Capítulo 5

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Elisa acordou e olhou ao redor admirada, tentando recordar-se do que lhe
acontecera.
Estava em um quarto estranho. Como viera parar ali? Lembrou-se de
Eugênio. Ele a deixara. Seria verdade mesmo ou teria sonhado?
Sentia-se atordoada e um tanto fraca. Aos poucos, foi se lembrando do que
acontecera naquele dia. Todos os detalhes voltaram-lhe à lembrança. Ela saíra
desesperada para respirar um pouco. Assustou-se. Meu Deus! E as crianças? Elas
estavam sozinhas em casa.
Olhou em volta. Não conhecia aquele lugar. Precisava ir embora
imediatamente. Que horas seriam? As crianças teriam acordado? Quanto tempo
ela teria dormido? Por que se encontrava ali? Teria desmaiado?
Levantou-se apressada. Sentia-se um pouco tonta, mas não podia demorar-se
mais. Há quanto tempo teria saído de casa? Ia sair, lembrou-se da chave. Onde
estaria? Não a encontrou. Tê-la-ia perdido?
A porta abriu-se, e uma mulher de meia-idade entrou. Vendo-a, Elisa
perguntou:
— Por favor, senhora, diga-me onde estou? O que aconteceu?
— Você sofreu um acidente, mas agora está tudo bem.
— Acidente? Meu Deus! Não me lembro de nada!
— Agora já passou.
— Eu preciso voltar para casa, mas não encontro a chave. Estou preocupada
com as crianças. Elas ficaram sozinhas. Eu não devia ter feito isso, mas estava
tão aflita! Tinha que andar um pouco, respirar. Por acaso terá visto minha chave?
Será que alguém a guardou?
— Não se preocupe. Não vai precisar mais dela.
— Não? Por quê? O que aconteceu? Há quanto tempo estou
aqui?
— Há alguns dias.
Elisa deixou-se cair sentada no leito assustada.
— E as crianças? Alguém cuidou delas? Olívia e o Eugênio já sabem que
estou aqui?
— Já. Fique tranqüila. Tudo está bem agora. Não precisa preocupar-se com
nada. As crianças estão muito bem. Olívia está cuidando delas.
Elisa suspirou fundo.
— Seja como for, eu agora estou bem e preciso voltar para casa.
— Não pode.
—Porquê?
— Precisa cuidar da sua saúde. Ainda não está bem.
— Eu quero voltar. Sinto-me bem. Não posso deixar as crianças durante tanto
tempo.
Olívia precisa trabalhar.
— No momento, o melhor será cuidar de você. Quando estiver bem, poderá
vê-los.
Elisa passou a mão pela testa, como querendo afastar um pensamento
doloroso. Depois perguntou:
— O Eugênio sabe o que me aconteceu?
— Sabe.
— Ele tem vindo me ver?
— Ele não veio, porque não pôde. Mas está cuidando das crianças.
Pelo semblante de Elisa passou um vislumbre de alegria.
— Então ele voltou para casa!
— Voltou.
— Quer dizer que não era verdade? Que ele não tinha outra mulher e não ia
me deixar!
Como eu fui boba! Por que acreditei?
— Acalme-se. Tudo está bem agora. Deite-se e tente repousar um pouco.
— Não. Eu quero voltar para casa. Quero ver se tudo está bem. Preciso
cuidar de minha família.
— Você ainda não teve alta. Deve repousar.
— Mas eu não estou doente. Não pode me impedir de voltar para casa.
— Acalme-se. Vou falar com o médico e veremos. Por agora, deite-se e
descanse.
— Ele virá logo?
— Vamos ver.
— Não suporto mais a saudade. Quero ver as crianças.
— Verei o que posso fazer por você. Meu nome é Lina. Se desejar alguma
coisa, é só apertar aquele botão. Mas lembre-se que precisa refazer-se. Quanto
mais descansar, mais depressa ficará boa.
— Está bem. Vou esperar pelo médico. Preciso ir para casa.
Elisa acomodou-se no leito, e Lina colocou a mão sobre sua testa, pedindo:
— Feche os olhos e relaxe.
Elisa obedeceu. Das mãos de Lina saíam energias coloridas que penetravam o frontal de Elisa e, dentro de alguns instantes, ela adormeceu.
Lina saiu, encaminhando-se para uma sala onde um homem de cabelos
grisalhos e rosto simpático, ocupava-se em ler atentamente um relatório. Vendo-a chegar, levantou os olhos e disse:
— E então?
