Capítulo 16

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Solto a respiração ao perceber que estava presa. Não sei como consegui entrar na casa sem acordar ninguém. Devo ser realmente muito boa nisso de investigação. Finalmente, entro no quarto. Tudo está aparentemente normal. A cama continua desarrumada, assim como a penteadeira, cheia de maquiagens e as roupas jogadas pelo chão. É como se, a qualquer momento, ela fosse voltar, penso. Como se, a qualquer momento, eu fosse virar e encontrá-la bem ao meu lado, rindo como nos velhos tempos. Mas as coisas só estão assim porque Evan deve ter proibido a todos de tocar aqui. Não sei o que ele faria se me encontrasse agora. Nem penso nisso.

Sento na poltrona vermelha do canto do quarto. Há uma blusa amarela jogada no apoio. Pego-a e, sem pensar duas vezes, levo-a para perto do rosto e inspiro o aroma. Seu cheiro continua ali, impregnado na blusa e no quarto inteiro. Eu deveria ter me sentido mal quando soube da notícia. Deveria ter me sentido muito mal por não tê-la alertado. Mas nada disso aconteceu. Sentada aqui, segurando sua blusa, percebo que, no fim das contas, fiquei aliviada com sua morte. Sim, eu ainda sinto falta de nossos momentos, da minha melhor amiga dividindo um pote de sorvete comigo e até jogando aqueles jogos malditos nas festas enquanto dávamos risada em meio a shots de tequila. Mas as pessoas mudam, não é? Elas se perdem nas encruzilhadas da vida, escolhem o caminho errado e, de repente, aquela que você conheceu já não é a mesma pessoa. E trazê-la de volta pode ser quase impossível. Sophia deixou de ser Sophia e sabia que não voltaria mais, não depois de tudo. Não desejei sua morte, apenas... achei justo. Apesar de toda a história de Noah e a rixa entre as duas famílias, apesar de todos os problemas de casa e a situação com Evan, Bethany não merecia aquilo. E quem estava fazendo tudo não era Sophia, pelo menos não a minha Sophia. E aquela garota mereceu, sim, o fim que teve.

Decido que é hora de ir embora, mas algo me impede de continuar andando, é como se estivesse buscando algo aqui e não sei exatamente o que é. O cardigã que ela estava usando quando entrou no carro e desabafou comigo está pendurado em uma das araras do armário. Quando o toco, parece que uma faca está tentando cortar minha cabeça ao meio. Fico aérea, não consigo me localizar no espaço.

***

Reconheço as paredes. Passo o dedo por elas, reconhecendo a textura. O piso de cimento, quando encontra com meus pés, faz barulho. Passos. Passos que não são meus. Escuto um grito abafado, o que me faz virar rapidamente para a esquerda. Ali, no outro canto, está Sophia, andando de um lado para o outro. Seu olhar é de preocupação, mas o sorriso em seu rosto é um tanto quanto malicioso. Em sua frente, está Bethany, seu rosto está cheio de marcas vermelhas e roxas. Olho para a mão de Sophia, fechada em formato de punho, também vermelha e trêmula.

— Eu não sou o meu pai, Sophia. Não fui eu quem mudou o nome do proprietário. Eu não tenho culpa que Noah quis ficar comigo. Não tenho culpa que você se tornou essa garota egoísta que não consegue enxergar as coisas claramente – ela diz com dificuldade, sua boca está toda machucada.

— Você não sabe nem metade das coisas que passam pela minha cabeça, Bethany. Eu me sinto bem ao torturar você porque, pra falar a verdade, é o único momento em que consigo ter controle da minha vida. Assim – ela dá outro tapa no rosto da garota –, Noah me deixou porque não aguentou me ver transformada. Não o culpo. Minhas ações. Minhas consequências. Simplesmente era demais pra mim lutar contra a maré ao lado de uma amiga. Sim, ela sempre vai ser minha melhor amiga. Mas, enquanto ela não estava aqui, eu ficava nos intervalos, vagando por aí ou sentada em um banco, olhando os grupos de amigos rindo, conversando. Sabe o quanto doía querer fazer parte de um? Se você sempre quisesse algo, e tivesse a oportunidade de ter, tendo que mudar a sua personalidade, você não mudaria? Eu mudei. Meu novo grupo não se importa comigo, mas eu não ligo. Não há nada com que se importar. Tornei-me superficial, fútil e guardei todos os meus sentimentos de baixo de uma carcaça. E é melhor assim. – Ela sorri. – Eu não quero te matar, Bethany. Mas alguém precisa sentir o que eu senti durante todos esses anos. Alguém precisa sentir o que eu sentia quando a única coisa que me tirava da realidade era aquele monte de drogas. Alguém precisa sentir uma mãe ausente, um irmão presente demais. Alguém precisa sentir a culpa de uma empresa quebrada. Da quebra do contrato entre sócios. E isso, sei que você também sentiu, mas você estava do lado da vitória. Quero que sinta como foi perder toda a inocência e aderir ao mundo dos hipócritas. Quero que seja sufocada como eu fui por muito tempo. Egoísmo? Talvez – o sorriso fica ainda maior quando se aproxima –, mas, meus parabéns, você foi a vítima escolhida. Um brinde?!

A Garota do Casaco VermelhoOnde histórias criam vida. Descubra agora