Capítulo 63

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 Devo ter ficado a deambular pela cidade durante cerca de uma hora, porque quando dei por mim, estava naquele paredão, onde passeei com o Simon, antes de lhe destruir a vida.

 Já tinha parado de chorar faz algum tempo, mas para substituir essa tristeza sufocante veio o vazio. Aquele vazio onde não consegues sentir nada e não queres saber de absolutamente nada, até nem me senti assustada quando passei a passadeira quando o semáforo estava a verde para os carros, fazendo os condutores apitar e gritarem furiosos.

 Quando consegui passar para o outro lado, para o lado da praia, desci as escadas que davam para a areia e deixei que esta enterrassem os meus sapatos à medida que eu andava junto ao muro, tentando afastar-me do pequeno movimento que ainda se fazia. 

 Encontrei um canto, longe de toda aquela gente alegre e deixei-me sentar encostada à pedra apenas a fitar o mar relativamente sereno. A minha mente, concentrada nas pequenas ondas, deixava-se envolver no nada e eu deixei-me estar assim, vendo os primeiros raios de sol a começarem a desaparecer, juntamente com as pessoas alegres que ali estavam a passar o dia.

 Agora estava a começar a ficar mais vazio e calmo, exatamente como queria.

 Sei que preciso de começar a pensar, por mais devastada e irritada que esteja, tenho que decidir o rumo da minha vida dali para adiante. Tenho que pensar em tudo o que o Alfredo me disse e escolher uma das opções que tenho disponíveis, sem guardar rancor ou odeio, porque agora era o meu futuro eu que estava em jogo, o novo eu que a minha vida me estava a obrigar a criar.

 De repente reparo num movimento no meu lado direito, como alguém a caminhar junto ao muro onde estou encostada na minha direção e assim que espreito dou-me de caras com o Simon, ainda vestido com aquela t-shirt branca e as calças de ganga do dia todo, porém com os ténis e as meias à mão, deixando os seus pés descalços enterrarem-se na areia a cada passo que dava.

 Desviei o olhar novamente para o mar, sem vontade de o ouvir falar sobre a Luna ou Sol. Nem queria saber como é que ele veio ali parar, como é que me encontrou, só queria que voltasse a desaparecer e não voltasse. Não estava com cabeça, nem em condições de sofrer por ele, quando eu já estou completamente destruída... Sem nada.

 Ele sentou-se a meu lado, sem dizer uma palavra, sentia a sua presença e o seu cheiro, mas não sentia o seu olhar sobre mim. Ouvi-o respirar fundo, como se estivesse a apreciar a paisagem e a energia do lugar, antes de em fim encostar-se ao muro como eu e relaxar o corpo, pousando o braço sobre o joelho erguido.

 As ondas do mar enrolavam-se e formavam aquela espuma num processo calmo e ao mesmo tempo apressado, como se enquanto a água de enrolava sobre si mesma ela estivesse feliz e dançasse com a ondulação, porém depois essa mesma ondulação fosse engolida pela água e esta se desfizesse em espuma, tentando beijar a areia.

 Queria tanto ser aquela espuma que aparece e depois simplesmente se junta à água numa jornada sem fim e progressiva. Queria simplesmente desaparecer e encontrar o meu lugar longe de toda esta confusão.

 Engoli em seco e com a mão esquerda limpei as lágrimas dos olhos que estavam prestes a cair. Estou demasiado abalada para conseguir apreciar a paisagem e a presença do Simon a meu lado, simplesmente ali sem dizer absolutamente nada, durante todos estes minutos, estava a começar a irritar-me.

 Quando voltei a erguer a cabeça, ajeitei os cabelos e respirei fundo, tentando apreciar o início da noite, que afastava os últimos raios de sol, o que queria dizer que já estava a ficar realmente tarde, porque como aqui é verão anoitece desta maneira apenas por volta das nove/dez da noite.

 Finalmente senti o seu olhar sobre mim, a minha visão periférica confirmava-o, contudo eu não estava disposta a fitá-lo. Estou zangada com ele. Estou triste e a cima de tudo muito confusa em relação a ele. Eu acreditei realmente que ele estava do meu lado, que depois de tudo o que ele disse em Cancún ele não me fosse abandonar, mas assim que chegámos ele deixou-me para consular a estúpida da Luna, enquanto eu tive que enfrentar toda a verdade sozinha, sem a piedade de ninguém, porque ninguém gosta de mim. Ninguém quer saber o que acontece comigo.

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