— Elisa acordou e como pensávamos, ela não recobrou a consciência
espiritual. Pensa que está na Terra e quer voltar para casa, cuidar dos filhos etc..
— Eu esperava isso.
— O que pretende fazer?
— Contar-lhe a verdade. Porém, antes é preciso que ela se fortaleça um
pouco mais. Apegada como é, o golpe poderá desequilibrá-la ainda mais.
— Sinto que ela nos vai dar trabalho. Não esperava o que lhe aconteceu.
Precisei fazê-la adormecer para mantê-la no quarto.
— Vou tentar mantê-la aqui. Será melhor para ela. Se voltar para casa, difícil será tirá-la de lá novamente.
— O que lhe direi quando acordar?
— Que irei vê-la. Tentarei conversar com ela. Avise-me quando for o
momento.
— Está bem.
Lina saiu, indo atender a outros pacientes. Naquele lugar de recuperação, havia sempre muito trabalho a fazer e ela o desempenhava com dedicação e
disposição. Estava habituada aos problemas humanos. Muitos eram os que voltavam da Terra em doloroso estado de perturbação, envoltos ainda pelos problemas que vivenciaram no mundo, presos aos laços afetivos e à rotina que obedeceram durante muitos anos, não conseguiam de pronto recuperar a memória astral.
Só o tempo, despojando-os das energias e das formas pensamentos que alimentaram durante tanto tempo, ia aos poucos fazendo a transformação, e era ali, naquele lugar de recuperação, que
muitos estagiavam recebendo os recursos do esclarecimento e da ajuda energética para recuperarem a memória astral.
Elisa fora conduzida para lá inconsciente, e Lina, sensibilizada pelo seu drama de mãe, a tratara com excepcional carinho. Contudo, temia sua reação quando acordasse. Estava atenta com ela, para ajudá-la sempre que pudesse.
Elisa acordou horas mais tarde. Dessa vez, lembrou-se com mais facilidade
do que lhe acontecera. Apesar disso, não se lembrava do acidente. Por mais que tentasse, não conseguia recordar-se a não ser da sua saída de casa em desespero, e as lágrimas correndo pelo seu rosto, enquanto ela andava pelas ruas na escuridão da noite.
Levantou-se apressada. Havia um armário e ela o abriu. Estava vazio. Era estranho. Olívia não lhe teria levado algumas roupas? Olhou-se no espelho. Claro. Ela estava com outro vestido. Não era o mesmo que vestira naquela noite para esperar o Eugênio.
Mas alguém lhe trouxera aquele vestido. Teria sido o Geninho? Pensando nele, seu coração abalou-se. Ele teria se arrependido? Claro. Ele a amava e amava a família.
Nunca iria deixá-los. Sentiu saudades. Gostaria de saber tudo, abraçá-lo,
dizer-lhe o quanto havia sofrido só em pensar que ele pudesse ir embora.
E o médico que não vinha? Ela estava impaciente. Resolveu aprontar-se para adiantar.
Mas não tinha nada em mãos. Nem um pente sequer. Em cima da cômoda, havia uma escova e ela apressou-se em escovar os cabelos. Depois, apertou o botão chamando Lina.
A porta abriu-se e Lina apareceu, acompanhada pelo homem de meia-idade.
— Este é o doutor Nelson — foi dizendo ela. Elisa sorriu satisfeita:
— Ainda bem que veio, doutor. Eu o estava esperando ansiosamente.
— Como tem passado?
— Muito bem. Depois deste repouso de hoje, acordei muito melhor. Já posso ter alta e voltar para casa. Gostaria de avisar minha família para vir buscar-me.
Nelson a olhou nos olhos e disse com voz firme:
— Sinto, mas não poderá fazer isso.
— Não? E por quê?
— Porque aqui não temos meios para isso.
— Não? Afinal, onde estamos nós? Que lugar é esse tão difícil assim?
Nelson tomou as mãos de Elisa dizendo com simplicidade:
— Sente-se, minha filha. Precisamos conversar. Várias coisas se passaram e você ainda não pode voltar para casa.
— Mas o que é isso? Por que me prendem aqui e me impedem de ver minha família? Eu quero ver as crianças! Não podem fazer isso! Eles são muito pequenos e precisam de mim!
— Ninguém a impede de voltar para casa. Isso não depende de nós. Mas de onde nós estamos agora, ninguém pode voltar a Terra.
Elisa abriu os olhos desmensuradamente.
— Como? Nós não estamos na Terra? Isso não pode ser. Vocês estão me
enganando. Por que fizeram isso comigo?
