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Era assim todos os dias. Ele despejava o uísque no copo de vidro mais acessível e virava o recipiente na boca, sentindo a queimação tão familiar. Jogara um pouco de água no rosto antes de sair para trabalhar. Sua vida havia mudado depois de tudo aquilo, mas sempre a dor da perda martelava em seu coração. Ele se sentia vazio, solitário, mesmo com a irmã constantemente fazendo visitas inesperadas em seu apartamento recém reformado.

Havia se passado eras desde que havia ficado com alguém sem ser ela. Seu corpo jogado na poltrona de couro atrás da vidraça, se encontrava tenso e quieto, como costumava ser por trás dos óculos escuros necessários para esconder seus olhos mortos.

Sua vida mudara, e isso não era segredo para ninguém.

Amy, sua assistente pessoal, batera na porta antes de entrar, recebendo um sorriso discreto e completamente armado por parte de Christopher Harris.

- Senhor Harris, tem uma reunião em poucos minutos.

A expressão que tanto o lembrava ela se fazia presente cada vez mais, mesmo ele suplicando para que todos o chamassem de "Christopher", afinal ele nunca a veria de novo e muito menos teria o seu perdão.

Depois de quatro anos que partira, Christopher sentira na pele o quão estúpido havia sido ao abandonar a mulher da sua vida por um motivo tão... Simples. Apenas quando estava na sala de cirurgia percebera a grande besteira que fizera ao deixar Katherine para trás. Ela poderia cuidar dele, o beijar e dar o apoio necessário, mas não aceitaria a dar falsas esperanças.

Ele sabia que a cirurgia era arriscada e com mínimas chances de sucesso, mas no final, por um milagre, conseguiram reconstruir seus olhos. Ainda tinha que visitar os médicos periodicamente, mas agora poderia desfrutar das paisagens, dar atenção a Peige, e pilotar seus automóveis novamente. Seus recuperação fora longa, porém valera a pena.

O mais complicado foi manter Megan calada. Ela o olhava torto toda vez que os dois ficavam no mesmo cômodo. Christopher precisou destruir seu telefone para que resistisse a tentação de fazer a ligação, ou mesmo atender às de Kate. Uma vez flagrou Meg pondo uma carta no correi, mas por sorte - ou nem tanto - conseguiu impedir que o carteiro a levasse.

Katherine, a mulher que ele sonha todos os dias... Ela nunca o perdoaria. E ele merecia sofrer pelo o que fizera.

- Tudo bem, avise que logo estarei lá. Obrigado, Amy. – A loira desajeitada abandonou a sala, deixando-o novamente sozinho.

Os Harris haviam se mudado para Nova York logo quando Christopher fez a cirurgia que o fizera voltar a enxergar. A medicina avançara e usara seus olhos como testes para um possível futuro tratamento de casos como o seu, e por sorte, dera tudo certo.

O homem se levantou, passou as mãos pelo blazer azul-escuro, e observou a calçada larga da Hildegart, na esperança de sua amada passar por ali e ele poder a ver de longe, mesmo sem saber ao certo como era seu rosto.


*   *   *


- Mamãe, Barney quer passear. – O garotinho de olhos acinzentados sorria enquanto arrastava a coleira grande do labrador até a mãe, que fritava algo na frigideira.

- Tudo bem, vamos leva-lo para passear mais tarde. Agora, preciso que guarde os brinquedos no baú, pode fazer isso? – Sorriu, bagunçando os cabelos finos do filho que assentiu rapidamente. - Obrigada, bebê.

- Eu não sou um bebê, mamãe.

- Desculpe, sempre esqueço que já é um rapazinho.

O garotinho riu, agarrou todos os objetos espalhados pela casa e, em um piscar de olhos, jogou todos no baú de brinquedos azul em seu quarto.

Katherine Willians se mudara pouco tempo depois que Benjamin nascera. Sentiu que precisava ter seu espaço e saiu da casa de sua mãe, afirmando precisar começar sua nova vida ao lado do filho.

Como prevera, Ben adquiria cada vez mais os traços do pai que nunca havia sido mencionado. No fundo, a mulher sentia-se culpada por Christopher não saber da existência do filho, mas já se havia passado tanto tempo que preferia ignorar.

- Vamos, mamãe, vamos! – O cão correu até onde os dois estavam, latindo para que Kate ouvisse o filho e o levasse para dar algumas voltas.

Sabendo que ambos insistiriam tanto a ponto de deixa-la maluca, ela desligou o fogo, calçou os sapatos baixos e saiu rumo ao parque principal, desfrutando o calor que Nova York proporcionava naquele momento do ano.

Para SempreOnde histórias criam vida. Descubra agora