sendo irresistível para ambos.

Chegaram à rua e puderam respirar aliviados. A quantidade de pessoas era assustadora e, provavelmente, o perseguidor perceberia o fato e desistiria da caçada. Infelizmente, não foi o que aconteceu. Com maestria, o homem conseguiu se aproximar ainda mais dos garotos e estes voltaram a acelerar os passos. Empurravam quem fosse necessário e atravessavam de um lado para o outro da via, independente do tráfego.
- Tenho uma ideia. – Sherlock disse ofegante.
Antes mesmo que o loiro pudesse responder algo, tirou o próprio sobretudo e puxou o mais baixo para o recuo da fachada de uma das lojas. Aproveitando o espaço, fez com que John encostasse na parede e se colocou em sua frente, pressionando os corpos.

Os olhos de Watson estavam arregalados e sua mente se confundia com a imensidão de pensamentos que o invadiram. Sherlock jogou o sobretudo no chão, e abaixou o rosto até que pudesse deixar a testa encostada na do loiro.
- Desculpe, John. – disse em um sussurro, olhando fixamente para o outro.
- Uma roupa diferente... – Watson reuniu todas as forças para tentar aparentar normalidade. – Por isso tirou o sobretudo. E dessa forma que estamos, ele pensará se tratar apenas de um casal aleatório e continuará nos procurando ao longo da rua.
- Exato. – o sorriso de Sherlock foi contagiante.

A situação fez com que ambos sentissem uma eletricidade em seus corpos fora do comum, não querendo se mover. Diferentemente das outras vezes em que estiveram tão próximos, sentiram-se a vontade para continuar daquela forma por tempo indeterminado.
Volta e meia Holmes mordia os lábios, para controlar o impulso de aproximar mais seu rosto. Os traços do loiro eram hipnotizantes e o faziam querer voltar à erros do passado.

John, por sua vez, fechava os olhos e respirava fundo o perfume do moreno. Imaginava-se agarrando os cachos à sua frente, alisando o pescoço alvo tão próximo de si...
- Consegue vê-lo em algum lugar? – Sherlock interrompeu, descendo levemente o rosto para dar visibilidade.
Como consequência, John precisou de uma boa dose de ar. Sentir a respiração do cacheado perto de seu próprio pescoço fez com que sua sanidade fosse colocada a prova.
Ele varreu a rua com os olhos, procurando por qualquer pessoa suspeita.
- Hm. – ele limpou a garganta, buscando se concentrar. – Não. Ele foi embora.

Com certa relutância, Holmes se afastou. Um olhar desapontado passou pelo rosto de Watson por alguns segundos, recompondo-se assim que percebeu a loucura dos sentimentos que acabou de vivenciar.
O moreno recolheu o sobretudo do chão, dando batidinhas para retirar toda a poeira.
Sem precisarem dizer nada, começaram a caminhar para longe da movimentada rua. Apenas quando a multidão foi se dissipando, os dois começaram a perceber o quanto ignoraram todo o resto do mundo quando estavam colados um ao outro. A única pessoa que vinha em suas mentes era o perseguidor e, mesmo assim, apenas em raros lapsos de consciência.

E o rosto ainda corado de John e os lábios excessivamente mordidos de Sherlock foram suficientes para fazê-los permanecer em silêncio ao longo da caminhada.
Quando o celular de John tocou, ele se sentiu salvo. A ligação poderia inserir algum assunto diferente do acontecimento de minutos atrás e, então, todo o embaraço desapareceria. Nem ao menos olhou o visor do aparelho, apenas atendeu.

- John? – uma voz feminina foi escutada.
- Mary? – John chegou a parar os passos.

Apesar de ter agradecido pela ligação, saber que a pessoa do outro lado da linha era sua namorada não foi nada agradável. Principalmente após o ocorrido com Sherlock. Parecia que, de alguma forma, ela o flagrou.
- Onde você está? – a garota perguntou.
John pensou antes de responder, dividido entre mentir ou não. Decidiu que era paranoia acreditar que a garota soubesse de algo e deveria ser sincero.

- Estou fora de casa, vim dar uma volta com Sherlock. – falou o nome do amigo em um sussurro. Percebeu que ainda estava envergonhado.
Os garotos retomaram os passos, mesmo que sem um destino específico. Holmes observava em silêncio a conversa do loiro, analisando todo os traços de insegurança. Torcia para não estar transparecendo o mesmo, mantendo sua pose sempre inabalável.
- Bem, então eu tenho uma ótima surpresa! – Ela disse animada. – Vou encontrar vocês! Estou aqui em Londres.

A respiração funda de Watson denunciou a frase que acabara de ouvir. Por pior que fosse, o moreno se divertiu com a cena.

- Co-Como assim? – ele gaguejou, sem saber o que dizer.

- Isso mesmo, amor. Eu cheguei há uma hora, deixei minhas coisas na casa da minha tia. Fico feliz de ter a chance poder conhecer um amigo seu! Sherlock é aquele de Biologia, não é? – as palavras saíram rápidas pela empolgação.
- Ah, sim, sim! – ele piscou os olhos algumas vezes. – Sherlock é minha dupla de biologia.
- Onde posso encontrar vocês? – Mary perguntou, louca para que o encontro fosse rápido.

John e a namorada não se viam há mais de duas semanas, quando o loiro fez uma visita à sua mãe, no interior. Justamente nessa visita, ele pretendia encontrar Mary Morstan e conversar sobre a loucura que o relacionamento a distância estava sendo. Entretanto, todos os anos de amizade com a loira o fizeram hesitar

Os dois se conheciam desde que John se mudou com a família para a cidade. Ela foi sua melhor amiga, seu primeiro beijo... Era a pessoa que mais o conhecia em todo o mundo! Iniciaram o namoro pouco antes dele decidir se mudar para Londres, uma ideia majoritariamente dela. A mínima chance de magoar Morstan fazia o bondoso Watson recuar e aceitar estar em um relacionamento que definitivamente não o agradava.

De certa forma, utilizou-se de Mary para quebrar a tensão entre ele e Sherlock. Disse que a garota estava na cidade e que queria conhece-lo, pedindo também mil desculpas pela interrupção ao caso. Holmes compreendeu e aceitou permanecer para o encontro com a loira.

Parte do moreno estava com raiva por Morstan ter aparecido pouco depois do episódio entre os dois. E algo o dizia que a raiva não era apenas por isso...Durante todos os encontros que os garotos tiveram para fazer os trabalhos de biologia, a jovem não parava de mandar mensagens. Irritava-o ver John concordando com aquela situação, mesmo insatisfeito. Incomodava também imaginar o tipo de intimidade que tinham. Principalmente após a proximidade na Oxford Street.

A outra parte mal conseguia se aguentar de curiosidade. Precisaria apenas de alguns segundos por perto para deduzir tudo o que fosse necessário e, quem sabe,usaria as informações essas para fascinar John.
Era um bom plano.    

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