— Não fomos nós. Foi o acidente.
— O acidente?
— Sim — disse Nelson olhando-a fixamente nos olhos.— Você não viu o
automóvel e foi atropelada.
— Atropelada? Eu?
— Sim.
— Meu Deus! O que aconteceu? Por acaso... me ajudem... digam-me... o
que aconteceu realmente?
— Você estava desesperada, chorava. Ao atravessar a rua, não viu o carro e
foi atropelada. Seu corpo morreu instantaneamente.
— Meu corpo morreu... quer dizer que eu morri? — gritou Elisa em desespero.
— Sim — disse ele com voz firme. — Seu corpo morreu, mas você vive. Seu espírito é eterno.
— Meu Deus! E agora, o que vai ser daquelas crianças? Quem cuidará delas? Eu as deixei fechadas em casa e ninguém sabia. Eu preciso ir lá, ver como estão, o que aconteceu!
— Já lhe disse que está tudo bem — disse Lina procurando dominar a
emoção. — Olívia está com elas e Eugênio voltou para casa. Eles estão cuidando de tudo.
Elisa, banhada em lágrimas, torcia as mãos em desespero.
— Não posso acreditar que isso seja verdade. Não pode ser. Eu me sinto mais viva do que nunca. Olhe, aperte meu braço, está como sempre foi. Não vê que eu estou viva?
— Claro que está. Nós também. Só que estamos em outro mundo. Em outra
dimensão de onde é muito difícil comunicar-se com a Terra.
— Não me conformo. Tenho que voltar, ver como as COISAS estão em casa. Meu Deus, como posso abandonar minha família? Vocês não compreendem? Eu preciso ir lá, vê-los, saber como estão. Por favor, deixem-me ir.
— Acalme-se e me escute — disse Nelson segurando a mão gelada de Elisa, procurando enviar-lhe energias calmantes.— Agora, você ainda não está bem. Aqui, nós temos tratamentos especiais de recuperação e se nos ouvir, você logo estará bem e então poderá ir ajudar sua família. Mas agora como você está, só iria perturbá-los ainda mais.
— Não creio nisso. Eu nunca perturbaria minha família. Eu os amo. Não posso esperar. Eu preciso ir vê-los o quanto antes.
— Você não sabe como os problemas podem se agravar se não se controlar. É preciso lembrar que Deus cuida de tudo e confiar. Sem confiança em Deus e ajuda dos nossos irmãos maiores, não conseguirá senão perturbá-los ainda mais. Espere. Cuide do seu equilíbrio, depois então poderá ir ter com eles.
Elisa sacudiu a cabeça negativamente:
— Não posso acreditar no que me dizem. Por alguma razão, querem
impedir-me de voltar para casa. Por favor! Entendam. Eu preciso ir. Não posso ficar aqui.
— Que interesse teríamos em fazer isso? Estamos dizendo a verdade. Seu
corpo morreu. Agora, precisa conformar-se. Aceitar o que não tem remédio, equilibrar-se. Depois, poderá visitar sua família. Mas a permissão só é concedida quando você
puder suportar essa emoção sem descontrolar-se. Ainda é muito cedo para isso.
Elisa abriu a boca e tornou a fechá-la permanecendo em silêncio por alguns instantes. Depois disse:
— Vou pensar no que me disse. Mas preciso sair deste quarto, andar um
pouco.
Nelson trocou um olhar com Lina em silêncio, depois tornou:
— Poderá sair, passear pelos nossos jardins, se se sentir bem.
— Gostaria de saber que lugar é este.
— Um hospital de recuperação para os que deixam a Terra — respondeu
Lina.
Elisa calou-se novamente pensativa.
Era-lhe difícil acreditar no que eles estavam lhe dizendo. Sentia-se viva.
Apalpava-se e tudo lhe parecia como antes. Teria tido alguma crise e sido
internada em algum hospício? Tinha que verificar. Resolveu contemporizar.
— Sinto-me bem. Posso dar uma volta?
— Tem certeza de que pode fazer isso? — indagou Nelson.
— Tenho. Sinto-me muito bem.
— Nesse caso, pode ir. Lina lhe fará companhia. Se precisa r de alguma
coisa, me procure. Estou aqui para ajudá-la.
— Obrigada.
Nelson saiu e Elisa disse em seguida:
— Tudo isto é muito estranho. Lina sorriu:
— É porque você ainda não recuperou sua memória astral.
— Memória astral? O que é isso?
— As lembranças de antes de você reencarnar na Terra.
— Eu vivi antes disso?
— Sim. Todos vivemos muitas vidas na Terra. Não sabia disso? Nunca ouviu falar de reencarnação?
— Já. Mas nunca acreditei. Parecia tão fantástico!
— Por quê? As transformações são tão naturais no universo! A vida é rica em
oportunidades de aprendizagem.
— Mesmo assim. Se isso fosse verdade, eu me lembraria. Lina sacudiu a cabeça e sorriu:
— O esquecimento é condição essencial para quem recomeça uma nova experiência. O
apagar do passado descansa e favorece o desenvolvimento de novos aspectos da nossa personalidade.
Pelos olhos de Elisa passou um brilho singular. Ela não está acreditando em
nada disso — pensou Lina. — Está querendo ganhar tempo e descobrir a verdade.
— Venha, vamos sair um pouco. Quero que conheça o lugar onde estamos — disse Lina enfiando seu braço no dela.
Elisa acompanhou-a pensativa. Parecia-lhe estar sonhando. Andando pelos corredores, passando por salas onde as pessoas circulavam, algumas trabalhando, outras sendo atendidas, olhava tudo atentamente, na esperança de encontrar a
chave do mistério.
Estava em um hospital, disso não tinha dúvida. Mas os móveis e os aparelhos eram diferentes dos que conhecia.
Deram uma volta pelos jardins que cercavam o edifício, e Elisa aspirou
gostosamente o ar leve que circulava por entre as árvores frondosas. O lugar era lindo e acolhedor. Ela o apreciaria se não estivesse tão preocupada. Tinha que
fugir dali o quanto antes, descobrir a verdade. Voltar para casa e saber como as crianças estavam. Por que a retinham ali? Estaria prisioneira? Andando pelos jardins, embora dissimulando seus verdadeiros pensamentos, seus olhos
percorriam todos os detalhes na esperança de encontrar um lugar por onde pudesse escapar.
Os muros eram altos e os pesados portões, fechados. Contudo, ela precisava sair. Fingia ouvir com atenção os comentários de
Lina sobre os costumes e benfeitorias do local onde se encontravam, mas
sequer entendia o que ela estava dizendo. Seu pensamento buscava uma saída.
Quando voltaram ao quarto de Elisa, Lina despediu-se dizendo:
— Tente repousar um pouco. Far-lhe-á bem.
— Estou acostumada a trabalhar. Não gosto de ficar sem nada para fazer.
— Agora precisa recuperar-se. Assim que melhorar, poderá ocupar-se com
o que desejar. Há muitas coisas interessantes para fazer aqui.
Elisa concordou. Lina saiu à procura de Nelson:
— E então? — indagou ele.
— Ela está fingindo. Não acreditou em nada do que lhe dissemos. Procura
uma forma de fugir. Não sei se conseguiremos mantê-la conosco. Não teremos alguma maneira de ajudá-la?
— Se ela resolver ir embora, nada poderemos fazer.
— Se ela fizer isso, vai sofrer ainda mais. Perturbada e infeliz, sem uma visão esclarecida da realidade espiritual, difícil será equilibrar-se.
Nelson pensou um pouco e depois respondeu:
— Está na hora de você compreender que a dificuldade, tanto quanto o
problema e a dor, existem para solucionar as feridas da alma. Eles não são obstáculos, como nos parecem às vezes, mas ferramentas para o amadurecimento do espírito. Aparecem em nosso caminho para resolver os impasses e permitir que alcancemos dias melhores e mais felizes. Por isso, se não conseguirmos reter Elisa e ela se for, certamente será porque ela necessita
experimentar outros caminhos. Vamos manter a calma e sustentar a nossa paz.
Lina baixou a cabeça. Nelson tinha razão. Decidida, foi a seu quarto e entregou-se a meditação por alguns minutos. Quando saiu, sentia-se renovada e serena.
Elisa, em seu quarto, não conseguia dominar a ansiedade. Por que saíra
naquela noite, por quê? Teria mesmo sido atropelada? Por que não se lembrava de nada?
Estendeu-se no leito e pensou nas crianças. Recordou a fisionomia de cada um com saudade e tristeza. Ah! como gostaria de estar lá ao lado deles, abraçá-los e beijá-los.
Sentiu um aperto no peito ao pensar em Nelinha. Tão pequenina ainda! Reviu seu rostinho amado e nesse instante pareceu vê-la em lágrimas dizendo:
— Mãe, por que você não vem? Eu quero você!
Seu rostinho angustiado apareceu em sua frente e Elisa,
tomada de emoção e desespero, gritou aflita:
— Filha, eu já estou indo. Eu nunca os deixarei!
E tal foi a força do seu pensamento, que Elisa sentiu que estava abraçando
Nelinha e misturando suas lágrimas com as dela. Contudo, a menina não retribuiu seu abraço.
Continuou chorando e Olívia aproximou-se, tomando-a nos braços com carinho, dizendo:
— Eu estou aqui. Vou tomar conta de você.
Por entre lágrimas, Elisa olhou em redor. Que milagre era aquele? Estava em sua casa! Exultou de felicidade! Ela havia voltado. Os problemas haviam se acabado, ela voltara para assumir novamente o comando da família.
Aproximou-se de Olívia abraçando-a com alegria.
— Olívia, estou aqui. Voltei para tomar conta da minha família. Tudo está bem agora.
Olívia pareceu não vê-la. Reuniu as crianças e com carinho sentou-se com
elas no sofá, conversando amorosamente.
— Tia, eu quero minha mãe! — choramingou Nelinha. Elisa correu abraçá-la, dizendo:
— Filha, eu estou aqui.
Olívia, olhos brilhantes de emoção, tentando segurar as lágrimas, sentou-se no sofá e pôs Nelinha no colo, enquanto os outros dois sentavam-se a seu lado, e foi dizendo:
— Eu já disse que isso é impossível! Ela está no céu e não pode voltar. Mas eu estou aqui e nunca vou deixar vocês.
Elisa olhava-os aturdida. Seus olhos estavam abertos e seu coração batia
descompassadamente como se quisesse sair do peito. Falavam dela! Seria verdade mesmo? Ela teria morrido? Ao pensar nisso, ficou apavorada, sentiu uma onda de fraqueza e desfaleceu.
Quando acordou, já era noite e as luzes na rua estavam acesas e a casa às escuras. A sala estava vazia. Angustiada, lembrou-se do que lhe acontecera.
Nelson teria dito a verdade? Ela estaria mesmo morta? Em sua casa ninguém a vira e por mais que tentasse, não responderam às suas palavras.
Passou a mão pelos cabelos em um gesto de desespero. O que fazer? A casa estava silenciosa, e ela subiu e verificou que todos estavam dormindo. A quem
recorrer para saber a verdade? Ela não queria sair dali, voltar ao hospital. Nem sequer sabia como fazer isso. Não entendia como conseguira voltar para casa. O
relógio da sala deu as doze badaladas.
— É meia-noite! E Eugênio, por que não está em casa? Teria mesmo ido
embora?
Mil pensamentos tumultuados passavam pela cabeça de
Elisa, sem que ela encontrasse resposta. Sentou-se ali, na sala, tentando encontrar uma solução. Passava da uma quando ouviu a porta se abrir. Eugênio entrou. Elisa atirou-se em seus braços, abraçando-o com força e chorando copiosamente.
— Geninho, você não foi embora! Você está aqui. Meu bem, me ajude. O
que posso fazer para acordar desse pesadelo terrível?
Eugênio olhou com tristeza para a sala em penumbra e lembrou-se de Elisa.
Aquilo sim que era mulher! Como era amorosa, cuidadosa, ordeira. Em casa
tudo estava sempre tão arrumado e em ordem!
Angustiado, pareceu-lhe vê-la circulando por entre os móveis em seus afazeres cotidianos. Dirigiu-se à cozinha, encheu um copo de água e tomou procurando acalmar-se.
Elisa, abraçada a ele, dizia em lágrimas:
— Por favor! Me diga o que aconteceu. Que tragédia é essa que se passou comigo que me separou de vocês! Eu não quero isso! Eu preciso voltar, cuidar da minha família! Por favor, Eugênio, faça alguma coisa. Me ajude!
Eugênio não conteve as lágrimas.
— Por que acontecera aquele acidente? Por quê? Por que Elisa tinha morrido tão jovem, tão cheia de vida, tão boa?
Elisa, sentindo o pensamento dele, murmurou desesperada:
— Então é mesmo verdade. Eu morri naquele acidente! Meu Deus! Que
horror! O que será de mim agora? O que será dos meus filhos, do meu lar?
Eugênio tentou dominar-se e dirigiu-se ao seu quarto. Vendo que o sono não vinha, apanhou um comprimido, tomou e conseguiu finalmente adormecer. Elisa, no entanto, estirada sobre ele na cama do casal, chorava inconformada e por mais que procurasse dominar a emoção, não fazia outra coisa senão pensar, pensar, pensar.

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